O artigo busca traçar analogias indiciárias entre as cidades de Viena (Áustria) e de Vitória (Brasil), em torno do sentimento urbano de vir a ser moderno, na passagem ao século XX. Portanto, toma-se como argumento que, em ambas cidades, a expansão comercial fundamentou o ideário da elite dominante em ascensão, por meio de um empreendimento ético e estético particular de cidade moderna. Considerando a modernidade o campo reflexivo sobre o curso das manifestações culturais, artísticas e, nesta abordagem, arquitetônica e urbanística, acolhemos neste estudo, o recorte temporal pré-modernista (1890-1922). Carl Emil Schorske analisa em “Viena fin-de-siècle: política e cultura”, maneiras pelas quais a sociedade vienense operava em suas contradições éticas e estéticas, sob conjunturas políticas liberais e culturais efervescentes que levaram à construção intersubjetiva de identidade urbana vienense. Em Viena, o grito de modernidade já ecoava, desde o fim do século XVIII, pelas tentativas de ruptura com os modelos antigos, não no sentido de negá-los, mas com a finalidade de se tornar independente deles. Ou seja, o empreendimento de vir a ser moderno vienense seria uma investida sobre a construção da identidade, no ensejo da criatividade da cultura, alcançada pela multiplicidade de abordagens pelos campos do conhecimento, no domínio científico. Por outro lado, na cidade de Vitória, seguindo o ideal de rompimento com o período colonial brasileiro, e ascensão das elites industriais, assimilaram-se concepções urbanísticas positivistas, alinhadas à construção da imagem de nação moderna, importando modelos urbanísticos e profissionais, especialmente, da Europa, desvelando uma de suas principais contradições. Vitória, sob uma típica herança do processo de colonização portuguesa, buscou na geometria ortogonal da malha viária e da arquitetura eclética, o rompimento com a estrutura anti-moderna, observada até o final do século XIX. Portanto, em Vitória, o apelo moderno se constituía na força civilizatória dos modos e costumes da população capixaba que se espelhava nas decisões projetuais urbanas com feições europeizantes. Em Viena, porém, a passagem à modernidade implicava no levante da cultura, como elemento de emancipação intelectual, mediante interações estreitas entre política e cultura na produção do espaço habitado. Seguindo um corpus de estudo da teoria social do processo de interação social simbólica, analisou-se, num primeiro momento, a dinâmica sociopolítica e econômica do estado do Espírito Santo, com ênfase na política dos governadores e seus dilemas, enquanto “estado satélite”. Quanto ao estudo das transformações no sítio físico do núcleo urbano de Vitória, buscaram-se elementos para a apreensão de uma síntese da evolução urbana da capital capixaba, por meio da análise documental disponível no Atlas Urbanístico de Vitória, coordenado pela Dra. Flavia Botechia e pelo Dr. Heraldo Ferreira Borges. Por fim, analisamos algumas ressonâncias na formação da fisionomia urbana da cidade de Vitória, apresentando com isso, indícios sobre os dilemas de ordem política, econômica e social, tomados como reflexo das decisões de governo, em prol da construção da imagem da cidade e da simbolização da vida cotidiana moderna. A experiência de remodelação urbana de Viena fin-de-siècle é frutífera para compreender o papel da cultura na assimilação das contradições socioespaciais e da cidade com o próprio símbolo material e imaginário de modernidade. Dentre os indícios analógicos entre as cidades, emerge o contraste de experiência moderna pela via cultural, uma vez que, em Viena houve grande aproveitamento na forma urbana da camada intersubjetiva, pois alcançou a unidade do indivíduo psicológico moderno que habita os espaços. Em contraste, no núcleo urbano de Vitória, ainda que os esforços para manter a lógica de integração da cidade com os elementos naturais, permitindo a permanência de seu valor estético pinturesco, os estudos apontam para o provimento da infraestrutura urbana básica, como condição primordial à vida moderna, em Vitória.
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Maro Lara Martins
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