DIVERSIDADE RACIAL E ESTRUTURA MIDIÁTICA: APONTAMENTOS SOBRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS

  • Autor
  • Ivonete da Silva Lopes
  • Resumo
  •  

    Pesquisas acadêmicas  sobre as características da estrutura do sistema midiático costumam ter como recorte  a concentração econômica, o vínculo entre política e a distribuição das concessões, e  a pouca produção de conteúdo regional (Cabral, 2015; Santos, 2004; Bolaño, 2004; Becerra, Mastrini, 2009). Raramente se faz menção à concentração racial da mídia, embora raça seja uma variável relevante para explicar a desigualdade na sociedade brasileira. Afinal, por que o país formado por 56% de negros (IBGE, 2019) possui uma  mídia hegemonicamente branca? 

        Uma  resposta a esse questionamento está na lógica  adotada pelo Estado para edificar o sistema de  comunicação, que no país não se atentou a  nenhuma dimensão da diversidade (racial ou de gênero).  “O acesso aos recursos foram mediados pelas relações interpessoais e pelo capital social, em um mercado restrito a determinados segmentos econômicos, políticos e religiosos (Silva, 2015)” . Os negros foram excluídos por terem menos recursos financeiros e capital social, situação agravada pela ausência de política para equilibrar o setor. Este fato no entanto não pode ser considerado como um mero equívoco,  a distribuição desigual de recursos , conforme enfatiza  Mills (1999, p.19, “não é acidental, mas prescrito em termos do contrato racial que requer  ações para manter a política branca”.

                O objetivo desse artigo é contribuir para  o debate ainda pouco feito no país  sobre como a estrutura do sistema midiático pode contribuir para se pensar as relações raciais no Brasil e as desigualdades resultantes do racismo. Para tanto, apresenta dados sobre a presença da diversidade racial na constituição dos sistemas midiáticos do Brasil e dos Estados Unidos. Adota como metodologia de pesquisa a análise documental  que envolve o relatório sobre propriedade midiática da Federal Communications Commission (FCC), normas para instituição de ações afirmativas na comunicação  dos Estados Unidos. No Brasil, baseia-se nos documentos resultantes das discussões para a implementação de diversidade racial na comunicação que esteve em pauta na 1ª Conferência Nacional da Comunicação,  realizada em 2009, e no Estatudo da Igualdade Racial (2010).

    Como  resultado, a pesquisa aponta  uma grande diferença em termos de presença da mídia negra nos dois países estudados. Os EUA, com 14%  de afro-americanos, possui 12 emissoras de TV, 100 rádios, e 400 jornais e revistas; enquanto a mídia negra no Brasil se restringe a 10 portais de notícias e uma revista, embora os negros representem  56% da população (IBGE). Os númeos levam a inferir que ação afirmativa adotada entre os anos 1970 e 1980  no setor contribuiu para maior presença de mídia negra  na sociedade estadunidense em relação à  brasileira, onde nunca houve nenhuma política para promover a pluralidade nesse campo. Os dois países, no entanto, estão distantes de manter a mesma proporcionalidade da realidade racial  na  propriedade midiática.

     REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

    BECERRA, M.; MASTRINI, G. Los dueños de la palabra: acceso, estructura y concentración de los medios em la América Latina del siglo XXI. Buenos Aires: Prometeo Libros, 2009.

     BOLAÑO, C. Mercado brasileiro de televisão. Aracaju, Educ, 2004

     CABRAL, E. D.T. A midía no Brasil: como se dá a concentração das comunicações e telecomunicações. Revista Eptic. V.17, n.3, 2015.

    CONFECOM. Caderno 1ª Conferência Nacional de Comunicação. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/informacao-e-comunicacao/eventos/comunicacao/1a-conferencia-nacional-de-comunicacao-confecom/confecomdocfinal.pdf Acesso em: 15 mai. 2019.

    FCC. Third report on ownership of commercial broadcast stations. FCC, 2017.

    IBGE. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil.Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101681_informativo.pdf. Acesso em: 12 dez. 2019.

    KERNER COMMISSION. The news media and the disorders. In: Report of the Nacional Advisory  Commission on  Civil Disorders. Disponível em: https://www.ncjrs.gov/pdffiles1/Digitization/8073NCJRS.pdf. Acesso em: 19 abr.2019.

    MILLS, C. W.The Racial Contract . New York: Cornell University Press: 1997.

    SANTOS; S.A.; MORENO, J.V.; BERTULIO, D.L.. O processo de aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, Lei n.º 12.288, de 20 de julho de 2010. Brasília: Inesc, 2011.

    SANTOS, S.. E-Sucupira: o Coronelismo Eletrônico como herança do Coronelismo nas comunicações brasileiras. E-Compós, v7. 2016. Disponível em: https://www.e-compos.org.br/e-compos/article/view/104. Acesso em: 10 jun. 2019.

    SILVA, S.M. Por uma visibilidade étnica: imprensa, jornalistas e identidades raciais – uma abordagem sobre a campanha nacional de autodeclaração étnico-racial. In: Anais I Congresso de Pesquisadores Negros do Sudeste: Os NEABs no cenário educacional contemporâneo: relações e intersecções identitárias. 06 a 08 de agosto de 2015, Nova Iguaçu, RJ.

     

     

     

  • Palavras-chave
  • Diversidade Racial, Estrutura Midiática, Racismo.
  • Área Temática
  • GT8 – Estudos Críticos sobre identidade, gênero e raça
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