Padrões de comportamento referentes aos gêneros masculino e feminino são transmitidos há séculos como sendo verdades absolutas e imutáveis. Homens e mulheres são regidos a agir, se vestir e se comportar de modo diferente e conforme o que a sociedade dita como correta e, principalmente, no que defende como normal. Como contraponto crítico a esses padrões normativos, sobretudo relacionados à sexualidade, ao gênero e às normas sociais, começa a se delinear na década de 1980, a Teoria Queer, originada nos Estudos Culturais norte-americanos, e a expressão ganhou notoriedade ao ser utilizada pela pesquisadora Teresa de Lauretis, durante uma conferência em 1990. Mas foi através dos estudos da filósofa Judith Butler, com destaque à sua obra Problemas de Gênero (2003), que a teoria passou a ter um melhor embasamento acadêmico. Nesse momento, esses estudos começaram a contrastar com a denominação pejorativa da palavra queer e, ao nomear os estudos de sexualidade e gênero, passou a atender às demandas do movimento feminista e do movimento homossexual, repensando uma nova forma de realidade social, a partir da desconstrução dos padrões considerados aceitáveis no meio. Na obra Orlando (1978) da escritora britânica Virginia Woolf, a autora apresenta a personagem principal, Orlando, como um jovem nobre que, mesmo com comportamento condizente com o que era ser masculino na época em que vive, destaca-se ao mesmo tempo por ter um forte lado feminino, constituindo sua androginia. Quando ocorre sua transformação em mulher, a personagem se vê neste novo corpo sem perturbação, mas em relação ao mundo, passa a compreender a dificuldade que será viver em outro gênero. Essa perspectiva vai ao encontro da proposta da Teoria Queer que busca desconstruir regras sociais, lançando a discussão sobre modelos de comportamento. Este estudo parte do princípio de que a narrativa de Woolf e a caracterização da personagem Orlando reforçam que as particularidades dos sexos e gêneros são contextuais, e não inatas, antecipando em quase setenta anos a discussão da dissociação teórica de sexo e gênero, abordada por Judith Butler. Ao mesmo tempo, pretende-se salientar com este trabalho o quão importante é trazer à discussão tanto as questões referentes a sexo e gênero nos dias atuais, quanto da desconstrução dos padrões sociais descritos como aceitáveis para a sociedade.