Outdoors pela democracia: um estudo de resistência democrática popular durante o governo Bolsonaro

  • Autor
  • George Gomes Coutinho
  • Resumo
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    Este trabalho se propõe a discutir, em caráter preliminar, uma intervenção política e comunicativa na opinião pública, e no espaço público, insuficientemente analisada entre nós na Ciência Política brasileira: o uso de outdoors, ou painéis publicitários (Neves, 2020), na atual conjuntura da crise das democracias liberais. Nos propomos a analisar, a partir de elementos fornecidos por pesquisa sob nossa condução que se encontra em  seus primeiros estágios de coleta e organização de dados, o caso ocorrido na cidade de Campos dos Goytacazes, estado do Rio de Janeiro, no ano de 2020, onde tivemos a mobilização de um movimento de oposição ao Governo Bolsonaro (2019-2022) por parte de membros sem mandato e politicamente não institucionalizados da sociedade civil local. O movimento autointitulado Campos pela Democracia, doravante CPD, engendrou uma ação coletiva de autofinanciamento e disputou os outdoors na cidade apresentando mensagens em prol da defesa do Estado Democrático de Direito e contra as propagandas de desinformação propagadas pelo próprio staff do governo executivo federal à época.

    Ressaltamos que enquanto experiência nacionalmente delimitada, o governo executivo federal de feições autoritárias que vivenciamos, o governo Bolsonaro, pode ser classificado em parte como um governo-movimento (Couto, 2021). Dizemos em parte governo-movimento pelo fato do mesmo ter se mesclado em seu desenvolvimento com uma outra tendência  de funcionamento a partir de meados de 2020: um governo também fisiológico, que abraçou quadros e partidos da centro-direita fisiológica, junto a indivíduos das Forças Armadas. Couto (Op. Cit.) sintetizou este modus operandi batizando de governo militar-fisiológico.  Mas, é a característica de governo-movimento que mais nos interessa neste trabalho. Diferentes pastas foram ocupadas por cruzados ideológicos (Idem) empenhados em fomentar a guerra cultural que consiste na deflagração de conflitos públicos e tensionamento onde há a imposição e choques de visões morais (Hunter, 2022) sobre como deve ser orientada a sociedade. Estas ações se deram justamente mobilizando o mix semiótico de armas da desordem informacional via TIC`s (Tecnologias de Informação e Comunicação), mídia tradicional e atos públicos governamentais. Agentes representando o Estado brasileiro incorporaram o repertório de diferentes tipos de negacionismo e impetraram ataques a políticas sanitárias defendidas pela Organização Mundial da Saúde demonstrando hostilidade à ciência. Em paralelo tentaram reivindicar para si o papel de intérpretes do que é a democracia elegendo inimigos, vide a relação poder executivo e Supremo Tribunal Federal no período em tela. Replicaram aqui um pacote de ações simbólicas e políticas utilizado por movimentos da direita em diversos pontos do globo.

    Acreditamos que o funcionamento necessariamente performativo em governo-movimento, com seu repertório narrativo inflamável, é deflagrador relevante de ações da oposição não institucionalizada na sociedade civil por todo Brasil durante o governo Bolsonaro, algo que confirmamos em nossas primeiras idas ao campo. A atuação em prol do combate à Covid-19 defendendo medidas que passassem pelo crivo da ciência, baseada em evidências portanto, ou a defesa de princípios basilares da democracia representativa liberal, inclusive apresentando narrativas que contrariavam diretamente a atuação política e pública do governo-movimento, nos interessam em nossa pesquisa em Campos dos Goytacazes. Nossa proposta de estudarmos o movimento Campos pela Democracia no trabalho de implantação dos outdoors, nos permitirá, nesta dialética complexa do glocal, pensarmos como uma sociedade civil local lidou com uma versão nacional de um governo de direita radical. Em suma, deste recorte, entramos na discussão sobre as vias pelas quais agentes da sociedade civil, individualmente ou coletivamente, se engajam em processos de resistência democrática em conjunturas onde há governos ocupados pela direita radical contemporânea (Leeuw & Bourne, 2020; Sato & Arce, 2022).

    Na pesquisa depreendemos que a disputa local na opinião pública em Campos dos Goytacazes se deu primeiramente entre o que chamamos provisoriamente de sócios menores da direita radical, que reverberaram e referendaram tanto as ações públicas do presidente quanto o seu governo, e o CPD, movimento deflagrado na sociedade civil. Em termos discursivos os outdoors do CPD, que rivalizaram com outdoors financiados pela direita radical local, refletiram as tensões discursivas da conjuntura, explicitando tanto as falas do presidente na pandemia sobre tratamentos ineficazes, quanto os momentos em que Bolsonaro minimizou os riscos pandêmicos. Mas, junto a isso, questões acerca da liberdade de imprensa, princípios do Estado de Direito e outros tópicos relevantes, foram encontrados no material gráfico que recolhemos dos outdoors e em outras iniciativas do movimento.

     

  • Palavras-chave
  • : resistência democrática, crise da democracia, governo Bolsonaro, painéis publicitários, opinião pública
  • Área Temática
  • GT8 - Movimentos sociais, protestos e participação na democracia brasileira contemporânea: perspectivas teóricas e metodológicas
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