A trajetória intelectual de Octavio Ianni está profundamente vinculada ao debate acerca da formação social brasileira, sendo fortemente influenciada pelo marxismo e pela tradição crítica latino-americana. Graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), Ianni foi discípulo e colaborador de Florestan Fernandes, compondo a chamada "Escola Paulista de Sociologia", caracterizada por seu compromisso com uma abordagem estrutural da sociedade brasileira. Sua produção teórica orienta-se para a análise das contradições sociais do país, com especial atenção às temáticas da questão agrária, das desigualdades sociais e da condição de dependência econômica da América Latina. Em obras como Capitalismo e ruralismo (IANNI, 1976) e Origens agrárias do Estado Brasileiro (IANNI, 1984), o autor retoma elementos centrais da tradição crítica formulada por Caio Prado Júnior e Celso Furtado para analisar como a estrutura fundiária e a ruralidade no Brasil foram historicamente moldadas pelas dinâmicas do capitalismo dependente.
Para Ianni, a ruralidade não deve ser compreendida como um vestígio de estruturas pré-modernas, mas como componente funcional e ativo da lógica capitalista periférica. Dessa forma, o campo se configura como espaço privilegiado de reprodução das relações de exploração e concentração fundiária, sendo expressão concreta das formas históricas de exclusão social que caracterizaram o processo de modernização conservadora no Brasil.
Essa leitura dialética da realidade agrária brasileira articula-se com os debates clássicos da sociologia rural nacional, especialmente com os trabalhos de Alberto Passos Guimarães e José de Souza Martins. Guimarães (1963), em Quatro séculos de latifúndio, denuncia a permanência do latifúndio como traço estrutural da formação econômica brasileira, enraizado em um padrão colonial de produção voltado à exportação e sustentado pela superexploração do trabalho.
Martins (1975), por sua vez, em Capitalismo e tradição no Brasil rural, afirma que a modernização agrária não extinguiu as formas tradicionais de sociabilidade, mas as integrou seletivamente ao processo capitalista, gerando uma ruralidade ambígua, permeada por conflitos, resistências e exclusões.
Velho (1979), em Capitalismo autoritário e campesinato, argumenta que a incorporação da agricultura ao projeto desenvolvimentista durante os governos militares acentuou a marginalização dos pequenos produtores e das formas tradicionais de organização camponesa. O diálogo entre esses autores e Ianni reforça a compreensão da questão agrária brasileira como expressão de um processo histórico que articula dependência econômica, concentração fundiária e desigualdades estruturais.
Assim, a concepção de ruralidade proposta por Ianni permite apreender o Brasil não como uma sociedade em transição rumo à modernidade plena, mas como uma formação social periférica, na qual o moderno e o arcaico coexistem como formas complementares de dominação no interior do capitalismo dependente.
Nesse sentido, propõe-se como problema de pesquisa a seguinte indagação: Como a concepção de ruralidade em Octavio Ianni, articulada às contribuições de autores como Alberto Passos Guimarães, José de Souza Martins e Octavio Velho, permite compreender a persistência das desigualdades fundiárias no Brasil à luz da formação histórica e econômica do país?
O objetivo geral desta proposta consiste em analisar a concepção de ruralidade em Octavio Ianni e sua relação com as interpretações sociológicas e históricas da estrutura agrária brasileira, com vistas a compreender de que maneira essas formulações explicam a permanência das desigualdades fundiárias no contexto do capitalismo dependente. Como objetivo específico, busca-se examinar como os conceitos de modernização conservadora, capitalismo autoritário e tradição rural, presentes nas obras de Ianni (1976), Guimarães (1963), Martins (1975) e Velho (1979), contribuem para uma análise crítica da formação histórica da estrutura agrária brasileira e de seus impactos sociais contemporâneos.
O 4º Seminário de Pensamento Social Brasileiro: intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, será realizado entre os dias 2 e 6 de junho de 2025, no formato híbrido. A programação presencial será realizada nas dependências do CCHN-Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, enquanto a programação virtual será transmitida pelas páginas oficiais do evento no YouTube e pela DoityPlay. Nesta edição contaremos com Conferência de Abertura, Grupos de Trabalho (modalidade virtual) e Conferência de Encerramento. Esperamos retomar o diálogo proposto nas edições anteriores do evento (1º SPSB, 2º SPSB e 3ºSPSB) que resultaram na publicação de livros oriundos das áreas temáticas presentes anteriormente (Coleção Pensamento Social Brasileiro-Volume 1 Volume 2 Volume 3 Volume 4), publicarmos novos livros oriundos desta edição do evento e que novas conexões possam ser criadas. Com esses sentimentos de alegria e reencontro, lhes desejamos boas-vindas!