Este trabalho propõe um sobrevoo analítico sobre diferentes expressões de lutas de classes atualmente travadas no ambiente digital. Cientes das limitações de um texto curto, partimos da perspectiva marxista que inspira a teoria crítica da informação (BEZERRA, 2019) com a pretensão de abraçar a totalidade do processo histórico (LOSURDO, 2015, p. 63), configurando a teoria de lutas de classes como uma “teoria geral do conflito social”. Em Losurdo (2015, p. 64), esta teoria é apresentada mediante uma distinção em três “lutas de emancipação”, sendo uma de dimensão internacional, outra nacional e uma de cunho familiar, a saber: “a luta de classes que tem como protagonistas os povos em condições coloniais ou semicoloniais ou de origem colonial; a luta travada pela classe operária nas metrópoles capitalistas (na qual se concentra a reflexão de Marx e Engels); a luta das mulheres contra a ‘escravidão doméstica’”.
Na contemporaneidade, podemos analisar a colonialidade a que são submetidas ex-colônias no ambiente digital, como é o caso do Brasil, através do conceito de colonialismo de dados, que, segundo Sérgio Amadeu da Silveira (2021, p. 50), deve ser compreendido, principalmente, “como um processo de empobrecimento dos países periféricos diante das gigantescas plataformas de dados”. Para o pesquisador brasileiro, “a fusão do ordenamento neoliberal com as teias de colonialidade sustenta a posição de eterno dependente das tecnologias criadas na matriz” (SILVEIRA, 2021, p. 48), afirmação corroborada durante a pandemia de covid-19 pela dependência das plataformas digitais de empresas estrangeiras a que estiveram submetidos cientistas, pesquisadores, professores, estudantes, universidades, centros tecnológicos e institutos de pesquisa no Brasil – para ficarmos apenas no exemplo das áreas de ciência, tecnologia e ensino.
A luta travada pela classe operária, por sua vez, encontra-se esculpida nas carraras do infoproletariado, termo usado por Ricardo Antunes (2020) para caracterizar os trabalhadores e trabalhadoras de indústrias de software, telemarketing e call center e que hoje abarca, também, motoristas do Uber, entregadores da Amazon e do ifood e tantos outros “colaboradores” (para usar o termo preferido do grande capital, avesso a direitos trabalhistas) fagocitados pelo trabalho precarizado mediado por plataformas digitais.
Finalmente, a luta das mulheres por emancipação manifesta-se também, nos dias de hoje, no contexto da opressão algorítmica operada no ecossistema digital, uma vez que os algoritmos de organização e classificação da informação das gigantes de tecnologia são criados, na maioria das vezes, por programadores brancos do sexo masculino, baseados em dados que tendem a reforçar preconceitos e desigualdades sociais preexistentes. Como nos lembra a cientista da informação Safiya Noble (2021, p. 255), “a interface digital é uma realidade material estruturando um discurso, entranhado em relações históricas”.
Ao posicionar o conflito social no terreno da história, a teoria marxiana permite que enxerguemos as relações de coerção sob as quais se ergue o sistema capitalista, dando o insumo necessário à teoria crítica da informação para atualizar os diagnósticos dos conflitos sociais em suas manifestações contemporâneas.
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