Nós, duas mulheres negras, hoje como discentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro(UFRJ), interrogamos a partir de nossas pesquisas e estudos feitos no grupo Conversas entre Professores: Alteridades e Singularidades - ConPAS, a atuação e responsabilidades exigidas à mulher negra e pobre na sociedade. Trazemos falas polifônicas, mas que como em uma orquestra composta por instrumentos diferentes, apresentam uma melodia harmoniosa. Falas oriundas de espaçostempos diferentes, desinvisibilizando questões de raça, gênero e condição social. Assumimos como perspectiva epistemológica-política-metodológica os estudos do campo do cotidiano (Certeau,1994; Alves, 2008) e a pesquisa narrativa (Reis, 2014; 2023). A narrativa de Ana Sarah busca desnudar o lugar do cuidado, enquanto uma condição perpetrada no imaginário que recai sobre os corpos, identidades e subjetividades das mulheres negras na sociedade brasileira. Instigada por Cida Bento (2022), a autora (com)partilha suas memórias com a avó se encarregando dos cuidados domésticos para que as outras mulheres da família pudessem trabalhar e estudar. São memórias olfativas permeadas de vestígios de amor (hooks, 2021) das quais ela se alimenta para ocupar o lugar acadêmico. Também é uma forma de denunciar a perpetuação de uma condição colonial, subjugada e subalternizada destes corpos na sociedade: afinal, de quantas mulheres se faz uma senzala que mantenha o funcionamento da casa grande? De quantas senzalas se faz o Brasil? A narrativa de Jalmiris, traz a “narrativavida” de Dona Antônia (61 anos), mulher negra, estudante da classe de alfabetização da Educação de Jovens e Adultos (EJA), no turno noturno, em uma escola pública periférica de Belo Horizonte. Ela compõe o imenso contingente de pessoas excluídas de um ambiente formal de aprendizagem, além de reforçar a concepção de que mulheres não devem/precisam estudar. D. Antônia, como analfabeta, carregava o estigma de inferioridade, ao assinar com o polegar (Galvão; Di Pierro, 2013). Ela aprendeu, ainda criança, a cozinhar, lavar, limpar, cuidar de outras crianças. Aos 11 anos, foi matriculada em uma escola, mas continuou a trabalhar como doméstica, o que a sobrecarregou, impedindo-a de prosseguir com os estudos. Foram muitas evasões e novas matrículas. A cada retorno, a menina se identificava menos com o espaço escolar, pois a concepção de que “trabalhar é melhor que estudar” permanecia. Aos 17 anos se casou. Aos 60 anos, já com filhos e netos, viu renascer o desejo de retornar à escola e aprender a ler e escrever, uma prática de liberdade, um direito constitucionalmente estabelecido para todo cidadão. Precisou da permissão do “homem lá de casa” (assim se referia ao marido). Foram muitas condições impostas e sobrecarga de reclamações quanto a qualidade da comida e o cuidado da casa para seu retorno à escola. A partir destas “narraativasvida” externamos formas de dominação de gênero e raça naturalizadas, agudizadas pela condição social, expressas em exigências inquestionáveis do cuidar, amamentar e realizar todo o trabalho doméstico de forma exclusiva pela mulher negra e pobre. Uma tripla discriminação, mediante o imaginário desqualificador da sociedade preconceituosa que vivemos.
Coordenação geral:
Allan Rodrigues – UNESA/ UFRJ
Comissão organizadora:
Aline Dornelles – FURG
Francisco Ramallo – UNMdP
Luís Paulo Borges – CAp-UERJ
Tiago Ribeiro – CAp- INES
Rafael Honorato – UEPB
Rafael Marques – UFAC
Rossana Godoy Lenz – ULS
Diego Carlos -UFF
Guilherme Stribel – UNESA
Adrianne Ogêda Guedes – UNIRIO
Comitê Científico
André Régis – UFRJ
Ana Patrícia da Silva – CAp-UERJ
Adrianne Ogêda Guedes UNIRIO
Adriana Maria de Assumpção – UNESA
Adriano Vargas – UFF
Alexandra Garcia – UERJ
Aline Dornelles – FURG
Aline Gomes da Silva – INES
Bárbara Araújo Machado – UERJ
Celso Sánchez – UNIRIO
Cristiano Santanna – SEEDUC
Clarissa Quintanilha – UERJ
Denise Najmanovich – CONICET
Felipe da Silva Ponte de Carvalho – UNESA
Francisco Ramallo – UNMdP; CONICET
Gabriel Roizaman – CIIE Avellaneda
Graça Reis – UFRJ
Guilherme Stribel – UNESA/SME-Teresópolis
Inês Barbosa de Oliveira – UNESA
Viviane Castro Camozzato – UERGS
Mônica Knöpker – IFSC
Júlio Valle – USP
Gustavo Taveira – SME/RJ
Jane Rios – UNEB
Instituições nacionais e internacionais com representantes na organização:
Universidade Estácio de Sá – Proponente
Anped – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
(Gt de Currículo – Ge de Cotidianos)
Instituto Nacional de Educação de Surdos
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Universidade Estadual da Paraíba
Universidade Federal do Acre
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Universidade Federal do Rio Grande
Universidad Nacional de Mar del Plata
Universidad de La Serena