A construção do pensamento social brasileiro ao longo do século XX foi atravessada por intensas disputas entre projetos epistêmicos, ideológicos e políticos. Entre os intelectuais que tensionaram essas estruturas, Alberto Guerreiro Ramos destaca-se por sua crítica contundente à hegemonia eurocêntrica das Ciências Sociais no Brasil, denunciando os limites da reprodução acrítica de saberes coloniais e apontando a urgência de uma reconfiguração teórico-metodológica comprometida com a realidade nacional. Neste artigo, tomamos como ponto de partida a crítica de Guerreiro Ramos para uma análise que não se pretende cronológica, mas sim aprofundada e imanente às camadas de sentido presentes em duas de suas obras centrais: Introdução Crítica à Sociologia Brasileira (1957) e A Redução Sociológica (1958). Entre esses marcos, o autor propõe uma inflexão decisiva em direção a uma sociologia brasileira enraizada e autônoma, articulada à vivência concreta do sujeito negro e orientada por uma crítica radical à importação irrefletida de modelos teóricos alheios à formação social brasileira. Guerreiro Ramos não se pauta apenas no racismo e na condição do negro, sua intervenção atinge os próprios fundamentos da ciência social dominante — aquilo que ele denominou “ciência enlatada” —, cuja aplicação acrítica no Brasil resultou em um saber desarticulado de sua função social e política. Em resposta, propõe um projeto alternativo de ciência social que seja simultaneamente crítica e engajada. A “redução sociológica”, uma de suas principais obras sociológicas, convoca a adaptação dos métodos e categorias sociológicas às especificidades do contexto brasileiro, recusando a "transplantação de ideias". Essa abordagem o posiciona à margem do cânone sociológico tradicional; a atualidade de sua crítica torna-se ainda mais evidente diante do persistente silêncio da academia brasileira frente à necessidade de autocrítica institucional. A resistência a questionamentos profundos sobre os fundamentos do fazer científico parece operar em favor da manutenção de estruturas de poder historicamente consolidadas. Essa dinâmica remete ao mito de Cronos — o deus que devorava os próprios filhos para preservar o poder — e nos inspira a recusar uma leitura linear ou meramente cronológica da obra de Guerreiro Ramos. Nosso interesse reside em compreender como, para além dos condicionamentos raciais e coloniais, atuam forças políticas e institucionais que circunscrevem o campo científico no Brasil.
O 4º Seminário de Pensamento Social Brasileiro: intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, será realizado entre os dias 2 e 6 de junho de 2025, no formato híbrido. A programação presencial será realizada nas dependências do CCHN-Centro de Ciências Humanas e Naturais da Universidade Federal do Espírito Santo, enquanto a programação virtual será transmitida pelas páginas oficiais do evento no YouTube e pela DoityPlay. Nesta edição contaremos com Conferência de Abertura, Grupos de Trabalho (modalidade virtual) e Conferência de Encerramento. Esperamos retomar o diálogo proposto nas edições anteriores do evento (1º SPSB, 2º SPSB e 3ºSPSB) que resultaram na publicação de livros oriundos das áreas temáticas presentes anteriormente (Coleção Pensamento Social Brasileiro-Volume 1 Volume 2 Volume 3 Volume 4), publicarmos novos livros oriundos desta edição do evento e que novas conexões possam ser criadas. Com esses sentimentos de alegria e reencontro, lhes desejamos boas-vindas!