A QUESTÃO FEDERATIVA E A ARTICULAÇÃO REGIONAL ENTRE MUNICÍPIOS: o Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná
Resumo: Discute-se acerca da questão federativa e da articulação regional entre municípios tendo como norte a Lei 11.107/2005 que trata dos consórcios públicos. Orientado pela abordagem qualitativa, optou pela análise documental, a fim de discutir o desenho institucional e objetivos do Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná, que criou em 2011 a figura do Secretário Regional de Educação com o objetivo de implementar conjuntamente com as prefeituras políticas educacionais integradas, visando à melhoria da qualidade educacional dos municípios consorciados. Como resultados, evidenciou-se que o desenho institucional traz grandes novidades ao campo do federalismo educacional ao criar uma rede de implementação de políticas públicas coordenadas por uma instância intermunicipal, o que exige que entes federados autônomos abram mão de certo grau de autonomia em nome da ação articulada.
Palavras-chave: Federalismo; Regime de Colaboração; Consórcios Públicos.
INTRODUÇÃO
Com a redemocratização, o cenário político convergiu “para a rejeição da estrutura centralista e autoritária do regime militar” o que levou a Assembleia Nacional Constituinte a afirmar na Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988) “a opção por uma estrutura de Estado mais descentralizada e aproximada do sentido de federalismo” (LIZIEIRO, 2016, p. 133).
Dentre as inovações estabelecidas pela Constituição, três têm relevância para as políticas educacionais: “a descentralização percebida como democratização, gerando forte tendência ao municipalismo” (CASTIONI, 2013, p 162); a proposição de políticas nacionais norteadoras da ação governamental que conferem à União um papel central na coordenação federativa; e a proposição do Regime de Colaboração, “ideia perfeita para lidar com a necessidade de conjugação entre autonomia e interdependência dos entes federativos mas que, na prática, tem sido pouco eficaz” (ABRUCIO, 2012, 17).
Tendo em vista as fragilidades de coordenação e articulação federativa evidenciadas, ganham relevo as reflexões de Abrucio (2012), que apontou os desafios do federalismo educacional, sinalizando para a construção de um regime de colaboração, pautado pela: i. institucionalização de fóruns de negociação federativa; ii. indução do papel coordenador do nível estadual e o incentivo ao papel associativo no nível municipal; iii. repensar o papel do governo federal como centro de gravidade na articulação de um sistema nacional.
Dentre os desafios apontados, grande destaque tem sido dado ao papel indutor e coordenador da União, vista por muitos como pedra angular para a criação de um sistema educacional que ataque as desigualdades e respeite a diversidade (CURY, 2010), negligenciando analiticamente o papel exercido pelos fóruns de negociação federativa e o associativismo entre os entes federados, em especial no nível municipal.
Partindo do pressuposto de que o mero estabelecimento de “regras nacionais homogêneas não significam necessariamente resultados igualitários” (ARRETCHE, 2012, p. 181), entendemos que os ingredientes trazidos pela Lei nº 11.107/2005 (BRASIL, 2005), se constituem num poderoso elemento de articulação e coordenação federativa, ao propor a criação de “autarquia intermunicipal com vistas a enfrentar problemas que são comuns a um conjunto de municípios brasileiros e afeitos a áreas como saúde, meio ambiente, educação” (CASTIONI, 2013, p 161).
A Lei 11.107/2005 considerou como Consórcios Públicos as pessoas jurídicas formadas exclusivamente por entes federados, a fim de estabelecer relações de cooperação, podendo se constituir como pessoa jurídica de direito público (associação pública) ou pessoa jurídica de direito privado (associação civil), trazendo as seguintes inovações: a) o consórcio público foi reconhecido como instrumento de cooperação horizontal e vertical; b) introduzido o instituto do convênio de cooperação entre entes federados; c) exigência de que os consórcios públicos sejam disciplinados por lei entre os entes que cooperam; d) introduzido o conceito de gestão associada de serviços públicos; d) reconhecida a possibilidade de transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens.
A Lei dos Consórcios introduziu a possibilidade da cooperação horizontal, formada entre municípios, ou a cooperação vertical, em que necessariamente devam estar a União, os Estados e os Municípios, respeitando sempre o princípio da subsidiariedade, pelo qual “a União somente participará de consórcios públicos em que também façam parte todos os Estados em cujos territórios estejam situados os Municípios consorciados” (BRASIL, 2005), induzindo o papel coordenador do nível estadual.
Nos últimos anos surgiram iniciativas de consorciamento entre entes federados, notadamente na área de saúde que detém expertise na implementação de políticas regionalizadas e algumas ações na educação, como o Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento da Chapada Diamantina (BA), e mais recentemente o Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná (CODINORP), tema do presente estudo, que teve como objetivo discutir o desenho institucional da área educacional do Codinorp e os objetivos pactuados entre os municípios.
1 Método e procedimentos de pesquisa.
Esse estudo, pautado pela abordagem qualitativa, optou pela Análise Documental, recorrendo a leis, decretos e demais documentos públicos a fim de discutir o desenho institucional e os objetivos da área educacional do Codinorp.
2 Análise e discussão.
2.1 O codinorp e a Secretaria Regional de Educação.
O Codinorp é um consórcio público de personalidade jurídica de direito público e natureza autárquica, formado por nove municípios da região Norte do Paraná. Criado em 2014 para formular e implementar políticas de infraestrutura e desenvolvimento urbano regional, teve seu escopo ampliado a fim de atender a interesses comuns dos municípios consorciados.
Em 2017, instituiu de forma inédita um Secretário Regional da Secretaria Regional de Educação (SRE), instância interna do Consórcio, escolhido em uma seleção nacional, e que tem a missão de implementar “conjuntamente com as prefeituras políticas integradas para aprimorar a gestão e alcançar as metas de aprendizagem e atendimento da educação municipal dos consorciados” (CODINORP, 2017), elencados na Tabela 1:
Tabela 1: Matrículas das Redes Municipais do Codinorp e IDEB
Município
Matrículas – Censo Escolar 2016
Creche
Pré-escola
Fundamental 1
Total
IDEB 2015
Cafeara
79
33
177
289
5,1
Centenário do Sul
55
78
641
774
4,9
Florestópolis
179
319
522
1.020
5,5
Guaraci
106
111
366
583
6,0
Jaguapitã
149
373
738
1.260
6,2
Lupionópolis
130
41
152
323
4,6
Mirasselva
81
67
131
279
5,3
Porecatu
147
247
464
858
6,5
Prado Ferreira
97
92
265
454
5,6
Total
1.023
1.361
3.456
5.840
Média 5,5
Fonte: Codinorp.
Com o intuito de implementar políticas integradas em uma realidade educacional díspar se levarmos em conta o IDEB/2015 dos consorciados, que varia entre 4,9 a 6,5, confirmando as desigualdades educacionais entre os municípios, principal marca do federalismo educacional brasileiro (ABRUCIO, 2012), o Codinorp tem como objetivos:
Figura 1: Objetivos do Codinorp
Fonte: Codinorp (2017).
Para garantir a consecução de seus objetivos, o Codinorp propôs um desenho inédito para a Secretaria Regional de Educação, instância interna do consórcio, detalhado no item 5.2.
2.2 Desenho institucional e objetivos da Secretaria Regional de Educação
A literatura tem apontado que “o sucesso das formas de consorciamento intergovernamental dependem de um modelo institucional bem gerido, capaz de ser inovador na forma e no conteúdo das políticas” (ABRUCIO, 2012, p. 17) e nesse sentido há que se analisar o desenho institucional proposto pelo Codinorp para a SRE, instância inédita no nosso desenho federativo:
Figura 2: Desenho institucional
Fonte: Codinorp (2017).
A partir do desenho institucional, é possível perceber a proposição de uma nova dinâmica federativa para a gestão de políticas educacionais, tendo em vista que os municípios que gozam de autonomia, constituíram uma rede de implementação de políticas que segue a seguinte dinâmica:
Secretaria Regional de Educação (SRE): Liderada pelo Secretário Regional de Educação que responde diretamente ao Presidente do Codinorp e interage com:
?Demais prefeitos do consórcio: responsáveis por apoiar e validar as políticas propostas, acompanhar os resultados e definir diretrizes.
Gestores Municipais de Ensino: responsáveis pelo acompanhamento e execução de iniciativas educacionais nas escolas de seus municípios.
Equipes das Secretarias Municipais: trabalharão junto com o SRE para garantir a implementação e execução de políticas integradas.
Diante do desenho, algumas considerações se fazem necessárias acerca da experiência do Codinorp. Primeiro, há que se observar que o caso em tela não se constitui em um Sistema Único de Educação nos moldes preconizados por Abicalil e Neto (2010), quando discutiram a proposta do Sistema Único de Educação de Mato Grosso, tendo em vista que os municípios manterão seus sistemas de ensino, embora coordenados por uma instância intermunicipal. Também há que se considerar que esse desenho inovador, ou seja, uma instância regional de educação que coordena um grupo de municípios autônomos faz com que os municípios ao buscarem uma atuação integrada, tenha que abrir mão de certo grau de autonomia. Por fim, uma última consideração a ser levada em conta e que pode vir a influenciar na manutenção a longo prazo do consórcio e na construção de políticas de longo prazo, se encontra nas descontinuidades comuns vivenciadas nos municípios brasileiros ocasionadas por questões de mudança nas gestões municipais e na alternância entre partidos no poder.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o advento da Lei 11.107/2005, os consórcios públicos passaram a se constituir como uma possibilidade de articulação e coordenação federativa com vistas à redução das desigualdades educacionais e o respeito à diversidade. No caso em tela observa-se que o modelo proposto traz grandes inovações ao federalismo, tendo em vista a criação de uma instância intermunicipal com vistas a coordenar a formulação/implementação de políticas educacionais integradas.
No decorrer do estudo percebemos lacunas analíticas acerca de experiências da temática, surgindo a necessidade de ampliar as análises sobre a temática, em especial sobre ganhos de escala alcançados pelo consorciamento que podem aumentar a eficácia bem como as relações entre consórcios e o setor não-estatal.
4 REFERÊNCIAS
ABICALIL, Carlos; NETO, Odorico F. Cardoso. Federalismo cooperativo e educação brasileira: a experiência de Mato Grosso [com a] proposição de um sistema único de educação. In: OLIVEIRA, Romualdo Portela de; SANTANA, Wagner (Org.). Educação e federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a diversidade. Brasília: UNESCO, pp. 39-70, 2010.
ABRUCIO, Fernando Luiz. Associativismo territorial para a coordenação intergovernamental. In: ABRUCIO, Fernando Luiz; RAMOS, Mozart Neves (Org.). Regime de Colaboração e associativismo territorial. São Paulo: Fundação Santillana, 2012.
ARRETCHE, Marta. Democracia, federalismo e centralização no Brasil. Rio de Janeiro: Editora FGV: 2012.
BRASIL. Congresso Nacional. Constituição [de 1988] da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União: Brasília, 1988.
______. Lei Federal nº 11.107/2005. Dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos e dá outras providências. DOU: Brasília, 2005.
CASTIONI, Remi. A questão federativa e a dimensão coletiva na gestão municipal da educação – consórcios e a articulação regional entre municípios. In: Diálogos sobre a gestão municipal: passo a passo do Plano Municipal de Educação. São Paulo: Fundação Itaú Social, 2014.
CODINORP. Estatuto Social do Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná. Prado Ferreira, 2017.
______. A Aliança Regional Pela Educação. Disponível em: www.aliancapelaeducação.org.br. Acesso em: 01 ago. 2018.
CURY, Carlos Roberto Jamil. “A questão federativa e a educação escolar.” In: OLIVEIRA, Romualdo Portela de; SANTANA, Wagner (orgs.). Educação e federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a diversidade. Brasília: UNESCO, pp. 148-168, 2010.
LIZIEIRO. Leonan Baesso da Silva. Por um Estado Federal assimétrico. Revista Insigth Inteligência. Volume 78, jul.-set., p 132-148, 2017.
A 3ª edição do Seminário “Federalismo e Políticas Educacionais” é uma realização do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais em parceria com o Grupo Espaços Deliberativos e Governança Pública do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Gegop-Clacso), a seção estadual da Associação Brasileira de Política e Administração da Educação (Anpae-ES) e o Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo, contando com o apoio da rede Clacso.
Com o objetivo de debater os 30 anos da Constituição brasileira e os desafios para a afirmação do Estado democrático de direito, do federalismo cooperativo e da educação como direito social de cidadania. A partir do tema “Para onde vai a Democracia? O Brasil após 30 anos da Constituição de 1988” o evento se propõe a congregar pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, professores da educação básica e superior, estudantes, gestores e outros interessados para um balanço do Estado democrático de direito e para uma análise de conjuntura das políticas públicas, em geral, e das políticas educacionais, especificamente, no cenário de incertezas diante da crise política, institucional e econômica atual nas mesas, conferências, palestras e apresentações de trabalho.
Assim o evento realizou uma chamada pública e ampliada para pesquisadores das mais diferentes áreas submeterem suas produções à avaliação da Comissão Científica que avaliou os trabalhos em sua relevância e aproximação ao escopo do evento e à qualidade teórica, instrumental, argumentativa e discursiva para as Comunicações orais que se realizarão.
Desse modo os anais ora apresentados compõe importante sistematização das obras que serão discutidas e compartilhadas no evento.
Sejam bem-vindos/as ao nosso evento!
Sejam bem-vindos/as à Vitória!
Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais
ORIENTAÇÕES PARA APRESENTAÇÃO DA COMUNICAÇÃO ORAL:
1 - Elabore a apresentação da Comunicação oral, contendo os mesmos itens do resumo expandido (título, autores, introdução/problematização, metodologia, resultados e referências).
2 - Você deverá confeccionar até oito slides para a apresentação oral, utilizando o modelo disponibilizado: (Template Slides.ppt - anexo)
3 - As apresentações ocorrerão no dia 01/11, entre 14:00 e 18:00, conforme atribuição de salas por eixo temático.
4 - O tempo de apresentação é de no máximo 15min e estarão disponíveis notebook e projetor multimídia para arquivos em formato .pdf.
Caroline Falco Fernandes Valpassos | COORDENAÇÃO COMISSÃO CIENTÍFICA (ANPAE-ES) |
Andressa Mafezoni Caetano | PPGMPE / UFES |
Dulcinea Campos Silva | PPGMPE / UFES |
Eduardo Augusto Moscon de Oliveira | LAGEBES |
Elimar Leal | ANFOPE-ES |
Flávia Costa Lima Dubberstein | SEME - CARIACICA |
Itamar Mendes da Silva | PPGMPE / UFES |
Lara Carlette | UEPG |
Larissa Ferreira Rodrigues | PPGMPE / UFES |
Luana Almeida | UNIVAS |
Marcelo Lima | PPGE / UFES |
Michele Pazolini | IFES |
Rodrigo Ferreira Rodrigues | ANPAE-ES |
Sandra Kretli da Silva | PPGMPE / UFES |
Simone Cassini | PMSM |
Simone Smiderle | PPGE / UFES |
Suzany Goulart | CE - UFES / ANFOPE |
Tatiana das Merces | PPGE / UFES |
Tatiana Peterle | PPGE / UFES |
Vitor Gomes | PPGMPE / UFES |
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