Na contemporaneidade, os dados utilizados por organizações originam-se em indivíduos
enquanto utilizadores das ferramentas digitais. Essa prática pode ser comparada ao extrativismo
dos recursos naturais quando observamos que é comum a afirmação de que os dados pessoais
são o novo petróleo (ECONOMIST, 2017; MARTINS, 2014). Por exemplo, a capa de uma
edição do The Economist (2017) proclama “O recurso mais valioso do mundo”, com ilustração
de plataformas de petróleo rotuladas com nome de algumas plataformas digitais perfurando um
oceano de dados.
Paradoxalmente, essas metáforas que equiparam a datificação da vida (MAYERSCHÖNBERGER & CUKIER, 2013) a outros processos extrativistas obscurecem ainda mais
essas relações de poder. Considerar os dados como petróleo significa que se trata de algo que
pode ser extraído naturalmente, pois existe no “solo” da vida social. Entretanto, como observa
Scholz (2018, p. 864), essa metáfora “contorna a avaliação de qualquer apropriação indébita ou
exploração que possa surgir do uso de dados”. Thatcher et al. (2016, p. 994) argumentam que
estas práticas extrativistas chegam a “[…] espelhar processos de acumulação primitiva ou
acumulação por espoliação que ocorrem à medida que o capitalismo coloniza tempos e lugares
privados anteriormente não mercantilizados”.
Nesse sentido, a datificação é entendida como um novo modo de colonialismo
(COULDRY & MEJIAS, 2019) que se apropria da vida humana para que os dados possam ser
continuamente extraídos em benefício do interesse de alguns atores (TERRANOVA, 2000). E,
sendo assim, a datificação torna-se um processo de abstração e extração de dados em vários
espaços, objetivando lucro, com geografia e política determinadas (THATCHER et al., 2016).
Ao processo que estabelece uma cadeia de valor a partir dos dados chama-se
colonialismo digital (YOUNG, 2019) ou colonialismo de dados (COULDRY & MEJIAS, 2019;
MUMFORD, 2021; THATCHER et al., 2016). Trata-se de “[…] uma nova ordem social,
baseada em rastreamento contínuo, que oferece novas oportunidades sem precedentes de
discriminação social e influência comportamental” (COULDRY & MEJIAS, 2019, p. 336). Tal
afirmativa é melhor compreendida através da história do colonialismo estabelecida a partir da
criação e/ou manutenção de relações econômicas, culturais e territoriais desiguais entre Estados
e impérios baseadas na dominação e na subordinação (SEGELL, 2019).
Frequentemente, as tecnologias são celebradas pela planicidade, transparência e potencial
para criar redes. Contudo, também camuflam as consequências desagradáveis do capitalismo
de dados na forma de assimetrias de informação, trabalho não remunerado, controle social
(WEST, 2019), vigilância constante, invasão de privacidade, relações desiguais, discriminação,
extração e exploração (THATCHER et al., 2016), além de mão de obra mal remunerada.
Este artigo tem como objetivo examinar os conceitos de colonialismo digital e
colonialismo de dados e contextualizar a contribuição que a Ciência da Informação (CI) pode
dar à questão. Para isso, foi realizada uma pesquisa exploratória, por meio de revisão não
sistemática de literatura. Conclui-se que a noção de colonialismo de dados e digital é
significativa, útil e digna de discussão crítica com o propósito de ampliar o debate no âmbito
da CI.
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