Trata-se de um relato da experiência de estágio em docência realizado na disciplina de Psicologia para estudantes do 4º período do curso de Bacharelado em Enfermagem. O estágio, vinculado ao Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu em Educação da Universidade Estadual de Montes Claros, é um dos requisitos para obtenção dos títulos de mestre e doutor no Programa de Pós-Graduação Strictu Sensu em Ciências da Saúde da mesma universidade.
O estágio em docência é uma etapa fundamental na formação de professores, contribuindo para a integração da teoria com a prática, o desenvolvimento de competências essenciais e a preparação para os desafios da carreira docente.
O interesse pelo estágio nesta disciplina surgiu da atuação profissional da estagiária como psicóloga hospitalar que, além de prestar assistência aos pacientes e familiares, também orientava as equipes de enfermagem quanto ao manejo emocional dos usuários de forma a tornar a assistência mais humanizada e os profissionais mais autônomos no manejo de situações com esses aspectos. Enquanto psicóloga, também realizou rodas de conversa com estudantes de cursos técnicos em enfermagem com temas relacionados ao acolhimento de usuários dos serviços de saúde nas mais variadas circunstâncias. Com estas experiências, notou que esses profissionais possuem deficiências de conhecimentos e práticas relacionados à esta temática. Desta forma, o objetivo com o estágio docente nesta disciplina foi de oferecer, dentro das possibilidades, informações sobre aspectos psicológicos envolvidos no cuidado que os estudantes de enfermagem poderiam colocar em prática nos estágios ao longo da graduação e, após a conclusão do curso, em suas práticas profissionais.
Obedecendo a carga horária mínima estabelecida pelo programa de estágio, foram ministradas cinco aulas com os seguintes temas: Desenvolvimento Infanto-Juvenil segundo Jean Piaget; As Fases de Aceitação do Adoecimento e o Impacto na Assistência; Processos Psicológicos Básicos; Acolhimento Pós-Óbito e O Luto do Profissional da Saúde. Para definição dos temas considerou-se a relevância dos assuntos e o consenso entre o professor, a estagiária e os acadêmicos.
As aulas eram preparadas previamente, iniciando com um estudo aprofundado dos temas através de referências bibiográficas confiáveis. Todo conteúdo assimiliado era sintetizado para que pudessem ser apresentadas os pontos-chaves para a aprendizagem dos estudantes considerando o tempo previsto de uma hora e quarenta minutos semanais para cada aula. Assuntos na área da psicologia são, geralmente, extensos e planejar as aulas, resumindo esses conteúdos e ministrá-los de forma eficiente em um curto período de tempo foi desafiante, considerando a responsabilidade de levar aos acadêmicos conhecimentos da ciência psicológica que fossem relevantes para sua futura prática profissional em uma disciplina com uma carga horária tão curta. Uma maior carga horária para esta disciplina possivelmente impactaria em um ensino mais amplo.
Na véspera do dia das aulas, vídeos curtos com os slides eram compartilhados como um "spoiler". Essa estratégia tornava os estudantes mais interessados no conteúdo que iria ser ministrado. Outro diferencial foi quanto ao planejamento de uma das aulas, em que foi permitido aos estudantes escolherem, dentre algumas opções de temas, qual assunto eles tinham mais interesse em aprender. Para isso foi realizada uma enquete no grupo da turma no WhatsApp e, após, foi realizada, através de uma platafora digital, a busca pelos motivos que os levaram a escolher o tema, partindo de um modelo de educação dialógica e de estímulo á autonomia proposto pelo renomado educador brasileiro, Paulo Freire (2011). Esse grupo virtual, do qual o professor e a estagiária também faziam parte, tornou-se um espaço de esclarecimento de dúvidas e de conpartilhamento de informações de interesse da disciplina.
Foram utilizados a metodologia de aula expositiva e dialogada; recursos como vídeos, slides com imagens e exemplos através dos quais buscou-se apresentar aos acadêmicos como a psicologia pode contribuir com a enfermagem no que tange ao manejo emocional de usuários dos serviços nos quais se inserirão, valorizando a bagagem de conhecimentos que eles já possuíam, pois como postula Freire (2011), o que é ensinado em sala de aula precisa fazer sentido para os estudantes e com os feedbacks dos acadêmicos e do professor, notou-se que este objetivo foi alcançado.
O processo de avaliação se deu pela observação da participação dos estudantes nas aulas, por meio da frequencia aos encontros e discussões das situações-problemas que eram colocadas, mas sobretudo, através das apresentações de trabalhos em equipes nos quais, os principais critérios avaliados foram: organização, conhecimento e comprometimento. Metade da pontuação pelo trabalho era dada pelo próprio avaliado, sendo assim, ao final da apresentação, cada integrante dos grupos deveria se autoavaliar justificando sua nota. Procurou-se estimular, nesses momentos, o pensamento crítico e a ação transformadora dos acadêmicos idagando-os sobre como foi a experiência com a realização da tarefa e como percebiam a contribuição dos conhecimentos adquiridos na prática profissional enquanto futuros enfermeiros. Essse método avaliativo é uma forma de descentralizar a responsabilidade pela avaliação do estudante, oferecendo a ele a liberdade para refletir sobre o próprio desempenho. Isso remete ao que Freire (2011) defende: os educadores devem incentivar os educandos a se tornarem sujeitos de sua própria aprendizagem, assumindo a responsabilidade por seu crescimento e desenvolvimento. Ademais, este modelo de avaliação, que não envolve a aplicação de provas para aferição da aprendizagem, mas sim o trabalho em equipe e a construção do conhecimento, se apresentou pertinente, considerando tratar-se de uma disciplina de psicologia.
Um destque foi o papel do professor responsável pela disciplina como supervisor do estágio. Este esteve presente em todas as aulas ministradas pela estagiária, mas limitando-se a ser uma presença silenciosa, permitindo que as aulas fossem dirigidas conforme planejado por ela, sempre transmitindo confiança no trabalho que estava realizando, isso cotribuiu positivamente com o bom desempenho da formanda. Além disso, ele também dispôs parte de seu tempo para oferecer supervisões em que discutia sobre os temas, esclarecia dúvidas, oferecia sugestões de melhorias, acolhia angústias, incentivava e compartilhava as rotinas dos docentes que vão além de preparar e ministrar aulas.
Na avaliação do supervisor, a participação da estagiária em praticamente todo o semestre letivo agregou mais saber à disciplina trazendo um arejamento das ideias e das aulas das quais ela participou, seja na qualidade de ouvinte/observadora ou como protagonista naquelas em que assumiu a responsabilidade de ministrá-las e o fez com total desenvoltura.
Ao longo do estágio, os acadêmicos, em um processo de transferência, viram, na estagiária, a figura de uma professora, tratando-a por diversas vezes como tal. Também foi possível perceber o crescente interesse dos estudantes pela disciplina. Ao final do estágio, os acadêmicos foram solicitados a opinar, anonimamente em formulário digital, sobre o trabalho realizado pela estagiária, ao que, prontamente, relataram a experiência como positiva e, essencialmente, compreenderam como as duas áreas – psicologia e enfermagem – podem se correlacionar.
O estágio na disciplina de psicologia na enfermagem possibilitou a compreensão do processo de ensino e aprendizagem, revelou-se uma experiência enriquecedora para estagiária, estudantes e professor; e despertou o desejo da formanda em contribuir, na docência, com a formação de futuros enfermeiros pois, acredita-se que a instrumentalização desses profissionais por meio do conhecimento proporciona um cuidado ainda mais humanizado às pessoas que serão atendidas por eles, ao passo que reduz o adoecimento mental desses trabalhadores ao ajudá-los a tornar o cotidiano de trabalho um pouco mais leve. Assim, parafraseando Freire (2011), “com a educação podemos intervir no mundo”.