A Reforma Psiquiátrica como instrumento de luta e agir permanente pelo cuidado em liberdade, na atenção à saúde de pessoas em sofrimento mental, tem como um dos principais objetivos construir redes comunitárias de saúde mental, que em última instância sejam capazes de prescindir de estruturas e práticas manicomiais. Tamanho desafio, exige uma série de ações e práticas de gestão, atenção, formação e controle social, que evolvem impedir a abertura de novos manicômios, fechar os existentes, e construir redes de atenção psicossocial, que possam dar conta da integralidade e da equidade do cuidado, centrado nas pessoas e baseado em direitos. O fechamento do Hospital Psiquiátrico Vicença Maria da Fontoura Lopes, com 100 leitos, no município de Rio Grande, teve suas portas fechadas no dia 15 de abril de 2023. Momento, em que também foi inaugurada a Unidade de Saúde Mental em Hospital Geral na Santa Casa do Rio Grande, como resultado de uma série de ações, que incluí decisões administrativas com análise de viabilidade financeira e defesa de novas práticas de saúde mental, mas também com muitas resistências e disputas de modelo de cuidado. Portanto, foram desenvolvidas ações de planejamento, redução e regulação de leitos, além de ações de educação permanente para construção da nova unidade, e mudança de processos de trabalho, envolvendo minimante os atores implicados com esta vivência, sejam trabalhadores, gestores ou representantes do controle social, por cerca de dois anos. Fato este inserido num contexto, em que ao longo de 20 anos, muitos foram os desafios e as ações possíveis desde 2001, com habilitações e ampliações dos Centros de Atenção Psicossocial e implantação do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares-Psiquiatria, com redução significativa de leitos em hospitais psiquiátricos, seguida da implantação de leitos de saúde mental em hospitais gerais com incentivos estadual. Seguidas da implantação e expansão de uma Rede de Atenção Psicossocial, com diversos pontos, como oficinas, núcleos de apoio, redução de danos, unidades de acolhimento, CAPS 24h e Serviços Residenciais Terapêuticos, nos componentes da atenção básica, especializada, hospitalar e de desinstitucionalização. De modo que, o fechamento deste hospital ocorre num cenário regional construído há décadas, com muitos avanços e contradições próprias dos processos, que não permitem acomodação da luta antimanicomial, a qual não depende somente de mudanças de estruturas e sim de práticas e princípios pautados em diferentes percepções sobre a loucura e os modelos de cuidado. Contudo, com a redução de 03 hospitais e 500 leitos, para os atuais 151 leitos em 01 Hospital Psiquiátrico na Região, há um inequívoco simbolismo sobre os feitos da Reforma Psiquiátrica na materialização do fechamento de manicômios, porque no entendimento desta autora a manutenção destes, alimenta permanentemente a aceitação do possível ainda desenvolvimento de práticas que dependam das nominadas estruturas fechadas, requeridas contraditoriamente pelas redes de atenção psicossocial, retardando e desqualificando a expertise de criação e construção de novas práticas comunitárias de cuidado em liberdade.