1.INTRODUÇÃO:
A Síndrome da imunodeficiência adquirida -AIDS- é uma doença infecciosa causada pelo vírus da imunodeficiência humana- HIV- em seu estágio mais avançado. O vírus ataca e destrói, principalmente, células TCD4+, que atuam liberando citocinas capacitando outras células de defesa; logo a suscetibilidade do organismo a infecções oportunistas tende a aumentar. A epidemia dessa patologia detectada em meados de 1981, evidenciou-se como um fenômeno global, instável, dinâmico, de rápida progressão e caráter, predominantemente, comportamental. (BRITO, 2001).
O aspecto fatídico evolutivo da doença, e consequente associação da AIDS com grupos específicos socialmente marginalizados, resulta em impactos emocionais, fisiológicos e psicossociais em seus portadores. Atualmente devido a evolução dos fármacos e da terapia antirretroviral, a AIDS assumiu um caráter crônico, aumentando a sobrevida e o tempo de exposição do paciente a fatores estressores abióticos. (SEIDL, RIBEIR, & GALINKIN, 2010).
É válido salientar que diante das demandas psicossociais, o tratamento do HIV exige condutas que ultrapassam a terapia medicamentosa, dentre as quais pode-se elencar o suporte espiritual, que nos últimos anos vem ganhando espaço no tratamento e reabilitação dos pacientes soropositivos. O presente trabalho visa explorar a vertente da espiritualidade como ferramenta terapêutica no enfrentamento das adversidades, estigmas e pressões sociais advindos da marginalização da AIDS que corrobora para o aumento dos transtornos psiquiátricos dos pacientes.
2.MÉTODOS
2.1 Critérios de elegibilidade:
Tipo de estudo: Artigos originais que demonstram relação entre pacientes com HIV ou com SIDA e espiritualidade no enfrentamento do vírus/doença.
Tipo de participantes: Foram considerados pacientes com HIV em qualquer idade.
Tipo de Intervenção: artigos originais que comprovam ou não a associação benéfica entre a espiritualidade e o tratamento do paciente com HIV
Resultados: Foram encontrados diversos artigos que relatam e ou comprovam que a espiritualidade traz grandes benefícios para o paciente com HIV, tanto no que se refere a adesão ao tratamento e qualidade de vida, quanto no que tange a diminuição da carga viral.
2.2 Fontes de informação: Artigos originais identificados pela busca em base de dados eletrônicas, como SCIELO, LILACS e MEDLINE; a partir de limites para a linguagem e data de publicação, e a última pesquisa foi realizada em 19 de outubro de 2019.
2.3 Pesquisa: Foram utilizados, nas línguas português, inglês e espanhol, para pesquisar no banco de dados do SCIELO, LILACS e MEDLINE, a associação dos seguintes termos de pesquisa: (HIV and Espiritualidade).
2.4 Seleção dos estudos: inicialmente, foram selecionados artigos de pesquisa com os seguintes critérios de inclusão: relatos de caso com no máximo 5 anos (2014-2019), textos nas línguas português, inglês e espanhol, e somente relatos de casos em humanos. Após a seleção dos artigos, 2 revisores utilizaram critérios de exclusão para retirar possíveis relatos de caso que não estivessem dentro do escopo do artigo de revisão. Para isso, os títulos de todos os trabalhos pré-selecionados foram lidos e deveriam fazer referência a paciente com HIV/AIDS e a espiritualidade. Em seguida, aplicou-se os mesmos critérios para avaliar a seção resumo dos artigos remanescentes.
2.5 Processo de coleta de dados: Desenvolvemos uma folha de extração de dados (baseada no modelo de extração de dados do Cochrane Consumers and Communication Review Group), que foi testada em dez estudos incluídos aleatoriamente e refinou-a de acordo. Um autor de revisão extraiu os dados de estudos incluídos e o segundo autor verificou os dados extraídos. Os desentendimentos foram resolvidos por discussão entre os dois autores da revisão; se nenhum acordo pudesse ser alcançado, foi planejado que um terceiro autor decidisse.
3.Resultados
Foram incluídos nesta revisão 29 artigos. As buscas nas bases de dados SCIELO, MEDLINE E LILACS, resultaram em um apurado total de 58 citações. Destes, após a análise dos títulos e resumos foram selecionados 37, destes 7 estudos foram descartados por não atenderem aos critérios de inclusão. Um artigo foi excluído pois o texto completo do artigo não estava disponível.
Os resultados da revisão apontam aspectos positivos, em sua grande maioria, entre a associação da espiritualidade com o tratamento e o enfrentamento da doença. De modo que dos 29 estudos avaliados: 11 estudos associam a espiritualidade a qualidade de vida e ao bem-estar do paciente portador de HIV (PVHIV); 4 estudos associam a espiritualidade tanto a qualidade de vida quanto ao enfrentamento da doença; 8 estudos referem-se a espiritualidade somente associada ao processo de enfrentamento da doença; 1 estudo associa a espiritualidade ao tratamento e ao enfrentamento da doença; 4 artigos citam a espiritualidade e seus benefícios para tratamento da doença; 1 artigo relaciona a espiritualidade ao tratamento e a qualidade de vida do paciente.
4 Discussão
Segundo Fletcher (2015), a carga viral e o declínio das células CD4 apresentam relação direta com o comportamento advindo das relações espirituais desenvolvidas pelo paciente. De modo que em seu estudo de ensaios semestrais demonstrou-se que o enfrentamento espiritual proporcionou a preservação sustentada de níveis indetectáveis da carga viral (CV) ao longo de quatro anos, independentemente dos dados sociodemográficos e do estado inicial da doença. Ademais, o estudo apontou que para cada participante com enfrentamento espiritual positivo que alcança CV indetectável, quatro com enfrentamento espiritual negativo acusavam HIV detectável/ transmissível. Notavelmente, o declínio das células CD4 foi 2,25 vezes mais rápido entre aqueles envolvidos em enfrentamento espiritual negativo em relação ao positivo. Em conclusão, as relações espirituais positivas estão associadas a comportamentos positivos de saúde, como a manutenção da supressão a longo prazo da CV e o menor início / recaída do transtorno do uso de substâncias ao longo do tempo.
Segundo Cody (2016), a espiritualidade influi diretamente na adesão ao tratamento e encoraja ao enfrentamento proativo da doença, ajudando a gerenciar estressores físicos, neurocognitivos e cotidianos. Pois após a análise que buscou potenciais influências neurocognitivas nos comportamentos proativos de enfrentamento em adultos com HIV, observou-se que a espiritualidade/religiosidade (p = 0,002), em vez do funcionamento neurocognitivo (Campo de visão útil, p = 0,277; Trilhas A, p = 0,701; Trilhas B, p = 0,3365; Escala de memória Wechsler- III Digit Span, p = 0,864), foi um preditor significativo de enfrentamento proativo. Desse modo, constatou-se que Intervenções para atender às necessidades de espiritualidade/religiosidade de adultos com HIV podem possivelmente facilitar comportamentos proativos de enfrentamento e melhorar o humor, ambos importantes para o funcionamento neurocognitivo saudável. Além disso, também segundo Lyon (2016), quanto maior a espiritualidade, maiores são os níveis de bem-estar emocional e melhor é êxito no enfrentamento e tratamento do HIV/AIDS.
Contudo, a espiritualidade também pode representar problemas para o tratamento, de acordo com Kremer (2014), a espiritualidade pode ser fonte enfrentamento negativo, quando por exemplo o HIV é visto pelo paciente como pecado, e ou castigo por um pecado. E por este motivo o estudo destaca dentro desta temática a importância do reconhecimento e da intervenção, por parte dos profissionais da saúde, em casos nos quais a espiritualidade está criando sofrimento e ou barreiras ao tratamento. Portanto, deve-se adicionar uma forma de avaliação espiritual eficaz a fim de evitar que a espiritualidade seja terreno para a auto exclusão e evasão da terapia antirretroviral, e potencializar os aspectos espirituais que são fonte de conforto, bem-estar, e proatividade relacionadas ao enfrentamento da doença.
Visto tanto, a espiritualidade não deve ser desprezada no tratamento dos PVHIV, e segundo Brum (2017), os profissionais da saúde devem acatar a espiritualidade como um agente que pode instigar a aceitação a medicação e ao tratamento, devendo-se elaborar uma profunda relação entre o cuidado clínico e o cuidado espiritual, a fim de trazer para a realidade de seus pacientes os benefícios previamente citados.
5 Conclusão
A partir desta revisão sistemática observou-se que dentre os artigos encontrados uma maior predominância de constatações benéficas acerca da associação da espiritualidade e o tratamento do HIV. Desse modo pode-se salientar que a espiritualidade é um campo amplo e promissor no que tange o tratamento do HIV, pois consegue apresentar resultados positivos em aspectos diversos da vida do paciente, trazendo benefícios que se estendem desde a sua qualidade de vida, concedendo a este um maior bem estar individual e social, tratamento, propiciando uma maior adesão do paciente e dando-lhe aporte emocional para enfrentar as mazelas físicas e psíquicas que esta lhe traz, até a redução da carga viral e retardo no declínio das células CD4, secundária a adoção de comportamentos positivos com elação ao tratamento e a diminuição/abolição do uso de drogas.
Corrobora-se então que é de suma importância que os estudos sobre a espiritualidade associada a condição soropositiva sejam encorajados e continuem a evoluir, e que a dimensão espiritual possua maior visibilidade dentro do tratamento dos PVHIV.
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