Neoplasias e Educação Física: diálogos necessários à formação docente em área da saúde

  • Author
  • Pedro Dalcin Santos
  • Co-authors
  • Gustavo Goulart Pinto , William Martins dos Santos , Rodrigo Lemos Soares
  • Abstract
  •  

    O câncer é constituído por mais de 100 doenças ligadas ao crescimento desordenado de células, onde o tratamento pode variar entre, cirurgia, quimioterapia, radioterapia e/ou transplante. Passar pelos processos de acometimento de uma neoplasia implica em acessar uma jornada de transformações físico-emocionais. Isso demanda alterações nos modos de organização e condução da vida das pessoas acometidas por algum tipo de neoplasia e essa estrutura tende a afetar emocionalmente, não só do paciente, mas todos a sua volta. Esse cenário implica a necessidade de ação multiprofissional, com vistas a produção de uma rede de apoio para tornar esse período menos traumático. Em Uruguaiana, a Associação de Apoio a Pessoas com Câncer (AAPECAN), auxilia em diversas necessidades de pacientes em tratamento contra essas doenças e dentre suas ações, a prática de atividades físicas (AF) tem sido um dos pilares, pois tem produzido benefícios no durante e depois, das sessões de prática. Essa afirmação deriva da compreensão de que, as mudanças persistentes influenciam diretamente na Qualidade de Vida (QdV) dos enfermos e as AF atuam no sentido de auxiliar na amenização dos efeitos colaterais oriundos das diferentes tipologias de tratamento. Uma vez iniciada e mantida a rotina de AF é possível verificar respostas potentes de tônus muscular, manutenção e/ ou aumento de força muscular, além da melhora da resistência cardiorrespiratória e vascular. Associado a esses itens é possível, também, destacar que uma periodização de AF focada na melhora imune das pessoas em tratamento pressupõe respostas de bons índices energéticos, glicêmicos e de colesteróis, bem como de capacidades físicas resguardadas de uma progressão de cenários que envolvam atrofias prejudiciais na realização de atividades rotineiras. A realização dessas atividades atua fisiologicamente, em prol de minimização do conjunto sintomático prejudicial ao organismo biológico, também age na produção de respostas positivas em níveis psicológicos atenuando questões derivadas de quadros depressivos, pânico e ansiedade, problemas manter o sono, fadiga muscular de diferentes grupamentos ou globalizada, além das questões de cognição persistentes ao longo do tratamento. Porém, deve ser considerada a situação clínica, limites impostos pela doença, como a resistência, força e quadro de condicionamento físico, antes e durante e projetar quais respostas serão produzidas após uma sessão de AF. Contudo, percebe-se essa área ainda a ser explorada pela Educação Física, sendo pouco abordada por currículos de modo melhorar a QdV e bem-estar incidindo sobre respostas na evolução prognóstica e sobrevida aumentada. Este relato parte do trabalho desenvolvido na disciplina de Pratica como Componente Curricular II, do curso de Educação Física Licenciatura, da Universidade Federal do Pampa (Campus Uruguaiana), orientado e monitorado por um docente e desenvolvido na AAPECAN deste município. O objetivo da atividade proposta é o de ressaltar a importância da Atividade Física durante o tratamento e, a partir dela proporcionar uma rotina de exercícios orientados pelos saberes do lazer, da ludicidade e do exercício físico. Para a realização das AF, o grupo de discentes realizou uma busca de artigos referentes a relação benefício-malefício da AF em pacientes oncológicos. Posterior a isso, realizamos a leitura dos materiais para identificar possíveis atividades a serem realizadas. Realizada essa fase de conhecimento, foi realizado um contato com a AAPECAN para saber da possibilidade de acesso e desenvolvimento de AF, o quantitativo de sujeitos acolhidos na instituição e as tipologias de neoplasias. Uma vez realizado esse mapeamento chegamos ao seguinte cenário: 15 pessoas (entre pacientes e acompanhantes, na maioria cônjuges), múltiplas tipologias de câncer e diferentes acometimentos (físicos e cognitivos). Dentro desse contexto, separamos quatro atividades pós ciência das limitações dos sujeitos, contudo destaca-se que o foco não foi a doença, mas foi necessário partir delas e dos contextos fisiológicos que elas produzem. Dito isso, o foco centrou-se nas questões de ludicidade, imaginação, atenção e na prática de movimentos rítmicos e expressivos. Para a primeira atividade, foi proposto o jogo “Continuar a história”, a qual consistiu em solicitar que cada participante escrevesse uma palavra em um papel, como objeto, lugar ou sonho, e colocar em um pote. Após escreverem, o grupo começou a tirar os papéis de forma aleatória, e os participantes deveriam contar ou expressar (pelo corpo-gesto) uma história que fosse completada por eles, a cada novo papel. A ideia era falar de sonhos, de possibilidades outras, diferente do fatalismo de alguns prognósticos. Ainda, ela amplia formas de conhecer uns aos outros, ao falarem de si, a partir das escritas e imaginação de outra pessoa. A segunda atividade foi um jogo, no qual os participantes deveriam manter um balão no ar o máximo de tempo possível sem que o balão caísse ao solo. Para realização o grupo ligou uma música para que os participantes se mantivessem ativos, percebessem o ritmo proposto, aguçassem a audição e movimentação corporal estimulada pela trilha sonora e, além disso, a música serviu como forma de delimitar um tempo para a dinâmica. A terceira prática foi a “Dança com balões”, na qual os participantes deveriam formar duplas e deixar um balão entre seus corpos, conectando-os, então o grupo colocou músicas de diferentes ritmos e bits e ao som da mesma os participantes deveriam dançar sem deixar que os balões caíssem. A proposta aqui era proporcionar uma troca de parcerias, pra que todos se percebessem presentes e na presença de outras pessoas que ocupam o mesmo local, enfrentam terapias parecidas e que podem assumir função de suporte emocional, partindo da premissa do contato corporal, que nesse caso foi intermediado por um balão, mas que o mesmo pode ser retirado a qualquer instante. Por fim, foi proposto um telefone sem fio, nele o grupo escolhia uma palavra e os participantes deveriam falar, um por um, no ouvido do outro até chegar no fim da fila. Na segunda vez precisavam expressar gestualmente. A proposta era a de manter os copos e os sorrisos ativos, a partir do estímulo da criação e da ludicidade. O grupo de início sentiu surpresa pela animação dos pacientes, aos quais adoraram a notícia que iriam ter atividades recreativas. O jogo “Continuar a História” foi na concepção do grupo, uma boa alternativa para quebra-gelo, que se desenvolve uma história criativa e com todos que participaram, alguns participantes não sabiam escrever e, por isso, adaptou-se para uso da expressão corporal. Nas demais dinâmicas o grupo foi muito participativo e se inseriu, de modo a propor algumas alterações, isso porque, alguns estavam retornando de terapia medicamentosa, além de quererem mais contato físico. A partir dos resultados observados percebeu-se que uma rotina de AF pode auxiliar na profilaxia de neoplasias de diferentes ordens, desde que os sujeitos estejam de acordo e em condições físico-emocionais de participar delas. Por meio da AF percebemos uma alteração de humor no grupo participante, algo que inclusive foi relatado na conversa final o que permite inferir que existe uma alteração positiva no bem-estar e QdV. Dessa forma, o presente relato sinaliza uma possibilidade de intervenção e alerta aos currículos de Educação Física, no sentido dos benefícios que a AF, proposta e realizada de forma coletiva, oportuniza durante o tratamento de diferentes neoplasias. Compreende-se então a urgência de estudos e intervenções a fim de contribuir na direção de melhoria das repostas ao tratamento dessa doença tão complexa e que produz quadros de dor física e emocional.

     

     

  • Keywords
  • Educação Física; Neoplasias; Formação em Saúde
  • Subject Area
  • EIXO 1 – Educação
Back