Depois de uma aceleração do crescimento na primeira década do século XXI, a retomada conservadora e a persistência da crise econômica brasileira levantaram questões sobre as possibilidades de retomada de pensar e agir em prol do desenvolvimento. O otimismo da primeira década do século XXI, cujas manifestações de 2013, em parte, demandavam saltos maiores na qualidade de vida das pessoas, se desmoronou diante da grande queda pelo qual a economia brasileira passou desde o final de 2014. Nesse período, a economia brasileira passou por um novo ciclo liberal-conservador, com aprofundamento da desregulação, privatização e austeridade que contribuíram para o aumento da pobreza e da vulnerabilidade social.
Cabe questionar, contudo, se a atual crise é meramente cíclica ou faz parte de um movimento mais amplo e estrutural do capitalismo brasileiro. A década de 1980 levou a alcunha de “década perdida”, em virtude das baixas taxas de crescimento, a década de 1990, a das reformas neoliberais, por sua vez, não teve melhor resultado e a atual década, a de 2010, revela uma nova década perdida. A persistência da baixa taxa de crescimento nas últimas quatro décadas nos leva a perguntar: a economia brasileira tem passado por um processo de estagnação econômica? Esse fenômeno é estrutural?
Em meio à desaceleração cíclica no início da década de 1960, no Brasil, Celso Furtado iniciou um debate sobre a estagnação econômica. A tese buscava responder o porquê do baixo crescimento econômico brasileiro após o final do bloco de investimentos do Plano de Metas, e apareceu de forma sistematizada em seu livro “Subdesenvolvimento e estagnação na América Latina”, cuja primeira edição foi publicada em 1966 (FURTADO, 1968). Tendo encontrado resistências dentro da própria heterodoxia econômica, a tese da estagnação foi durante criticada, sendo considera superada pelo próprio Furtado. Também contribui para a crítica a retomada do crescimento nos períodos denominados de “milagre econômico” (1968-1973) e do II Plano Nacional de Desenvolvimento (1974-1979). Maria da Conceição Tavares e José Serra foram os principais opositores à tese de Furtado, em meio à retomada do crescimento econômico ao final da década de 1960. Relegou, assim, a tese de Furtado ao plano de uma mera desaceleração cíclica e teoricamente insuficiente, embora concordassem com os questionamentos de elementos da dinâmica social como a distribuição de renda e a reforma agrária. Francisco de Oliveira, a partir da matriz marxista, contribuiu para a crítica às concepções dualistas em texto de 1973. Desde então, o debate da estagnação econômica ficou marcado como capítulo particular da história do pensamento econômico latino-americano, mas a tese da estagnação, naquele momento, foi entendida como frágil.
A economia brasileira apresentou um breve surto de crescimento na primeira década do século XXI, com taxas de crescimento do PIB de 6% em 2007 e 7,5% em 2010. Contudo, na última década, o Brasil está imerso no baixo crescimento econômico, baixa dinâmica industrial, reprimarização das exportações, e aumento manutenção do elevado patamar da desigualdade econômica e social. Portanto, problemas estruturais, resultados da crise e estagnação.
Em vista das questões colocadas sobre o baixo crescimento da economia brasileira, revisitar e atualizar os clássicos do desenvolvimento faz-se, portanto, urgente! Ao retomar as contribuições de clássicos do desenvolvimento econômico, atualizando suas contribuições, o campo das elucidações teóricas e analíticas podem auxiliar no entendimento da realidade social brasileira e buscar, a partir daí, elementos para ações concretas.
Este artigo visa contribuir para o debate ao buscar atualizar a tese da estagnação econômica de Celso Furtado à luz da crise estrutural brasileira, manifesta após o esgotamento do modelo de industrialização por substituição de importações (ISI). Para atingir tal objetivo, o artigo é organizado em duas seções. Na primeira, busca-se retomar o debate da estagnação econômica, com ênfase nas teses de Furtado, Tavares e Serra e Oliveira, em seu contexto histórico. Na segunda seção, questiona-se sobre a atualidade da tese da estagnação econômica, revistando as contribuições dos autores supracitados. Por fim, nas considerações finais, faz-se um balanço crítico das contribuições dos autores para a compreensão da crise brasileira.
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Maro Lara Martins
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