JORNALISMO SEM PATRÃO? EXPERIÊNCIAS LOCAIS-REGIONAIS DE AUTOGESTÃO DO TRABALHO JORNALÍSTICO EM ALAGOAS

  • Autor
  • Sonia AGUIAR
  • Co-autores
  • Williany SOUZA
  • Resumo
  •  

    Desde os tempos da bem-sucedida experiência do Coojornal (até ser esmagada financeiramente pela ditadura militar), em Porto Alegre, poucos grupos de jornalistas se aventuraram a assumir, coletivamente, o controle do seu próprio trabalho para produzir um veículo informativo diferenciado da mídia hegemônica. Uma alegação recorrente era o custo de implantação e manutenção de um projeto contínuo, que não dependesse de formas de financiamento que pudessem entrar em conflito com a linha editorial. A expansão das plataformas digitais, porém, vem alterando esse cenário, possibilitando um número crescente de experiências que têm uma característica em comum além do ambiente da Internet: a predominância de projetos de origem local-regional, como o pioneiro Coojornal (GLORIA, 2018).

    Pouco estudado no Brasil, o jornalismo local-regional vem se reconfigurando por meio de iniciativas “fora-do-eixo”, como o Marco Zero, de Recife, ou “periféricas”, como a Agência Mural, tocada por uma rede de jovens jornalistas residentes e atuantes em comunidades da Região Metropolitana de São Paulo (a despeito da sua controversa origem em um blog incubado pela Folha de São Paulo). Em 2019, quatro novas experiências emergiram em Alagoas, após uma greve de jornalistas que paralisou por nove dias (em julho) as três emissoras de TV (e seus respectivos portais): TV Gazeta, afiliada da Rede Globo, pertencente à Organização Arnon de Melo (OAM), da família do ex-presidente Fernando Collor de Melo; a TV Pajuçara, afiliada da Rede Record, de propriedade do Pajuçara Sistema de Comunicação (PSCOM), sociedade paritária de dois políticos do PSDB, o usineiro e ex-senador João Tenório e o prefeito de Maceió (2012-2015; 2016-2020); e a TV Ponta Verde, afiliada do SBT, adquirida em 2014 pelo Sistema Opinião de Comunicação, o braço midiático do Grupo Hapvida, do Ceará, que se apresenta como o “maior plano de saúde do Norte e Nordeste do Brasil”.

    Apesar de o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Alagoas ter emitido decisão favorável ao dissídio coletivo da categoria, 35 jornalistas foram demitidos após a greve, segundo o Sindicato dos Jornalistas de Alagoas (Sindjornal), sendo 15 na TV Pajuçara e 20 nos veículos da OAM, incluindo o jornal Gazeta de Alagoas e a sucursal do grupo em Arapiraca, que foi fechada. Menos de três meses depois, um número maior de profissionais do que o de demitidos já estava trabalhando em três novos veículos por eles mesmos criados: o coletivo Acta – formado por egressos das emissoras de TV locais de Maceió, que produz reportagens diárias em vídeo veiculadas ao vivo no Youtube, Facebook e Instagram; a TV Liberdade AL - WebTV lançada em Arapiraca, na região central do estado, por um grupo de quatro jornalistas e quatro radialistas, que produz programas locais para as mesmas plataformas, mas possui uma parceria com o Acta, visando à troca de conteúdos entre capital e interior; e o site Mídia Caeté, apresentado como “cooperativa de comunicação” que objetiva praticar um “jornalismo independente e comunitário”.

    Os três veículos vieram se somar a outro empreendimento de jornalistas alagoanos, bem mais antigo, o Tribuna Independente, único jornal diário de Alagoas atualmente, de propriedade de uma cooperativa de jornalistas e gráficos (Jorgraf), fundada há 12 anos para arrematar um jornal falido que havia sido criado por PC Farias (Paulo César Siqueira Cavalcante Farias), chefe da campanha eleitoral de Fernando Collor à presidência (FIGUEIRÊDO, 2017). Impresso em Maceió, em formato standard, o Tribuna pode ser lido também online, por meio de uma plataforma digital gratuita.

    Todas essas iniciativas suscitam diferentes possibilidades de abordagens e interpretações enquanto fenômenos midiáticos e práticas jornalísticas, que ora pendem para uma visão integrada e justificadora dos processos capitalistas, com ênfase à idéia de empreendedorismo (ABREU, 2018); ora se atêm às disputas discursivas sobre a capacidade do jornalismo de se contrapor aos meios dominantes, seja sob o viés “alternativo”, “independente” ou “contra-hegemônico”. Este estudo, de caráter descritivo e exploratório, buscar ir além, tratando-as como “arranjos alternativos às corporações de mídia” (GROHMANN, ROXO e MARQUES, 2019), que além de trazerem o cooperativismo para o contexto das plataformas digitais (GROHMANN, 2018) implicam novos laços colaborativos e identitários no mundo do trabalho (GROHMANN, 2016) e desafios quanto às formas de financiamento dos veículos (CAGÉ, 2016; SILVA, 2018) e autogestão das rotinas produtivas do jornalismo, que possuem particularidades no contexto regional (AGUIAR, 2016).

  • Palavras-chave
  • cooperativas de jornalistas; autogestão jornalística; jornalismo local-regional; plataformas digitais; WebTV;
  • Área Temática
  • GT5 – Economia Política do Jornalismo
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A Ulepicc-Brasil (capítulo Brasil da União Latina de Economia Política da Informação, da Comunicação e da Cultura) realiza seu oitavo encontro excepcionalmente na modalidade virtual de 12 a 23 de outubro. O evento prioriza as atividades dos Grupos Temáticos, cada qual com uma mesa e cujas atividades ocorrem em horários diferentes. Os debates são sobre as transformações no sistema capitalista e seus impactos nos campos da informação, da comunicação e das mídias, da cultura e da produção cultural.

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  • Jornada de Graduandos

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