O objetivo deste trabalho é refletir sobre a obra da historiadora Emília Viotti da Costa e sua importância para o pensamento social brasileiro. Nosso estudo, portanto, pretende observar a produção de Costa não apenas sob o prisma clássico da escravidão - campo na qual é autora de clássicos obrigatórios e presente em diversos programas de cursos, tanto de graduação, quanto pós graduação - mas também a partir da teoria da história e da chave interpretativa do pensamento social brasileiro. A partir dos anos 1980, época em que a autora já era uma prestigiada professora da Universidade Yale, Costa produziu uma série de artigos, ministrou conferências e orientou pesquisas acadêmicas voltadas para os mundos do trabalho no Brasil e América Latina. Tais publicações são um marco na vida intelectual de Emília Viotti, pois tratam-se de críticas à historiografia da época, principalmente do Brasil, Estados Unidos e Reino Unido. Em suma, Costa demonstrou publicamente uma insatisfação com determinados rumos tomados pela historiografia, enquanto mantinha-se positiva em relação aos avanços de pesquisas em direção aos mundos do trabalhos com abordagens orientadas aos estudos de raça e gênero. A mudança do eixo central de seu pensamento até então não limita ao fato de que agora Costa estava fazendo críticas à historiografia, mas também pelo fato de mudar seu enfoque da escravidão para o trabalho livre e assalariado. Se antes toda sua obra era voltada para a colônia e os tempos do império, Viotti agora passava a pensar o trabalho no século XX, passando por debates sobre o movimento operário da primeira república e temas polêmicos como o populismo. Pretendemos, ao explorar essa faceta do pensamento de Emília Viotti, levantar possibilidades de abordá-la como uma teórica da história e intérprete da sociedade brasileira. No ensaio intitulado A Dialética Invertida, publicado na Revista Brasileira de História, em 1994, Viotti desenvolveu o conceito de inversão da dialética para descrever o movimento realizado pela historiografia entre os anos de 1960 e 1990. Este conceito é fundamental para nosso estudo, pois ele possui dois eixos: crítica da historiografia e interpretação da realidade brasileira. A interface entre esses dois eixos será o fio condutor do nosso debate, portanto, além de refletir sobre suas ideias direcionadas à historiografia e teoria da história, buscamos explorar a dimensão do contexto de desenvolvimento da crítica. Ao analisarmos a continuidade do pensamento de Viotti ao longo de duas décadas, percebemos como sua própria vida intelectual se relaciona diretamente com suas percepções sobre a produção historiográfica. Após ser aposentada pelo regime militar, foi convidada para lecionar em universidades nos Estados Unidos, onde desenvolveu sua carreira até a aposentadoria, em Yale, contudo, sem deixar de refletir sobre a realidade brasileira, mantendo-se uma exímia observadora dos processos históricos a qual o país passava. Viotti foi contemporânea de um movimento de crises e rupturas no seio do pensamento de esquerda, fenômenos tais como a ruptura sino-soviética, a desestalinização do PCUS, a crise do estruturalismo, fizeram parte de um turbilhão de acontecimentos políticos, intelectuais, sociais que marcaram a segunda metade do século XX. Abordar o pensamento da autora nessa perspectiva implica em uma reflexão sobre a aproximação da teoria da história, história da historiografia e pensamento social brasileiro. Afinal, como ir além do texto e compreender o contexto de produção da autora? Quais elementos de sua obra permitem que se afirme que ela é uma teórica da história? Ainda, como uma autora que esteve em grande parte de sua vida intelectual afastada do país pode ser considerada importante para o pensamento social brasileiro? Discorreremos sobre essas duas facetas de sua obra a fim de apresentarmos uma figura fundamental para a interpretação do Brasil nas últimas décadas do século XX.
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Maro Lara Martins
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