As mulheres que superam as barreiras iniciais, as quais buscam restringir a sua participação ao ambiente privado, e procuram participar da vida pública concorrendo em um processo eleitoral, encaram um novo universo de dificuldades. As candidaturas não recebem o mesmo suporte das masculinas pelos partidos políticos, incluindo o desigual aporte financeiro e a falta de divulgação e espaço midiático.
Alguns momentos da construção de uma política de gênero no processo eleitoral brasileiro merecem destaque. Em 2009, foi estabelecido a obrigatoriedade de cada partido ou coligação preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada gênero (Lei nº 12.034/2009). Dessa forma, a reserva de vagas que antes não era imperativa, passou a ser obrigatória.
No ano de 2018, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.617, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a aplicação de recursos financeiros do Fundo Partidário de forma proporcional às campanhas de candidaturas femininas.
Ainda em 2018, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na Consulta n. 0600252-18.2018.6.00.0000, esclareceu também a obrigatoriedade da destinação de no mínimo 30% dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, bem como do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV à participação feminina.
Este contexto legal envolve a pauta da discussão mobilizada no Congresso para a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº. 9/2023, de iniciativa do Deputado Paulo Magalhães do PSD/BA, visando anistiar os partidos políticos que não cumpriram a legislação.
O presente trabalho tem como objetivo discutir as conseqüências da aprovação da proposta em votação no Congresso Nacional. Como objetivos específicos, o estudo busca (1) compreender a evolução da política de cotas de gênero para as eleições no Brasil e (2) apresentar uma análise da ineficácia social da norma e a consequente sub-representatividade feminina no parlamento, através de dados estatísticos disponibilizados pelo TSE.
A metodologia compreende a revisão crítica da bibliografia, das normas e das decisões judiciais sobre o tema, incorporando de forma subsidiária os dados disponibilizados pela Justiça Eleitoral sobre as eleições brasileiras no portal TSE Mulheres.
Os resultados do estudo apresentam o pouco progresso que efetivamente é encontrado no cenário político e as constantes anistias aos descumpridores das normas. Caso aprovada a PEC, será a quarta vez que regras referentes às cotas de gênero na política são afastadas para absolver os partidos que descumpriram a lei (NOGUEIRA; MARUCI; ASTROLABIO, 2022).
Apesar de atualmente a bancada feminina no Congresso ser a maior da história, há apenas 91 parlamentares eleitas na Câmara dos Deputados (18%) e 4 Senadoras (15%). Isso, mesmo o Brasil possuindo 53% do eleitorado feminino (TSE MULHERES, [S.d.]). No que se refere às Câmaras Municipais, no ano de 2020, somente 16% dos vereadores eleitos foram mulheres (TSE MULHERES, [S.d.]). Os dados retratam a dura realidade do ambiente político, que é marcado por violações constantes às mulheres.
A compreensão de que não é possível alcançar um Estado verdadeiramente democrático enquanto for mantida a sub-representação de gênero e, acrescenta-se, de raça, nos cargos políticos, é de suma importância. A pluralidade social brasileira não espelhada no parlamento impossibilita o desenvolvimento de políticas públicas adequadas, calando parte substancial da sociedade que não encontra voz para exercer a plenitude de sua cidadania. Os lentos passos dados até então não satisfazem a necessidade de mudança e a PEC 9/23 é mais um capítulo das reiteradas absolvições aos que descumprem a legislação.
A discussão acerca da igualdade de gênero no universo político partidário necessita ser intensificada, sobretudo para não permitir anacronismos e retrocessos nas poucas conquistas já alcançadas. Ao contrário, é necessário avançar no debate para discutir a previsão de paridade a partir da reserva de cadeiras no parlamento ou do implemento de um sistema de listas fechadas que propicie a efetiva colocação de mulheres nos espaços de poder político.
Referências simplificadas
TSE MULHERES. Estatísticas Eleitorais. [S.d.]. Disponível em: TSE Mulheres - Justiça Eleitoral (justicaeleitoral.jus.br) Acesso em 10 de jul. 2023.
NOGUEIRA, Mariana; MARUCI, Hannah; ASTROLABIO, Laura. Cartilha Incidência Política. 2022. Disponível em: CARTILHA-2.pdf (atendadascandidatas.org). Acesso em; 05 de jul. 2023.
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