O objetivo desta pesquisa é compreender como o consumo midiático por meio das plataformas de stream, em especial a Netflix, podem alterar a estrutura da atenção dos usuários. Tratamos aqui a atenção como uma faculdade humana artificial, desenvolvida através dos atos de compulsão à repetição. Para Türcke (2016), a atenção é um regime artificial, exclusivamente humano, que se originou do prolongamento anormal do “estímulo atencioso” no cérebro (TÜRCKE, 2016). Ou seja, nós não somos naturalmente atentos, mas aprendemos a ser.
As plataformas de stream surgiram na última década como uma forma emergente de entretenimento, nesta torrente surge a Netflix como um sistema “on-demand” para consumir programas (seriados, filmes, minisséries, desenhos animados etc.). Deste modo, o telespectador desenvolveu o controle de sua programação, sem ficar dependendo de calendários ou catálogos de emissoras. Essa nova forma de consumo ganhou popularidade e otimizou hábitos, como as culturas de maratona ou “binge-watch” – nestas o telespectador assiste durante várias horas a um programa ou seriado. Compreende-se como “maratonar” a ação de entrar no ambiente da
narrativa e engajar-se no conteúdo oferecido, hábito caracterizado pela perda do controle do tempo de consumo. As maratonas criam um ambiente que absorve completamente seus consumidores, caracterizada pela inserção dos telespectadores (SACCOMORI, 2016).
Tendo em vista a necessidade de estimular ao “binge-watch”, a Netflix introduziu ferramentas – como os cortes de aberturas e créditos, iniciar o “próximo episódio”, entre outras –, que proporcionam uma maior imersão nas experiências televisivas, buscando a atenção do telespectador. Também com esse objetivo, a plataforma desenvolveu a ferramenta de aceleração de vídeo, que permite a aceleração do conteúdo em até 50%, quebrando o ritmo da narrativa pretendido pelo diretor, forçando ainda mais o regime da atenção. Há quem defenda a ideia da aceleração, como o criador do site Efficiency is Everthing, Michel Kirk, que comemora: “mais piadas, mais risadas, mais drama, mais suspense – mesmo tempo”. Contudo, a ferramenta também pode levar ao estímulo excessivo da atenção. Em um cenário em que os cortes de imagem se tornaram mais frequentes – média de um corte a cada 4 segundos, enquanto em 1903 a média era de um corte a cada 30 segundos (HAH et al., 2008) –, a aceleração de vídeos pode
culminar em uma sobrecarga e, por expor o telespectador a estímulos ininterruptos, acabar por deteriorar a faculdade humana artificial da atenção (TÜRCKE, 2016, p. 33).
Neste cenário, como forma de “otimizar” o tempo dos usuários para consumirem mais programas em menos tempo, a Netflix conduz o telespectador para um suposto regime de atenção multitarefa, visto que, segundo Türcke (2016), “é impossível fazer duas ou mais coisas devotando 100% de sua atenção para elas”. Ainda segundo o filósofo, “pela atenção ser uma capacidade humana artificial, o exercício do multitarefa pode ser, até certo ponto, maléfico ao organismo (TÜRCKE, 2016, p. 64).
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