Quando pensada a condição histórica da intelectualidade em sua função moderna de indagação e busca de solução aos problemas sociais, cabe considerar de qual problema se fala, por que e para quem se fala, buscando localizar tanto a condição de tempo quanto de espaço e classe. Aqui adentra a questão social como categoria analítica para se pensar a historicidade dos projetos políticos, onde a própria questão social deve ser examinada como um resultado e também processo histórico. Mais que isso, a compreensão da questão social a partir de linhas ideológicas nos conduz a uma exegese tanto de suas expressões no tempo, isto é, os problemas que a define, quanto dos elementos discursivos e práticos de quem a articula. É partindo desses pressupostos que esta pesquisa tem como objeto a atuação intelectual de Godofredo Nascentes Tinoco (Macaé, 1897 - Campos dos Goytacazes, 1983), tendo em vista sua inserção pública na política e cultura do cenário fluminense durante grande parte do século XX. O recorte em questão, demarcado pela Era Vargas (1930 - 1945), justifica-se por ser um momento fértil nas elaborações ideológicas e, consequentemente, políticas sobre os problemas sociais nacionais, mas principalmente por ter sido Tinoco um articulador assíduo no quadro de ruptura instaurada pela dita Revolução de 30. Nesse quadro, encontram-se movimentos políticos indispensáveis para a concepção do que Vargas inaugura, guiando a pesquisa para a década que o antecede. Assim, tem-se como objetivo geral caracterizar a presença da questão social nos movimentos precedentes à 1930 a partir da participação prática e ideológica de Godofredo Tinoco nesses movimentos, onde nela coincidem condições de um contexto nacional, regional e local de características específicas e imbricadas. Para tanto, inicialmente é identificado a intelectualidade de Godofredo Tinoco dentro do rastro familiar, herança política, redes de sociabilidade e composição de classe a partir da participação da família Tinoco na imprensa e no setor sucroalcooleiro, enfatizando exatamente esse seu primeiro período de atuação política. A seguir, objetiva-se classificar o tratamento conferido à questão social dentro do tenentismo e suas ramificações - como a Aliança Liberal Clube 3 de Outubro e a - em paralelo com a questão social nacional do começo do século e a própria da cidade de Campos dos Goytacazes dentro dos diagnósticos de Tinoco. Finalmente, tem-se como resultado mais inédito, localizar a Coluna Gwyer dentro do movimento tenentista e a participação de Tinoco na função de capitão da coluna. Articular essas amplas categorias de atuação do intelectual, em todas as variáveis mencionadas, requer recursos metodológicos bem delineados. Assim, nossa metodologia parte do campo da história intelectual exatamente por este procurar o que Whatmore (2015) resumiu como o Zeitgeist, as visões de mundo, as ideias unitárias, mentalités, exemplos de hegemonia cultural, campos de discurso, sistemas de signo, epistemes e palavras-chaves, num exercício de busca que, nesta pesquisa em curso, se faz pela análise documental dos escritos e diálogos públicos e privados do intelectual em questão. Em vista dos objetivos aqui pontuados, o levantamento documental, realizado no Arquivo Nacional e Instituto Histórico Geográfico Brasileiro - duas das instituições onde o acervo Tinoco encontra-se desmembrado - foram priorizados: relatórios, correspondências e discursos dos anos de 1930 a 1935, o jornal O Dia - no qual foi proprietário e diretor - em todas suas edições de 1924, 1930 e 1932, e o livro Tempo Bom… No setor Leste de 1931 - onde Tinoco faz o levantamento de todo movimento da Coluna. Até aqui, tem-se em vista algumas categorias da questão social delineada por Tinoco dentro dos movimentos, sendo elas o problema da produção açucareira, a questão do voto e fraudes, o problema do imposto de renda e, principalmente, a questão do trabalhador rural. São, portanto, enunciados que já nos apresentam uma amostra de como elementos de ordem nacional cruzam com os de ordem regional e local, neste caso, o açúcar e o trabalhador rural em protagonismo nos discursos sobre Campos. Ademais, vê-se atravessados aos problemas regionais resquícios eminentes de uma narrativa própria do niilismo, sobrevivendo mesmo passados anos à morte de Nilo Peçanha, bem como um espectro em torno da capitalidade da cidade que ressurge em 1930.
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Maro Lara Martins
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