Pensar no Brasil hoje é pensar em Brasis, mas se existe Brasil é porque a discussão em torno da nação nunca se esgota, esse diálogo parte de como o local e o universal formam o que se entende hoje como povo brasileiro. Talvez um dos primeiros intelectuais a colocar essa questão em debate seja Euclides da Cunha em Os Sertões (1902) quando o autor anuncia a existência de dois Brasis, e somente existiria um Brasil constituído a partir do momento em que o sertão e o litorâneo instaurassem uma comunicação, pois na obra de Euclides há uma contraposição entre o povo sertanejo - que não tem contato com a cultura externa - e os litorâneos - representados na obra como “mestiços neurastênicos” e que estão de alguma maneira em posição oposta para o interior, isto é, para o sertão. A atualidade de sua produção é pertinente quando até hoje essas interações entre os regionalismos são colocadas em discussão, a modernidade da região sudeste do país em relação ao atraso político e socioeconômico que ainda impera em regiões mais afastadas do Nordeste. Ao passo que autores à sua frente vão elaborar formulações que interpretem a nação, mesmo havendo diferenças regionais, logo analisar o processo de formação da identidade nacional é compreender o que é autenticamente brasileiro, o que nos torna o que somos? O que dá brasilidade ao brasileiro?
No processo de formação os principais intelectuais que contribuíram para a compreensão dessas identidades são Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Antonio Candido, nas décadas de 30 e 50, estes intérpretes são os responsáveis por realizarem a mediação simbólica entre o popular e o nacional, eles são responsáveis por dar unidade ao povo brasileiro e só dão unidade à nação a partir de uma cultura já consolidada que vai servir-lhes de terreno para sistematizá-las. Mas essa identidade não é criada de maneira isolada, os intérpretes e suas produções atendem demandas que partem do Estado e, portanto, são cooptados simbolicamente pela classe dirigente.
O objetivo do trabalho foi verificar se os três autores e suas principais obras construíram uma identidade brasileira, além de localizar a relação desses intelectuais com o Estado.
A metodologia do trabalho se deu através de levantamento bibliográfico, análise e reflexão das obras selecionadas.
Os resultados preliminares são que esses intérpretes não somente pensaram na sociedade brasileira. Gilberto Freyre em Casa-grande & Senzala, Sérgio Buarque em Raízes do Brasil e Antonio Candido em Formação da Literatura Brasileira, todos, intelectuais de seu tempo, mas que atravessaram sua época, tornaram-se clássicos. Sistematizaram a partir da sua literatura uma identidade que refletisse o que aqui existia. Mas além de sistematizar eles inventaram uma tradição brasileira, - no sentido que Eric Hobsbawm dá ao termo - eles inventaram um Brasil. A Democracia racial de Freyre, o Homem cordial de Buarque e o Sistema literário de Candido oferecem uma amostra do que se pode considerar genuinamente nacional, a mestiçagem? O “jeitinho” brasileiro? O romantismo machadiano? Essas e outras perguntas colocam em questão a produção clássica dos autores de modo que se explique questões do cotidiano com a ótica do passado.
Por fim, analisar o Brasil é entender o processo de construção do ser nacional. O carnaval, a malandragem, o samba e o futebol são a marca visceral do brasileiro, portanto esses elementos dão ao povo a sensação de pertencimento e união. Eles estão por toda parte: Zé pelintra como um genuinamente carioca, a pintura de Candido Portinari chamada O Mestiço como representação do processo de junção das raças aqui existentes, as gloriosas Copas do mundo onde o Brasil venceu como orgulho nacional, os desfiles carnavalescos como momentos únicos no ano. Esses simbolismos dão materialidade para entender a cultura nacional. A produção intelectual contribui para então dar sentido ao povo, eles pintaram um quadro chamado Brasil e o fizeram por meio de uma tinta muito especial: o povo brasileiro.
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Maro Lara Martins
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