Em 25 de janeiro de 2019, a barragem de rejeitos da Mina do Córrego do Feijão, propriedade da Vale S.A., em Brumadinho-Minas Gerais, rompeu-se, causando o vazamento de 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos. 272 pessoas morreram e 3 ainda estão desaparecidas. 48 municípios foram afetados pela poluição do rio. Para reparar os efeitos da tragédia, em fevereiro de 2021 foi celebrado um Acordo de Recuperação Integral, entre a empresa e o poder público. Entretanto, devido a problemas desde a elaboração, o acordo vem se mostrando insuficiente para solucionar os problemas enfrentados pela população. Partindo da pergunta de pesquisa “O Acordo de Recuperação Integral tem sido capaz de fornecer soluções de qualidade para a população afetada pela tragédia de Brumadinho?”, este trabalho tem como objetivo analisar o processo de construção e o texto do acordo, à luz de referências teóricas sobre relações intersetoriais, governança e tragédias socioambientais e diretrizes internacionais. Ele também busca trazer à tona as vozes da comunidade sobre o processo de reparação. A revisão teórica é transdisciplinar e envolve: as Epistemologias do Sul, a Maldição dos Recursos Naturais, o Neoextrativismo, novas perspectivas sobre a teoria dos stakeholders, o diálogo entre mutualidade e moralidade nas empresas, problemas perversos e a Gestão dos Bens Comuns. Também foram objeto de estudo a legislação brasileira e as condições para Reparação Integral, propostas pela ONU e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. O trabalho adota a abordagem qualitativa, examinando experiências e aspectos do imaginário dos participantes, a articulação de processos sociais e seus significados. Os dados foram coletados por pesquisa bibliográfica –do texto do Acordo de Reparação Integral, artigos, manifestos e documentos publicados por coletivos, movimentos sociais e associações de atingidos – e por observação não-participante, em reuniões da comunidade. A análise envolveu o texto do Acordo e o contraponto das vozes da comunidade. Os dados demonstram que, contrariando as definições teóricas, a população não foi protagonista na construção do acordo: as manifestações mostram que o poder público que deveria tutelar os direitos da população, tutela os próprios atingidos. O documento, elaborado sem a participação da comunidade, contém contradições dentro do próprio texto – as bases teóricas para a construção do processo não foram levadas em consideração em várias das determinações. A fragilidade na construção deu origem a problemas que vem afligindo a população ao longo do tempo, num processo constante de revitimização. O Acordo de Reparação Integral no caso da tragédia de Brumadinho caracteriza uma tentativa de solução linear para um problema perverso - que, por natureza, não admite esse tipo de solução. Dado que não foi, comprovadamente, um acidente, a situação é caracterizada como resultado das ações de um free rider e suas consequências. O Acordo configura uma solução top-down, pouco eficiente, como demonstrado pela literatura, pois não oferece aos afetados a possibilidade de se organizarem e liderarem a solução dos problemas.
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