Introdução: Segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia, as glomerulopatias constituem a terceira causa de doença renal crônica dentre aqueles que ingressam na terapia dialítica no Brasil, não obstante o jornal brasileiro de nefrologia publicou em 2014 uma análise epidemiológica e retrospectiva de 9.617 biópsias renais realizadas no Brasil, que apontou a glomerulopatia membranosa (GNM) como a segunda lesão glomerular primária mais prevalente, atingindo 20,7% da totalidade. As “GNM” são doenças que acometem os glomérulos e suas estruturas basais importantes como os podócitos, células epiteliais altamente diferenciadas na camada visceral da cápsula glomerular nos rins, responsáveis pela ultra-filtração do plasma. A glomerulopatia membranosa pode aparecer de forma primária por deposição subepitelial de anticorpos autoimunes ou secundária a diversas condições sistêmicas específicas, como o lúpus (LES), a hepatite viral e as neoplasias, ou mesmo após o uso de determinados medicamentos. A síndrome nefrótica é a apresentação clínica inicial em 60 a 70% dos casos, com proteinúria variando de 5 a 10g nas 24h. A hematúria microscópica está presente em 30% dos casos em adultos e 100% nos casos em crianças, a evolução é insidiosa e ocorre mais frequentemente em homens (60 a 70% dos casos). Por muito tempo as GNM primárias foram tratadas como idiopáticas porém atualmente estudos realizados em 2009 mostraram que a ligação das respostas autoimunes mediadas por IgG4 e ativação sistema complemento por C3 estariam ligadas as incitações exacerbadas inflamatórias e lesões de podócitos, célula esta formada por uma membrana glicoprotéica composta em grande quantidade de receptores de fosfolipase A2 do tipo M (PLAR2). A GNM é uma lesão basicamente da membrana glomerular (MBG), podendo evoluir para diferentes graus I, II, III e IV. Avanços dos conhecimentos moleculares na última década tem permitido a identificação dessas proteínas podocitárias que atuariam como alvos antigênicos nas GNMs mostrando um novo conceito autoimune da forma anteriormente denominada como “idiopática” e diferenciando a forma primária da secundária.
Objetivo: Discorrer sobre a glomerulopatia membranosa e sua diferenciação primária da secundária, caracterizando assim seus achados fisiopatológicos e a utilização do anti-PLA2R sérico para diagnóstico.
Métodos: Trata-se de uma revisão integrativa da literatura realizada na base de dados Scielo, LILACS via Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) por meio da combinação dos descritores, “Glomerulonefrite Membranosa”, “Nefrite de Heymann”, “Receptores de Fosfolipase A2”. Neste estudo, foram incluídos os artigos disponibilizados na íntegra, publicados em português e em inglês, com a temática relacionada a Glomerulopatia Membranosa. Foram encontrados 32 artigos dentre os quais foram selecionados 15 artigos para estudo de revisão, tendo como critério de inclusão o ano de 2014 a 2019.
Resultados e discussão: Os estudos dos mecanismos patogênicos da GNM tiveram inicio com bases experimentais animais descritos por Heymann há mais de cinco décadas. A Nefrite de Heymann foi um estudo realizado após injeção de extratos de rim em ratos que promoveu lesão podocitária e proteinúria semelhante à GNM em humanos, a partir daí introduziu o conceito de um complexo patogênico autoimune autólogo para a GNM. A destruição podocitária acarreta proteinúria, déficit da barreira glomerular e inicia a progressão para doença renal crônica (DRC), isso porque os podócitos são células altamente especializadas e têm um papel crucial na barreira de filtração glomerular sendo assim, alterações em moléculas de sua superfície podem demandar uma resposta imunológica com ligação de anticorpos, ativação de via complemento e dano celular. Um segundo antígeno foi descrito em 2009 por Beck et al.,8 o receptor de fosfolipase A2 do tipo M (PLA2R), uma proteína com 185 kDa, expressa no podócito humano. A ativação deste receptor induziria uma via patogênica com ativação de complemento e dano celular. Utilizando técnicas imunoenzimáticas (Western blotting), proteínas glomerulares humanas foram adicionadas a amostras de soro de indivíduos com GNM, idiopática e secundária, e outras glomerulopatias (Nefropatia por IgA, nefropatia diabética). Desta forma, foi possível identificar a reatividade específica contra uma proteína de 185 kDa em 70% das amostras com a forma primária. Posteriormente, estes alvos antigênicos tiveram seu epítopo identificado com a mesma sensibilidade para anticorpos direcionados contra o PLA2R (anti-PLA2R), com predomínio da subclasse 4 (IgG4) e participação da subclasse IgG3. Com as técnicas de imunohistoquímica, foi possível localizar a expressão deste antígeno no podócito. O PLA2R é um receptor de fosfolipase A2 (PLA2) expresso naturalmente na membrana celular do podócito participando da regulação de respostas biológicas da PLA2 que envolvem proliferação celular, adesão, produção de mediadores lipídicos e liberação de ácido aracdônico que é responsável pela iniciação da cascata inflamatória. A explicação da proteinúria não seletiva típica da GNM tem sido abordada em estudos recentes, onde a lesão podocitária ocorreria pela ativação local do sistema complemento, formando o complexo C5b-9. Este, por sua vez, estimula as células epiteliais e mesangiais a produzir proteases e oxidantes, responsáveis em última análise pela degradação da matriz da Membrana Basal Glomerular (MBG), levando à perda de tamanho da barreira. Nas formas secundárias, os imunodepósitos costumam ser provenientes do plasma como em casos de Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES), já na forma primária, são formados no próprio glomérulo, pelo surgimento de um auto-anticorpo contra um antígeno localizado entre a MBG e o epitélio visceral. Estas observações mostraram que a determinação de ambos os cenários, soro e tecido glomerular, poderiam estratificar diferentes estágios da patologia, onde no estagio I teríamos a fase inicial, com glomérulos normais pela microscopia óptica, porém na Imunofluorescência mostra depósitos difusos granulares de IgG e C3 em alças capilares e na microscopia eletrônica detecta- se depósitos eletrodensos entre MBG e os podócitos (espaço subepitelial). Essas lesões reagem aos imunocomplexos formando projeções de colágeno que tentam englobar o depósito. Essas projeções levam ao estagio II, que é formação das espiculas em “aspecto de pente”. No estagio III pode se ver os depósitos totalmente incorporados a MBG, a evolução para integração a membrana basal e reabsorção com aparecimento de halos claros e aumento considerável do espessamento da membrana confere o estagio IV. Nesse processo a formação do anticorpo anti-PLA2R é formado em 70% dos casos de GNM primária, deste modo, extraímos uma importante informação de que a ausência do anti-PLA2R circulante no momento da biópsia não excluiria o diagnóstico de GNM relacionada ao anti-PLA2R.
Considerações Finais: A diferenciação primária e secundária da Glomerulopatia Membranosa e o reconhecimento histopatológico com presença de espessamento difuso e heterogêneo da MBG juntamente com depósitos granulares de IgG e C3 e a presença desses anticorpos na biópsia renal, bem como a realização de estudos das doenças pode levar ao correto diagnóstico e tratamento. Diante das evidências tem-se que os níveis séricos de anti- PLA2R é um marcador potencialmente útil para previsão de diagnóstico e monitoramento de resposta ao tratamento da GNM, sua positividade é capaz de sugerir o diagnóstico e a análise evolutiva, ressaltando que a quantidade desse anticorpo no soro pode auxiliar no entendimento da atividade imunológica da doença. Em casos que os níveis de anti-PLA2R estão decrescendo, é possível que a doença esteja entrando em remissão. Por sua vez, pacientes que apresentem títulos altos ou crescentes no soro são fortes candidatos à terapêutica imunossupressora. Todavia estudos adicionais, prospectivos, com diferentes subclasses de imunglobulinas, que descrevam a participação do complemento, são necessários para aprofundarmos neste mecanismo de doença autoimune.
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