A luta por reconhecimento: Raymundo Moraes, um intelectual regional em busca de renome nacional. A luta por reconhecimento: Raymundo Moraes, um intelectual regional em busca de renome nacionalPrincipalmente ao longo das décadas de 1920 e 1930, o escritor e jornalista paraense Raymundo Moraes publicou uma série de livros, a maior parte deles dedicada a estudos sobre a região amazônica. Escrevendo em um estilo erudito e rebarbativo, o escritor mostrou-se um comentarista da realidade regional, descrita e pretensamente explicada em seus livros editados, inicialmente, em Manaus e Belém, e posteriormente em grandes editoras sediadas no Rio de Janeiro. A maior parte de seus textos não ficcionais versa sobre temas científicos, embora as coletâneas do escritor discutam também assuntos políticos e de crítica literária e cultural. Sua obra completa inclui 11 coletâneas de ensaios, um dicionário e um livro de fábulas folclóricas, três romances e uma biografia de Machado de Assis. Um dos aspectos mais curiosos da trajetória de Raymundo Moraes foi sua formação incomum. Cursou apenas a escola primária, e atuou três décadas como prático e comandante de navios na bacia amazônica, tendo adquirido saber de forma autodidata. Especializando-se na difusão de temas regionais, assimilou conhecimentos amplos e diversificados, de forma que em seus livros é possível encontrar digressões sobre geologia, paleologia, antropologia, arqueologia, vários ramos das ciências biológicas, além da cultura humanista clássica. Talvez a ausência de um referendo institucional ajude a explicar os verdadeiros torneios de erudição que ocupam seus livros, sobretudo nos momentos em que o autor comenta com aparente familiaridade as obras dos cientistas e viajantes que haviam percorrido a Amazônia, dialogando com eles e mesmo criticando-os em certos momentos. Embora sua trajetória possa ser considerada bem-sucedida, um travo de ressentimento é perceptível, por exemplo, em sua luta para superar a figura de Euclides da Cunha como grande escritor de assuntos amazônicos. Por isso, compreende-se que, em 1931, ele tenha empreendido uma viagem ao Rio de Janeiro, em busca de apoio a sua candidatura à Academia Brasileira de Letras, espaço de consagração que o fixaria entre os grandes intelectuais nacionais. A originalidade do caso Raymundo Moraes, em suas intrincadas conexões amazônicas e brasileiras, permite entrever diversos cruzamentos entre literatura, política, ciência e jornalismo, e diz muito sobre as dificuldades de afirmação das realidades regionais como relevantes para o país como um todo. Ainda assim, podemos dizer que, no cômputo geral, o reconhecimento nacional da obra de Raymundo Moraes não foi obtido por seu valor estético ou sua qualidade científica, mas pelo simples fato de ser ele um grande especialista em Amazônia, aquele que trazia ao Brasil “moderno” notícias de sua exótica floresta equatorial.
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