O presente trabalho tem por objetivo investigar a forma como o poeta Ferreira Gullar representa a temática da relação entre natureza e sociedade em seu poema “O açúcar”. Tratando mais especificamente do alimento como locus desta relação, o poema apresenta esta ora como contraposição, ora como confluência, expondo as contradições sociais que a permeiam. Trata-se, pois, de uma análise crítica que visa relacionar aspectos externos - sociais, econômicos, ideológicos etc. - ao texto literário, porém, “evitando o ponto de vista mais usual, que se pode qualificar de paralelístico, pois consiste em mostrar, de um lado, os aspectos sociais e, de outro, a sua ocorrência nas obras, sem chegar ao conhecimento de uma efetiva interpenetração”, como afirma Antonio Candido (2006, p. 9). Assim, procuraremos demonstrar como os fatores externos assinalados se configuram na estrutura verbal do texto, explicando as soluções lexicais, sintáticas etc. escolhidas pelo poeta. Usaremos como referencial teórico autores como Terry Eagleton, “A ideia de cultura” (Edunesp, 2011) e Raymond Williams, “O campo e a cidade” (Cia da Letras, 1989). Partindo do açúcar não apenas como alimento, mas como artefato (ser) social, Gullar percorre os momentos da cadeia da produção - produção, circulação, troca e consumo - para desconstruir a imagem fetichizada do alimento como ele aparece na tradição literária brasileira; começando o poema com adjetivos como ‘branco’, ‘puro’ para falar do açúcar, ele desmascara, na última estrofe, a condição precarizada de quem de fato produz o açúcar nos canaviais ‘distantes’ e usinas ‘escuras’: o trabalhador, de vida ‘amarga’ e ‘dura’. Deste modo, Gullar faz crítica social ao mesmo tempo que critica as formas tradicionais de representação poética.
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Colóquio em Linguística e Literatura
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