A Psicologia na Amazônia Paraense: uma experiência na ilha do Combu.

  • Author
  • Rafaela Araújo de Souza
  • Co-authors
  • Larissa Azevedo Mende , ROBENILSON MOURA BARRETO
  • Abstract
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    A Ilha do Combu, é um lugar de beleza natural explendida, onde o modo de vida tradicional ainda prevalece. Os moradores têm uma relação íntima com o rio e a floresta, que são fontes de alimento e renda, mas também apresentam desafios únicos para a saúde e o bem-estar. É um microcosmo de tradições e interações humanas com a natureza, oferece um cenário único para explorar a intersecção entre psicologia, sociedade e cultura. Este relato visa descrever uma aula de psicologia da saúde “in loco” e as potencias da aula na vida dos alunos.

    Um grupo de alunos do curso de psicologia da Universidade da Amazonia assistiram aula na Unidade básica de saúde da ilha do combu, um local que fica cercado pelo rio e as sombras das árvores de cacau e açaí. Foram discutidos temas referentes a saúde mental, considerando as particularidades da vida na ilha. Foi essencial a participação do psicólogo que acompanha a comunidade. Inicialmente,foi explanado sobre os objetivos do NASF ( Núcleos de Apoio à Saúde da Família), que baseia-se em atendimentos com equipe multiprofissional atuando de maneira integrada, focando nos trabalhos em grupos, construção de projetos terapêuticos, educação permanente, interconsultas, intervenções no território e na saúde de grupos populacionais e da coletividade, dentre outros, sem um teor ambulatorial, porém, pela demanda alta e poucas unidades básicas que atendam a comunidade, o trabalho passou a ter natureza ambulatorial. Também são feitas, muitas visitas domiciliares e ações sociais. Os acolhimentos são realizados individualmente, porém, se precisarem trabalhar com grupos encontram grandes dificuldades em relação ao espaço apropriado para os trabalhos. Em seguida, o psicólogo falou um pouco sobre o funcionamento da unidade, onde explicou que o fluxo maior de pessoas era pelo período da manhã, pois a partir de 13h da tarde não tem adesão pelos usuários, isso explica-pela rotina da  população que acorda cedo, colhem o açaí, vão até a cidade, vendem e depois voltam para almoçar e já ficam recolhidos em suas casas. Gostam de chegar cedo no atendimento para serem liberados cedo. Por ser uma comunidade conservadora, a procura por atendimentos psicológicos é pouca, as pessoas não gostam de se expor e por isso a procura maior é por serviços médicos. Para a maioria das pessoas da comunidade, o adoecimento mental está relacionado a falta de Deus, falta de ocupação ou falta de sexo. Foi falado um pouco sobre a cultura do local, região com saberes tradicionais, onde acredita-se em curandeiros e a religião é bastante enraizada. Na comunidade, os evangélicos são a maioria, o que favorece muitos conflitos entre estes e as pessoas de credos diferentes, pois existe grande resistência aos saberes tradicionais, favorecendo o preconceito, onde acredita-se por exemplo, que as curandeiras são bruxas, fazem magia negra e feitiços. Segundo o psicólogo, o público que mais procuravam atendimentos, eram os jovens e as mulheres. As pessoas idosas e os homens por terem maior resistência, procuravam os atendimentos quando a saúde já estava bastante debilitada. Sobre as demandas, o psicólogo relatou que muitos adolescentes procuravam ajuda, com histórico de depressão, automutilação, ideação suicida e tentativa de suicídio. As hipóteses levantadas como fatores determinantes, são: relações familiares difíceis, acesso ás mídias sociais que remontam a um cenário com idealização de vidas perfeitas em contraste com a vida na comunidade, cercada de muitas dificuldades principalmente econômicas, cercada por um espaço físico padecedor, de intensas vulnerabilidades estruturais e sociais, falta de perspectiva de melhorar de vida, gravidez precoce, pois meninos e meninas iniciam a vida sexual muito precocemente, abusos e assédios sexuais, dentro e fora da família, vistos pela comunidade como algo comum à realidade e encarados de forma naturalizada.A esquizofrenia, é um dos transtornos que aparecem com frequência nos jovens, que geralmente são associados pela família como espiritualidade não trabalhada, ou a família não aceita e os tratam como loucos. Além da esquizofrenia, a depressão também é comum e tem como fator maior a falta de uma boa relação familiar. Observa-se que as mães geralmente acompanham seus filhos e os pais ficam esperando do lado de fora. Os usuários que fazem abuso de álcool e outras drogas, são os que menos procuram ajuda, quando procuram já estão em situações críticas. Ao contrário do que muitos pensam, por se tratar de uma comunidade ribeirinha, as pessoas possuem acesso à internet, a informação e muitos são bem instruídos. Umas das dificuldades encontradas no atendimento com o psicólogo, é que os usuários acreditam na cura dentro de um período breve. E o papel principal do psicólogo na unidade, é fazer o acolhimento, acompanhar os usuários e trabalhar respeitando os contextos em que vivem. Também, foi falado sobre os Agentes Comunitários de Saúde, como peças fundamentais para fazer a ponte entre os profissionais de saúde e os usuários, através do conhecimento acerca da história de vida da comunidade e fazendo o mapeamento de toda a área. Pontuou que é muito importante fortalecer o vínculo com os usuários para que haja uma boa aceitação dos tratamentos necessários. Apesar da boa articulação política na Ilha e das relações entre ACS e profissionais da equipe de saúde, estes encontram dificuldades para adentrar em determinados espaços da comunidade, além da limitação de combustível e da disposição de lanchas da prefeitura para fazer as visitas. Outro ponto desafiador, é fazer uma boa articulação da saúde com as escolas, pois segundo o psicólogo, a escola possui certo receio da reação das famílias frente as ações planejadas, como por exemplo, falar de abuso sexual, gravidez precoce, dentre outras temáticas. A experiência de assistir aula ‘in loco” contribuiu para uma compreensão sobre a clínica ampliada e as práticas de cuidado. Os alunos de psicologia, relataram que devem pensar em novas práticas de cuidado à saúde mental e não ser um fomentador do cuidado colonizador. Para alcançar comunidades como as ribeirinhas, é necessário se implicar na integralidade do cuidado com muito respeito e vivenciar de perto o dia a dia da comunidade, se colocar à disposição para escutar e treinar o olhar clínico, a fim de compreender a história, as mais diversas formas de subjetividades e construções sociais marcadas pela herança da ancestralidade deste povo.

     

  • Keywords
  • psicologia, saúde, amazônia, educação
  • Subject Area
  • EIXO 1 – Educação
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