De Patinho Feio a Cisne Real: uma arqueologia do neoliberalismo

  • Autor
  • Jeferson Alexandre Miranda
  • Resumo
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    Neste comunicado, analiso o arcabouço teórico do neoliberalismo ao longo de seu desenvolvimento histórico, percorrendo sua trajetória temporal desde seu surgimento na primeira metade do século XX até seu triunfo pós, derrocada mundial de seus congeneres opositores, a social-democracia e o socialismo. Para alcançar este objetivo, optei por uma revisão bibliográfica sistemática que utilizou livros, trabalhos acadêmicos e toda a gama de pensadores que de alguma forma contribuíram para a construção ideacional do neoliberalismo, desde seus primeiros passos, passando por seu momento de consolidação conceitual, até sua radicalização nas duas primeiras décadas do século XXI. O trabalho está organizado em uma introdução, duas seções e uma conclusão. Na primeira seção, realizo um balanço histórico sobre a gênese e consolidação do pensamento neoliberal no mundo, passando por 4 fases destacadas: (1º) nascimento e primeiros passos; (2º) consolidação teórica e resistência; (3º) ascensão política e dispersão global, (4º) radicalização ideológica e econômica. O objetivo é realizar uma contextualização de forma cronológica, referenciando fatos, acontecimentos e a produção intelectual que se entrelaça na construção deste pensamento. Na segunda seção, discuto como as diversas dimensões do neoliberalismo: político, econômico e social se desenvolveram ao longo do mesmo período, buscando entender suas nuances ou mesmo versões produzidas. O objetivo é estabelecer as zonas proximais entre elas para compreender como este emaranhado de ideias culminaram em suas crenças e práticas atuais. Finalmente, na conclusão, busco fazer um apanhado geral dos elementos debatidos em busca de uma definição mínima de neoliberalismo que nos ajude na análise dos diferentes modelos que existiram ou existem. Os termos “neoliberal” ou “neoliberalismo” parecem causar certo incômodo em vários pensadores de cunho liberal, levando muitos a uma negação da alcunha entendendo-a como pejorativa e até mesmo conceitualmente errada. Existem duas explicações para este desconforto, uma mais hodierna, resultado direto da disseminação que o termo passou a ter após a década de 1980, e outra mais histórica, ligada as próprias raízes genealógicas da criação dos termos. Quanto a primeira, alguns pensadores liberais defendem que o século XXI levou o prefixo “neo” - a frente de liberalismo - a ser usado de forma elástica, sem fundamentos empíricos claros, quase como um guarda-chuva sob o qual muitos grupos diferentes, com diversos pontos de vistas, acabaram sendo reunidos. Até mesmo críticos severos admitem que a doutrina do neoliberalismo é difícil de definir, isto porque ao verificar a enormidade de figuras acadêmicas e políticas referenciadas como neoliberais, o termo ganha contornos escorregadios e mutáveis. É importante salientar que nada disso é irrelevante ou irreal, ao contrário, o neoliberalismo tem uma linhagem pronunciada e abrangente que na defesa do livre-mercado dentro do discurso político atual, é capaz de abranger dentro de si uma ampla gama do espectro ideológico, principalmente quando o discurso econômico é utilizado para conformar um discurso sobre políticas públicas. O resultado é paradigmático, surgindo como preferência geral a desregulamentação, liberalização, privatização, austeridade fiscal, livre-comércio, empreendedorismo individual. A influência destas ideias são tão amplas que elas são impressas nos resultados de políticas e nos estatutos de partidos políticos de direita ou esquerda que ocupem cargos em um determinado país. Concomitantemente, ainda que o conceito sofra de imprecisões de definição e tensões internas entre os seus diferentes adeptos, sua influência externa opera como uma “receita universal” para a política socioeconômica baseada em certas crenças ideológicas que tenham no livre-mercado o seu fundamento. Muitos trabalhos acadêmicos são críticos ao neoliberalismo, considerando-o censurável e usando-o de forma depreciativa, nestes trabalhos o neoliberalismo aparece associado a maioria dos males que enfrentamos mundialmente, entre eles a pobreza, desigualdade econômica, mudanças climáticas, racismo sistêmico e muitos outros. Não é sem razão, diante de tantas críticas contundentes, muitos pensadores adeptos do livre-mercado preferem continuar a ser chamados apenas de liberais. A segunda explicação para o desprazer que o termo neoliberal causa em seus alegados discípulos tem raízes históricas. A expressão tal como a conhecemos hoje surgiu ao longo das primeiras décadas do século XX e, por volta de 1920, ela já era utilizada de maneira similar ao hodierno, mas não como uso particular de uma única corrente. Socialistas como Max Adler e fascistas como Othmar Spann usavam-na de forma depreciadora para atacar os defensores do livre-mercado e das teorias neoclássicas do valor marginalista. Isto parece manter uma correlação histórica com o presente na medida que as críticas levaram os primeiros pensadores nomeados como neoliberais a recusarem a distinção. Seus expositores intelectuais mais comumente invocados – Ludwig von Mises, Milton Friedman e Friedrich A. Hayek – não aplicavam o rótulo a si com regularidade, e o referenciavam apenas esporadicamente em suas obras, isto quando de fato o faziam. É por este fato que enfrento neste trabalho o desafio de, através de seus diferentes momentos históricos, demonstrar como o neoliberalismo, com tão poucos adeptos autoproclamados e pouco reconhecimento comum até a virada do século XX, alcançou o destaque no discurso contemporâneo. Como que um descritor utilizado de forma tão depreciativa se transformou um conjunto fluido de crenças socioeconômicas capaz de redefinir o mundo capitalista na atual ordem mundial.

     
  • Palavras-chave
  • Neoliberalismo; Liberalismos; Pensamento Político
  • Área Temática
  • GT15 - Temas, argumentos e arenas na construção das narrativas da Nova Direita
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O 4º Seminário de Pensamento Social Brasileiro: intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, será realizado entre os dias 2 e 6 de junho de 2025, no formato híbrido. A programação presencial será realizada nas dependências do CCHN-Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, enquanto a programação virtual será transmitida pelas páginas oficiais do evento no YouTube e pela DoityPlay. Nesta edição contaremos com Conferência de Abertura, Grupos de Trabalho (modalidade virtual) e Conferência de Encerramento. Esperamos retomar o diálogo proposto nas edições anteriores do evento (1º SPSB2º SPSB e 3ºSPSB) que resultaram na publicação de livros oriundos das áreas temáticas presentes anteriormente (Coleção Pensamento Social Brasileiro-Volume 1 Volume 2 Volume 3 Volume 4), publicarmos novos livros oriundos desta edição do evento e que novas conexões possam ser criadas. Com esses sentimentos de alegria e reencontro, lhes desejamos boas-vindas!

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