É possível pensar que já nascemos morrendo. Assim como, se essa afirmação perturba, de alguma forma, a leitura é porque está implicada em algo sobre o qual não se é ensinado a conviver, ou seja, a morte e, em decorrência dela o luto, para quem fica. Os sujeitos, entre os seres vivos, são os que mais dependem de objetos afetivos para estruturar sua vida e isso pressupõe saber que estão fixados em estruturas do tipo: condições biológicas ao nascer e longa infância, total dependência para sobreviver, presença de outros seres, pois, através deles recebemos cuidados, proteção, afeto para crescermos e nos desenvolvermos. Nesse processo, ao longo da vida, definem-se as pessoas afetivamente significativas e ao lado delas perpassam acontecimentos que agregam sentidos às suas presenças e permanências até que aconteça o dia de sua morte, ou em situações específicas a ameaça a sua vida, como nos casos de laudo positivo para neoplasia. Nessas duas situações é possível perceber a instauração do luto que, de modo geral, é a reação à perda de um ente querido, à perda de alguma abstração que ocupou o lugar de um ente querido (como o país, a liberdade ou um ideal) e assim por diante. O luto pela perda de uma pessoa amada é a experiência mais universal e, ao mesmo tempo, mais desorganizadora e assustadora que vive o ser humano, tendo em vista seu apego afetivo. Dito isso, destaca-se que a vida é feita de pequenos e grandes lutos, através dos quais, o ser humano se dá conta de sua condição mortal, acontecimento social e de conhecimento público, porém, pouco dialogado. Na contemporaneidade exige-se o recalcamento da dor da perda, os sujeitos enlutados tendem a vivenciar sua dor na solidão, talvez porque não saibam como lidar com ele, contudo destaca-se que não há como apagar a presença do ser ausente, nem o necessário processo de luto que não é doença, mas um período necessário para a pessoa passar pela experiência da perda. É um processo longo e doloroso: demanda tempo e energia para ser elaborado, acaba por resolver-se por si só, requer um exame da realidade: aceitar que o objeto amado não mais existe. Trabalho de luto consiste no desinvestimento de um objeto enlutado encontra objetos de substituição para o que foi perdido o que pode influenciar na duração e a intensidade desse sentimento e eles dependerão do histórico de perdas da pessoa, do grau de relação com quem morreu. A perda mais dura seria a de um filho, pois quebra um ciclo "previsível", do tipo de morte, por exemplo, em mortes traumáticas: fase de negação pode ser mais prolongada culpa e revolta podem ser mais intensas. O objetivo é dialogar sobre a importância do cuidado em prol do entendimento das situações luto que vivencia a rede de apoio de pacientes oncológicos. A partir de uma intervenção com práticas de Atividade Física (AF) do curso de Educação Física Licenciatura da Universidade Federal do Pampa, campus Uruguaiana, na Associação de Apoio a Pessoas com Câncer (AAPECAN), dialogamos no retorno da atividade a aula, com a autorização das instituições e dos sujeitos presentes sobre anotações acerca de seus comportamentos e narrativas referentes aos seus sentimentos. No grupo de discentes estudamos sobre as fases do luto e como elas se faziam presentes naquele contexto. Realizamos as anotações em um bloco e antes de pensar em aproximá-las de uma fase ou outra, conversamos sobre como elas eram significadas por nós, como as percebíamos nas nossas vidas e como poderíamos trabalhar as questões de luto em nós, para depois projetar uma análise nas narrativas alheias. Os sintomas do luto são organizados em fases, são elas: choque, negação, raiva, depressão e aceitação. Inicia pela descrença (choque, negação) é subsequente ao acontecimento (óbito ou resultado de exame clínico-laboratorial). Nesse momento é visível um torpor ou dormência emocional, que, geralmente é que possibilita a realização dos procedimentos burocráticos, porém pode vir a ser um problema caso persista. Com relação a esse acontecimento foi possível perceber um escape por parte dos acompanhantes, na falta do que dizer para alavancar o sujeito adoecido eles buscavam ser ativos em outras áreas, como organização dos medicamentos, documentação para aposentadoria, entre outros. O segundo momento é denominado fase de agitação, a qual deriva da ânsia pelo que foi perdido e se caracteriza pela dificuldade de relaxamento ou concentração. Aqui, a questão central era conseguir olhar nos olhos do sujeito, perceber nele a vida, ainda presente. O receio do toque, algo que parecia já terem abandonado, mesmo ao lado. Depois ocorre um deslocamento para o sentimento de revolta contra sujeitos envolvidos na ocorrência do luto (profissionais da saúde, familiares, amigos e, também, quem veio a óbito ou está doente por não ter impedido a ocorrência). Foi visível o quanto as pessoas buscam explicações para o corrido, por vezes, acusando o sujeito adoecido, esquecendo que o mesmo está na sua frente, durante o relato. O quarto momento envolve o sentimento de culpa que é relativamente comum, pois, envolve estruturas psicológicas de contraposição (alívio e culpa) quase simultâneos e, com isso, ampliar os quadros de confusão mental. Aqui foi possível perceber a busca por técnicas, soluções orientadas pela ideia de reversão do quadro clínico. Por fim, são comuns períodos de tempo conduzidos por grande tristeza, depressão, retiro e silêncio, esse quadro tem seu ápice em quatro a seis semanas. Nesse momento, destaca-se o quanto alguns acompanhantes se afastaram das atividades para observarem os momentos de descontração daqueles que acompanham. Os olhares eram de contemplação, tristeza, afeto, marcados pelo silêncio e posicionamento nos cantos da sala. Com o que foi exposto, percebe-se que a Educação Física apresenta potencial para atuar nesses casos. A defesa para tal afirmação centra-se na ideia de que pela AF é possível (re)aproximar as pessoas (pacientes oncológicos e seus acompanhantes) ou melhorar seus vínculos, partindo do pressuposto de que o laudo não é o fim e que o óbito é um processo natural da vida. Com todos os benefícios possibilitados pelas diferentes AF parece oportuno que elas sejam incluídas em casos terapêuticos que derivam dessas situações, a fim de evitar o acometimento do luto patológico, o qual é configurado por um conjunto de ações produzidas pela psiqué, retomando ou reiniciando inclusive as fases iniciais do luto, o que é possível pelo avanço inadequado de uma para outra ou pela fuga antecipada da situação. Nesse sentido, a Educação Física, poderia ser trabalhada junto a equipes multiprofissionais na intenção de desenvolver habilidades físicas e atividades de cunho lúdico criativa para ressignificar as situações que produziram o luto.