A produção algodoeira no Maranhão de meados do século XVIII e início do XIX é um eixo temático central no processo de sua formação socioeconômica. O Maranhão recebeu um grande número de escravos africanos que, juntamente com não poucos indígenas, trabalharam nas lavouras de algodão que eram mantidas por pessoas autorizadas pela coroa portuguesa. A safra era, principalmente, exportada para a Inglaterra, a pioneira da revolução industrial têxtil. Nesse contexto, eram realizadas trocas entre os senhores, grosso modo pobres e endividados pela compra de escravos a crédito, que correspondiam a uma pequena parcela da população maranhense e os fugitivos escravizados daquela época, valendo-se da fraquíssima condição senhorial de vigilância eficaz. Assim, nos termos da teoria do dom e contra-dom, de Marcel Mauss, era estabelecido uma espécie de acordo de trocas informais não monetarizadas entre eles, que consistiam na seguinte atividade: os escravos fugidos das lavouras de algodão não eram denunciados às autoridades da época (portugueses) pela fuga à medida em que produzissem e lhes fornecessem suprimentos alimentícios e de necessidades básicas como o arroz, o milho, o feijão, lenha. Quando era feita a denúncia havia o registro da mesma, e são exatamente estes registros que nos servem de fontes para a realização de uma pesquisa antropológica em arquivos realizada no Arquivo Público do Estado do Maranhão. Estes documentos nos dão pistas para compreender as condições de possibilidade da existência e da quebra daquela relação. Desenvolvo esta pesquisa na minha monografia e no projeto de mestrado, levando em conta conexões entre trabalho escravo em regiões tropicais e a economia inglesa, no contexto chamado por Dale Tomich de “segunda escravidão”, com base nos estudos de antropólogos como Sidney Mintz e Eric Wolf. Também utilizo Lygia Sigaud como intérprete e crítica do texto de Mauss, assim como Lévi-Strauss sobre o princípio de reciprocidade.