A Linha do Tempo da Moral: Conflitos sobre Família e Gênero no Legislativo

  • Autor
  • Luana Marques Carlos
  • Resumo
  • Esta pesquisa analisa a discussão sobre o conceito de família no Legislativo brasileiro. Por meio de uma análise documental do Estatuto da Família discutimos a abordagem feita ao mesmo por parte de parlamentares conservadores. 
    Abordamos processo histórico e discursivo que culminou na formulação do Estatuto da Família, destacando a mobilização conservadora em torno da defesa da família tradicional e a reação a propostas que buscavam reconhecer diferentes formas de organização familiar, especialmente aquelas que incluíam uniões homoafetivas. Há décadas, parlamentares conservadores demonstravam resistência a avanços nas pautas de gênero e sexualidade, entendendo políticas de diversidade como ameaças à ordem moral.  
     
    O conceito de "família" no Brasil é marcado por uma construção ideológica que remonta à ascensão da família nuclear burguesa, dominante desde a modernidade, e se entrelaça com a história da colonização e a estrutura patriarcal. O debate sobre a família tem se intensificou no cenário político, especialmente com a proposta do Estatuto da Família (PL 6.583/2013), que define a família como a união entre homem e mulher, excluindo outras formas de arranjo familiar, como uniões homoafetivas.  
    As discussões parlamentares revelam uma crescente sacralização do espaço legislativo e uma articulação conservadora que visa reverter avanços nas pautas de direitos humanos e reconhecimento das diversidades. A agenda conservadora de uma direita parlamentar ascendente tem sido central no Congresso, com destaque para a Frente Parlamentar Evangélica, que se consolidou após as Jornadas de Junho de 2013. 
    Analisamos o contexto político brasileiro entre 2011 e 2015, destacando a ruptura do consenso participativo e a ascensão de movimentos conservadores, com especial ênfase no papel das manifestações de 2013. A oposição ao governo Dilma Rousseff, até então dissociada da opinião pública, se reorganizou após esses protestos, em um cenário global de ascensão da direita populista. A atuação de Eduardo Cunha como presidente da Câmara e sua estratégia de obstrução ao governo contribuiu para a crise de governabilidade do PT, exacerbada pela crise econômica e escândalos de corrupção, como a Operação Lava Jato.  
    Esse momento de fragilidade política foi acompanhado pela crescente polarização e pelo desgaste das alianças no Congresso, incluindo a relação tensa entre o 
    PT e o PMDB. As manifestações de rua, inicialmente focadas em questões sociais e econômicas, foram apropriadas por diversas agendas, incluindo a conservadora, que reforçou temas como anticorrupção e moralidade. A crise política culminou em uma série de tentativas de reorganização da base aliada e na eleição de 2014, marcada pela fragmentação política e pelo crescente poder de grupos de direita conservadora. 
    Podemos observar a centralidade do debate em torno do Estatuto da Família em 2013 como marco simbólico da nova direita. A ascensão dessa força política se deu como reação aos avanços progressistas, especialmente nas pautas de gênero e sexualidade, sendo impulsionada por um contexto de crise de representatividade, descrença no Estado e ascensão de discursos moralizantes. Autores como Gentile, Holanda, Pierucci e Fraser ajudam a compreender essa configuração, que articula o conservadorismo não-elitista e o neoliberalismo pragmático no Brasil a partir da fusão de elementos autoritários e liberais.  
    No plano internacional, Fraser identifica o surgimento de dois blocos históricos — o neoliberalismo progressista e o reacionarismo populista — que, embora distintos, não rompem com os fundamentos do capitalismo. Entretanto, a especificidade brasileira é marcada pelo multipartidarismo e pela instabilidade de alianças, que tornam mais complexa a disputa entre esses blocos no campo político e social, sendo necessário produzir uma combinação entre as categorias citadas acima. Em termos analíticos, podemos categorizar que a direita conservadora no Brasil orbita entre conservadorismo não-elitistaneoliberalismo pragmático e reacionarismo populista, com especial critica ao neoliberalismo progressista.  
  • Palavras-chave
  • Legislativo; conservadorismo; bancada evangélica; nova direita; família.
  • Área Temática
  • GT1 - Brasil: encruzilhadas na defesa da democracia
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O 4º Seminário de Pensamento Social Brasileiro: intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, será realizado entre os dias 2 e 6 de junho de 2025, no formato híbrido. A programação presencial será realizada nas dependências do CCHN-Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, enquanto a programação virtual será transmitida pelas páginas oficiais do evento no YouTube e pela DoityPlay. Nesta edição contaremos com Conferência de Abertura, Grupos de Trabalho (modalidade virtual) e Conferência de Encerramento. Esperamos retomar o diálogo proposto nas edições anteriores do evento (1º SPSB2º SPSB e 3ºSPSB) que resultaram na publicação de livros oriundos das áreas temáticas presentes anteriormente (Coleção Pensamento Social Brasileiro-Volume 1 Volume 2 Volume 3 Volume 4), publicarmos novos livros oriundos desta edição do evento e que novas conexões possam ser criadas. Com esses sentimentos de alegria e reencontro, lhes desejamos boas-vindas!

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