A desigualdade de gênero é refletida em diversas áreas na vida das mulheres, havendo inúmeras estratégias para o controle de seus corpos e de cerceamento das suas possibilidades de existência. Diante disso, o Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde Equidade) da Universidade Federal do Pampa, realizou discussões online sobre as consequências dos desastres climáticos no Rio Grande do Sul para as mulheres. Além disso, realizou visitas a abrigos para pessoas flageladas pela enchente do Rio Uruguai, proporcionando escuta ativa. Dessa forma, este relato de experiência tem como objetivo apresentar e refletir sobre os impactos causados pelas enchentes na vida das mulheres desalojadas. Assim, foram realizadas análises das reportagens divulgadas pelas mídias sobre esse cenário de calamidade no cotidiano dessas mulheres, relacionando à realidade vivenciada nas visitas aos abrigos em Uruguaiana/RS. Nessa perspectiva, foi identificado que as mulheres são muitas vezes revitimizadas dentro das catástrofes climáticas, sofrendo consequências tanto dessa catástrofe quanto das inúmeras expressões da violência de gênero. Outra questão inquietante nesse aspecto, é a inexistência de estudos sobre essa relação apesar da recorrência das cheias em algumas áreas do estado. A insegurança dos abrigos para mulheres e crianças foi evidenciada pelas mídias, que apontaram o aumento do risco de assédio e violência para essas populações. Embora com a finalidade de acolher as desabrigadas após suas perdas materiais e até mesmo familiares, esse foi um dos principais problemas relacionados aos ambientes coletivos. A partir das visitas, foi percebido também o excesso de trabalho a que as mulheres foram submetidas, e a desigualdade na divisão do mesmo. Considerando que, além dos trabalhos exercidos fora de casa, em sua maioria, os afazeres domésticos e os cuidados com os demais membros da família eram responsabilidade feminina. Essa desigualdade relacionada ao trabalho as sobrecarrega mentalmente e fisicamente, pois a situação de estresse a que eram submetidas, segundo os relatos, faziam com que sentissem fortes dores de cabeça além do aumento da pressão arterial. Durante as visitas, também foi possível analisar o perfil dessas mulheres que, predominantemente, eram mulheres negras, em fase reprodutiva e em situação de vulnerabilidade econômica. O que é um reflexo da população brasileira, onde as desigualdades afetam três vezes mais mulheres negras quando comparadas a outros grupos, além disso, as mulheres negras no Brasil geralmente ocupam posições de trabalho precárias e recebem salários menores que brancos e homens negros. Em vista disso, é preciso pensar em ações e políticas públicas voltadas para as mulheres, além de repensar e fiscalizar as que já estão em vigência. Pois, segundo Simone de Beauvoir, “basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados, pois esses direitos não são permanentes”. Refletindo a partir do elucidado, faz-se necessário que haja e sejam ofertados espaços para a discussão da temática, com a participação popular, a fim de potencializar os discursos da população-foco e, consequentemente, pensar de forma coletiva em como minimizar essas violências e desigualdades.