O trabalho discutirá a obra do quadrinista e professor Marcelo D’Salete – intitulada Cumbe (São Paulo, 1ªed. 2014) – a partir de três vértices de abordagem: a representação das práticas escravistas presente na narrativa da HQ; a relação da trama proposta pelo autor com os problemas, objetos e dilemas de pesquisa concernentes à historiografia da escravidão; e, por fim, o lugar ocupado por Cumbe e demais publicações de Marcelo D’Salete na discussão política e pedagógica brasileiras ao longo da segunda década do século XXI.
Obra de forte impacto, Cumbe obteve amplo reconhecimento editorial logo após sua publicação que ocorreu em 2014. Já em 2015, foi indicada ao Troféu HQ MIX. Nesse mesmo ano, a HQ alcançou a Europa, sendo publicada na França e em Portugal. Ainda em terras lusitanas, a trama foi selecionada para compor o leque de leituras sugeridas ao ensino básico. Seguindo sua trajetória de sucesso, Cumbe também recebeu indicação para o prêmio alemão Rudolph Dirks em 2017 e conquistou, nos Estados Unidos em 2018, o Eisner Awards por melhor publicação estrangeira. Atualmente, a obra encontra-se em sua segunda edição, lançada em 2018.
Cumbe está organizada em quatro histórias independentes, integradas por um elo coeso em torno da resistência dos escravizados. Para tanto, D’Salete constrói uma narrativa em HQ a partir dos medos, esperanças e ambições dos escravizados e sua relação com o sistema escravista durante o período colonial. Referenciado por bibliografia especializada ao final da obra, bem como por um glossário de termos e símbolos africanos, a HQ oferece um leque amplo de reflexões sobre “o ser escravo no Brasil” da perspectiva do escravizado, abordando sua relação com outros escravos, sua identidade e seus conflitos com os membros livres e brancos da sociedade colonial. O eixo central da apresentação fundamenta-se justamente na problematização da construção das tramas e dos personagens na obra e sua relação com a historiografia da escravidão, mais precisamente, o debate acerca da agência escrava e sua preocupação em indicar trajetórias individuais, sublinhando os papeis dos sujeitos históricos escravizados.
Nesse sentido, a proposta permite não só problematizar a HQ sob o viés do debate historiográfico, mas também possibilita a reflexão sobre as representações da escravidão construídas no século XXI. Dessa forma, abre-se uma vereda para encaminhar questões sobre o lugar ocupado por Cumbe tanto nas discussões político-raciais como nos debates educacionais no Brasil.
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Maro Lara Martins
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