A tecnologia tem transformado as relações intersubjetivas, modificando, por conseguinte, as necessidades legislativas. A consequência disto é uma legislação que rapidamente se torna obsoleta, carente de efetividade, restando ao Judiciário a resolução de diversos conflitos a partir de categorias ambíguas como “proporcionalidade” e “razoabilidade”. Nesse contexto, surge a possibilidade de o Estado se utilizar de dados pessoais, especialmente de localização, fornecidos pelos usuários às empresas de tecnologia para apuração de ocorrência de ilícitos. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, XII, parte final, determina a inviolabilidade do sigilo de dados, exceto por ordem judicial, para fins de investigação criminal. A Lei n.º 9.296, de 24 de julho de 1996, ao regular tal inciso, informa que não se admitirá a quebra do sigilo quando não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal. Dessa forma, a legislação veda a quebra de sigilo quando não se pode identificar previamente as pessoas envolvidas em determinado crime. Todavia, não é isso o que se tem decidido nos casos em que a única informação que se tem é a do perímetro e do horário em que ocorrem os delitos. Por decisão judicial, tem se permitido a quebra do sigilo quanto a informações sobre as pessoas que estiveram neste local e horário delimitados, mesmo que não estejam elas envolvidas com o delito em investigação. Tal possível contradição entre a regra legal e as decisões judiciais gera o questionamento: a quebra de sigilo de dados pessoais, em processos penais nos quais não se tem a identificação dos suspeitos do ilícito, é compatível com a Constituição? O estudo é relevante considerando o contexto brasileiro, no qual discursos violentos de persecução penal estão cada vez mais presentes, o que gera preocupações em termos de segurança jurídica. As tecnologias de armazenamento de dados viabilizam mecanismos práticos para as violações à intimidade dos titulares destes dados, mecanismos não imaginados na construção de leis como a Lei de Interceptação Telefônica (Lei n. 9.296/1996). A pesquisa trabalhou com fontes diretas da área jurídica, analisando a normatividade de proteção à privacidade e aos dados pessoais no Brasil, com foco na Constituição Federal de 1988 e no Marco Civil da Internet, e indiretas, verificando as hipóteses que autorizam a quebra de sigilo de dados em sistemas de informática. Foi possível concluir que as decisões judiciais que permitem a quebra de sigilo de dados pessoais sem prévia identificação dos suspeitos do ilícito é incompatível com a Constituição de 1988, sendo imprescindível a justa causa para tal quebra, pautada na realidade tecnológica, sem ferir o direito à privacidade e à proteção de dados pessoais. Pode-se inferir ainda pela necessidade de adequação legislativa, seja alteração da Lei 9.296/1996 ou criação de uma lei específica, regulamentando as hipóteses de quebra de sigilo e quais os limites válidos.
Comissão Organizadora
Thaiseany de Freitas Rêgo
RUI SALES JUNIOR
Comissão Científica
RICARDO HENRIQUE DE LIMA LEITE
LUCIANA ANGELICA DA SILVA NUNES
FRANCISCO MARLON CARNEIRO FEIJO
Osvaldo Nogueira de Sousa Neto
Patrício de Alencar Silva
Reginaldo Gomes Nobre
Tania Luna Laura
Tamms Maria da Conceição Morais Campos
Trícia Caroline da Silva Santana Ramalho
Kátia Peres Gramacho
Daniela Faria Florencio
Rafael Oliveira Batista
walter martins rodrigues
Aline Lidiane Batista de Amorim
Lidianne Leal Rocha
Thaiseany de Freitas Rêgo
Ana Maria Bezerra Lucas