No século XVIII, o prazer e a paixão deixam de ser demonizados e passam a ser considerados positivamente constituintes da vida humana. O espírito religioso já não é mais o que era antes: a aparência de uma fé fervorosa pode não passar de um recurso da polidez para uma sociedade extremamente hipócrita. O inferno não é o centro das preocupações. O objetivo agora é outro: a vontade de viver feliz na terra é mais importante do que a beatitude eterna, e encontramos em Gabrielle-Émilie Le Tonnelier de Breteuil, a Madame du Châtelet, uma autêntica defensora dessas ideias. Redigido por volta de 1746, Discurso sobre a felicidade, obra da marquesa du Châtelet, expõe minuciosamente uma série de formas para ser feliz. Para ela, é possível que homens e mulheres sejam felizes na vida terrena e não após a morte como defendia a religião. É preciso submeter nossas vontades e nossos desejos à razão, pois seria mais fácil ser feliz se entre os homens as reflexões e o plano de conduta precedessem suas ações. E melhor ainda é fazê-lo na juventude evitando que percebêssemos na maturidade e os melhores anos com as melhores condições de ser feliz nos escape pelas mãos. Entretanto, a forma de alcançar a felicidade é a mesma para homens e mulheres? Como as mulheres poderiam ser felizes uma vez que suas vidas eram marcadas pela diferenciação dos sexos, pelos papeis de gêneros, e qualquer inclinação contrária era considerada um atentado contra a “natureza feminina”? São essas as reflexões que analisaremos no presente trabalho.