Apresentação: O Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) II é uma instituição especializada em saúde mental, com uma abordagem de caráter aberto e comunitário, que presta assistência a adultos que sofrem de transtornos psíquicos graves ou persistentes. O horário de funcionamento estende-se das 8h às 18h, sem interrupção ao meio-dia. O centro é composto por uma equipe multiprofissional, compreendendo psicólogos, médicos psiquiatras, fisioterapeutas, profissional administrativo, técnicos em saúde mental, técnicos em enfermagem, enfermeiros, assistentes sociais e auxiliares de serviços gerais. Após o acolhimento inicial, é elaborado um plano terapêutico singular para cada usuário, contemplando atendimento individual e participação em grupos terapêuticos e/ou oficinas. Os usuários em estado mais grave permanecem nas instalações durante todo o dia e recebem até três refeições diárias. Objetivo: Relatar a experiência acadêmica das aulas práticas em um Centro de Atenção Psicossocial II. Método: Trata-se de um relato de experiência de acadêmicas do sexto semestre do Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Maria em um CAPS II localizado em um município do Estado do Rio Grande do Sul. A experiência refere-se às aulas práticas da Disciplina de Cuidado em Enfermagem na Saúde Mental durante um período de três dias entre o mês de Maio e Junho do ano de 2024, sob supervisão da Professora responsável em conjunto com a equipe multiprofissional da instituição. Suas instalações incluem recepção, oito salas de atendimento, acessibilidade, como banheiros adaptados para cadeirantes, um amplo pátio para atividades terapêuticas e um refeitório equipado com churrasqueira. Resultados: as acadêmicas, acompanhadas pela professora e equipe multiprofissional, contribuíram para a realização de algumas das atividades desenvolvidas no serviço. As demandas da instituição suscitaram a inclusão das discentes nos grupos de culinária e de “saúde da mulher”, ambos com demanda espontânea, visando a criação de vínculo e o apoio biopsicossocial aos usuários, assim, auxiliando nos cuidados dessa população. Esses grupos possibilitam um espaço terapêutico alternativo ao considerar o conceito de ambiência e clínica ampliada e compartilhada, o qual foi elaborado entre as décadas de 1980 e 1990, mas se popularizou durante a reforma psiquiátrica. Esses conceitos se fazem presentes na Política Nacional da Humanização (PNH), lançada em 2003, que busca pôr em prática os princípios do SUS no cotidiano dos serviços de saúde, produzindo mudanças nos modos de gerir e cuidar1. Isto é, o ambiente terapêutico criado pelo CAPS propicia a valorização da escuta ativa e qualificada, além de integrar os partícipes, profissionais e a comunidade. Essa integração acontece, sobretudo, nos grupos de artesanato, pois é deles que derivam produtos que, posteriormente, são comercializados em feiras municipais pelos próprios usuários, com o intuito de realizar atividades que tenham algum custeio, como viagens. Além de participar da programação usual do CAPS, ao decorrer da vivência, foi possível investigar o prontuário e entrevistar o usuário que se criou maior vínculo, a fim de confeccionar um genograma e ecomapa e aplicar o exame psíquico no mesmo. Este estudo possibilitou não apenas estudar o caso clínico dele na sua integridade, mas também compreender sua história prévia e o cenário atual ao qual está inserido e o quanto eles influenciam no seu prognóstico. Também vale ressaltar que, a partir do que foi desenvolvido em campo, tornou-se viável explorar os aspectos positivos e negativos percebidos. Salienta-se que ocorreu uma desconstrução de imagem por parte das acadêmicas no que se refere ao caráter do centro e público assistido, isto é, ressignificou-se um pré-julgamento que havia sido influenciado pelas mídias e sociedade. O acolhimento da equipe multidisciplinar com as acadêmicas é um fator a se destacar, pois, apesar da grande demanda do CAPS, os profissionais se disponibilizaram a colaborar com o que era proposto por elas, tal qual sanar dúvidas referentes ao funcionamento, gestão e cuidados desempenhados no local. A equipe apresentou-se bastante engajada e solicita aos anseios e demandas trazidas pelos usuários, o que ratifica o motivo de haver um forte vínculo entre eles e os profissionais, corroborando com a adesão ao tratamento. A estrutura da instituição é um ponto positivo, porque encontra-se em um lugar amplo, conservado e aconchegante atualmente, o que facilita a ambiência, interação entre os usuários e a realização dos grupos terapêuticos. Contudo, a localização não é própria, trata-se de um espaço alugado pela prefeitura, no qual o contrato pode vir a ser encerrado a qualquer momento. Os usuários recebem auxilio transporte para deslocamento até o estabelecimento, porém limitado ao usuário e conforme os recursos disponibilizados para o serviço. É importante salientar que mesmo que o serviço trabalhe com a autonomia, eles são expostos a alguns riscos. Por exemplo, evidenciou-se a falta de um profissional atuando como segurança do local para conter possíveis surtos, visto que é perceptível as mudanças comportamentais e de humor ao decorrer da experiência e, por vezes, observou-se o manuseio de objetos cortantes pelos usuários em oficinas. Esse fato é atrelado a falta de investimento nos dispositivos da Rede de Atenção Psicossocial que acaba sobrecarregando o serviço. Durante o período da vivência, a higienização dos usuários mostrou-se precária, como a falta ou má lavagem das mãos, o que gera risco à saúde de todos que consomem as receitas. Porém, há incentivo por parte dos trabalhadores para que os usuários realizem a higiene adequada. Ademais, a realização desses grupos, o direito à alimentação e valorização dos profissionais são ameaçados devido a falta de investimentos e incentivos da gestão, indo ao desencontro do que é previsto pela PNH, pondo em risco a qualidade do cuidado e do cuidador. Considerações finais: A experiência acadêmica a partir das aulas práticas possibilitou um amplo aprendizado na área da saúde mental, além de desmistificar o cenário de um Centro de Atenção Psicossocial, ainda presente na sociedade atual, tanto em relação aos usuários vinculados quanto ao funcionamento da unidade. O CAPS tem grande importância no tratamento, acolhimento, suporte e na reabilitação dos usuários pertencentes. Durante a vivência, foi possível perceber o papel fundamental que a instituição tem na vida de pessoas que convivem com algum transtorno mental significativo. Ademais, durante todo o período das acadêmicas na instituição, a professora e a equipe multiprofissional contribuíram de forma positiva no processo de formação, proporcionando experiência em relação ao funcionamento e atuação da unidade, além do contato com os usuários. Portanto, ao longo da vivência no CAPS II, as acadêmicas conseguiram criar vínculo com os usuários, compreender a realidade de um Centro de Atenção Psicossocial e cumprir com o objetivo da disciplina de Cuidado em Enfermagem na Saúde Mental, por meio da aplicação do exame psíquico, da construção do genograma e ecomapa, e da inserção nos grupos e oficinas.
Referência:
BRASIL. Política Nacional da Humanização de 2003. Brasília: DF, 2013. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf. Acesso em: 9 jun. 2024.