Como um estudo exploratório, apresenta-se no corpo deste artigo um panorama do pensamento político e social de Francisco de Oliveira, intelectual que, como se sabe, esteve envolvido em importantes iniciativas institucionais, tanto no âmbito da produção científica quanto no campo da política efetivamente, tais como o Banco do Nordeste, a Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste), o CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) e o PT (Partido dos Trabalhadores). Mas mais do que explorar a sua trajetória intelectual e política, o que nos interessa compreender são as principais marcas e movimentos do seu pensamento ao longo de, aproximadamente, sessenta anos. Considerando o conjunto de seus escritos, publicados entre os anos de 1960 e os primeiros anos do século XXI, quais são as principais características e inflexões de sua obra? Como interpretá-la à luz das grandes tradições teóricas (liberalismo, republicanismo, socialismo etc.) e das linhagens de pensamento político brasileiro (conservadorismo, autoritarismo, liberalismo, comunismo etc.)? Adotamos a interpretação de que o pensamento desse autor ficou marcado pelo crescente distanciamento do nacional-desenvolvimentismo, nos anos 70, e pela sua inserção, a partir daí, na tradição do comunismo. Nesse sentido, o pensamento de Chico de Oliveira parece partir daquilo que Antonio Candido chamou de “radicalismo de classe média” - em um contexto em que ele já criticava o ideário nacionalista e desenvolvimentista, no qual se formou, e que impactou fortemente a sua geração - vinculando-se, organicamente, ao comunismo e à linhagem de pensadores brasileiros que tentaram compreender a formação do capitalismo nacional nas condições da periferia. Nesse sentido, seu pensamento parte das correntes igualitárias do liberalismo político, radicalizando-se uma década depois, e se convertendo criticamente à tradição socialista. Essa inflexão parece ter ocorrido a partir da sua participação nos famosos “mesões”, realizados no CEBRAP, nos anos de 1970, em plena ditadura militar, de estudo e debate em torno do livro O capital, de Karl Marx. Além dessa inflexão à esquerda, seus escritos posteriores revelam, doravante, uma contínua crítica ao padrão político brasileiro, marcado pela conciliação e por um papel subalterno no capitalismo global. Como elemento dissonante da esquerda nacional, a obra de Chico de Oliveira tensiona não apenas com os setores conservadores, mas com o próprio campo progressista. A chegada ao PT à presidência da República, com a eleição de Lula em 2002, evidencia esse tensionamento. Se o estudo de sua trajetória intelectual evidencia, como parece ser o caso, uma inflexão teórica, analítica e política importante nos anos 70, em direção ao marxismo, por outro lado, é possível identificar que a concepção de trabalho intelectual que subjaz a essa trajetória é mais ou menos a mesma. Desde os anos 60, ser um intelectual não significa, para esse autor, encerrar-se em um trabalho abstrato e de gabinete, mas, ao contrário, dedicar-se às lutas sociais de seu tempo. A fim de tentar justificar e fundamentar essa interpretação sobre a obra e a trajetória de Chico de Oliveira, recorremos, além das suas próprias obras, a trabalhos que situam as correntes socialistas na história brasileira, bem como a estudos sobre a esquerda no século XXI. Além de não ter sido profundamente investigada, a obra de Oliveira representa, nos séculos XX e XXI, uma tentativa ousada, sistemática e criativa de adaptar teses da tradição socialista ao Brasil, convergindo com a proposta deste Grupo de Trabalho (“Estabelecidos e Outsiders do Pensamento Social Brasileiro”), ao qual esta proposta se submete.
Comissão Organizadora
Maro Lara Martins
Comissão Científica