O que fazem os estados brasileiros em matéria de política educacional?
Resumo: Trata-se de pesquisa bibliográfica, que envidou esforços para o levantamento e a revisão da literatura que examinou o papel dos estados no âmbito do sistema federativo brasileiro, especialmente no que se refere à provisão de políticas públicas. Os achados da pesquisa foram divididos em duas partes: (i) as contribuições da Economia; Administração Pública e Ciência Política; e, como consequência deste primeiro levantamento, (ii) a literatura que examinou exclusivamente a relação entre os estados e as políticas educacionais. O resultado fundamenta a formação de agenda de pesquisa sobre os estados na provisão de políticas educacionais no Brasil.
Palavras-chave: Federação; organização da educação; estados.
Introdução
Este trabalho tem dois objetivos: i) o levantamento e a sistematização da literatura que examinou o papel dos estados no sistema federativo brasileiro; ii) o levantamento e a sistematização de literatura que examinou o papel dos estados em relação às políticas educacionais. A análise sobre o papel dos estados está dispersa a partir de um conjunto de perguntas: qual é o papel dos governadores dos estados no federalismo brasileiro (ABRUCIO, 1998)? Os executivos estaduais desempenham um papel de coordenação estadual, vis a vis à coordenação federativa (SEGATTO, 2015)? Os estados conseguiram elaborar estratégias de desenvolvimento regional (MONTEIRO NETO, 2014)? Existe uma fragilização dos estados na federação brasileira (REZENDE, 2013; ARRETCHE; SCHLEGEL, 2014)? Tais perguntas possuem panorama comum: o que fazem os estados em relação às políticas públicas?
Metodologia
Para o levantamento da literatura sobre o papel dos estados, foram acionadas tanto as ferramentas de busca comuns, quanto as ferramentas específicas, como os portais CAPES, IBICT e SciELO. A análise flutuante (BARDIN, 2011) da bibliografia apontou para um baixo volume de produções acadêmicas. Assim, foram consideradas todas as fontes disponíveis, como teses, dissertações, papers, anais de congressos, livros, artigos científicos. As áreas do conhecimento em relação ao assunto: i) a Economia apresentou significativa produção sobre o papel dos estados, uma ramificação do “federalismo fiscal” (PRADO, 2013; MONTEIRO NETO, 2014); ii) a Administração Pública apresentou relevante contribuição, como o papel dos governadores no sistema federativo brasileiro; o papel das burocracias estaduais na provisão de políticas públicas (ABRUCIO, 2005; ABRUCIO; FILIPPIM, 2010; SEGATTO, 2015); iii) a Ciência Política que, embora tenha apresentado contribuições importantes, estas foram pontuais e irregulares (ABRUCIO, 1998; SANTOS, 2001; TOMIO; RICCI; 2012; ARRETCHE; SCHLEGEL, 2014). A literatura foi dividida em dois grupos: i) os estados a partir da dimensão econômico-fiscal; ii) os estados a partir da dimensão político-institucional (MONTEIRO NETO, 2014).
Resultados
Na dimensão econômico-fiscal, a federação brasileira se reorganizou a partir de 1994, ano do Plano Real. Antes do Plano, os estados possuíam seus bancos, que rendiam dividendos para os cofres públicos, por meio do processo inflacionário. O êxito do Plano exigiu um ajustamento dos gastos estaduais para conter o processo inflacionário e estabilizar a economia. A União assumiu as dívidas dos estados e exigiu um conjunto de reformas, como a privatização dos bancos e empresas estatais. Leis federais redesenharam os investimentos em políticas públicas, tanto nos estados quanto nos municípios, culminando na Lei de Responsabilidade Fiscal. A partir de 1995, houve uma concentração dos tributos no Executivo Federal, como a CPMF; PIS; Cofins; CSLL. A literatura referente à dimensão econômico-fiscal apontou para um protagonismo da União e dos municípios no sistema federativo brasileiro, a partir de 1994 (PRADO, 2013; MONTEIRO NETO, 2014; VERGOLINO, 2014).
Na dimensão político-institucional, o fim da Ditadura Militar (1964-1985) possibilitou novo ciclo de fortalecimento dos estados. Este “federalismo estadualista” caracterizou-se pelo poder de veto dos governadores, que detinham grande influência nas bancadas estaduais do Congresso Nacional, nos governos Sarney (1985-1990); Collor (1990-1992); Itamar Franco (1992-1994) (ABRUCIO, 1998). A partir de 1995, houve uma reorganização da federação brasileira, em que os municípios foram os maiores responsáveis pela provisão de políticas públicas: transporte urbano, saúde básica, limpeza urbana, educação infantil, ensino fundamental, e segurança pública, como o surgimento das guardas municipais. Assim, o protagonismo dos estados não se sustentou após o período de 1985-1994. Ambas as dimensões apontaram para um protagonismo da União e dos municípios, e um possível esvaziamento do papel dos estados na federação brasileira (ABRUCIO; 2005; PRADO, 2013; MONTEIRO NETO, 2014, ARRETCHE; SCHLEGEL, 2014).
Embora a análise das políticas educacionais considere o sistema federativo (ARAÚJO, 2005; OLIVEIRA; SANTANA, 2010; CAVALCANTI, 2016), permanece lacunar o exame do papel dos estados neste contexto. Gomes (2009) examinou o FUNDEF – política pública formulada pela União – por meio da agenda de implementação construída pelos estados. Diversos estados estavam interessados na municipalização do ensino fundamental, e foram indutores desse processo em seus territórios. O crescimento nacional das matrículas, pelas redes municipais, está relacionado tanto à indução federal quanto à agenda de implementação do FUNDEF pelos estados. Nos estados de maior crescimento da oferta pelas redes municipais – Espírito Santo; Pará; São Paulo; Bahia; Ceará – já estava em curso uma agenda de municipalização do ensino fundamental. Nos estados de menor crescimento da oferta, pelas redes municipais – Paraná; Rio de Janeiro; Rio Grande do Sul – não havia uma agenda de municipalização, nem antes, e nem após o FUNDEF. Malini (2009) também examinou o papel dos estados durante a formulação e implementação do PDE. Ao propor um modelo de regime de colaboração, o desenho inicial do PDE estabeleceu municípios prioritários e desconsiderou o papel dos estados, seja na formulação do plano, seja na implementação deste nos municípios selecionados. O PDE foi reformulado para incluir os estados, e isso beneficiou o próprio MEC, diante da capacidade das secretarias estaduais na disseminação dos instrumentos de gestão do plano, em especial a elaboração do PAR.
Segatto (2015) examinou o regime de colaboração, por meio do conceito de cooperação, ou seja, como estados e municípios constroem – ou não – relações de cooperação que subsidiam as políticas educacionais. O grau de cooperação foi examinado em seis estados: Acre, Ceará, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará e São Paulo. O Ceará e o Mato Grosso do Sul estabeleceram o maior grau de cooperação com os seus municípios, como a construção de arenas institucionais em comum para formular e implementar políticas no território. O Acre e Minas Gerais apresentaram graus de cooperação intermediários, ou seja, não construíram arenas institucionais, mas desenvolveram programas conjuntos, em que prestam assessoria técnica e disponibilizam infraestrutura para seus municípios. Os estados de São Paulo e o Pará apresentaram os graus mais baixos de cooperação, estabeleceram canais mínimos de interlocução com os seus municípios.
Os trabalhos de Gomes (2009), Malini (2009) e Segatto (2015) reúnem evidências que fundamentam a importância de observar a capacidade dos estados na disseminação – ou não – das políticas em seus territórios. Nos achados de pesquisa: embora o Ceará tenha municipalizado o ensino fundamental, isso não significou um esvaziamento do seu papel em relação às redes de ensino municipais, pois construiu arenas de formulação e implementação de políticas públicas, o que o aproximou de um papel de coordenação estadual, semelhante à noção de coordenação federativa (SEGATTO, 2015). Os achados de pesquisa sobre São Paulo e o Pará parecem fundamentar a hipótese de esvaziamento dos estados, em relação ao regime de colaboração com os seus municípios. O Pará e São Paulo apresentaram as maiores taxas de municipalização do ensino fundamental – 2º e 3º lugares – respectivamente. Ambos os estados cooperam minimamente com os municípios para a formulação e implementação de políticas (SEGATTO; ABRUCIO, 2016). Ambos os estados apresentaram situações econômico-fiscais opostas na federação, uma vez que São Paulo apresenta grande capacidade econômico-fiscal, o que significa autonomia de recursos em relação ao aporte da União. Do lado oposto está o Pará, que apresenta baixa capacidade econômico-fiscal, o que significa grande dependência do aporte de recursos da União (VERGOLINO, 2014).
A disseminação e a implementação das políticas educacionais acontece de maneira heterogênea nos estados, cujos fatores estão relacionados às dimensões econômico-fiscal e político-institucional. Diante das grandes desigualdades, a formulação de políticas pela União não atende os estados homogeneamente. A federação brasileira está em condições assimétricas: existe um grande protagonismo da União na formulação das políticas, e um grande protagonismo dos municípios na implementação das políticas. Aos estados resta o espectro de um papel indefinido e nebuloso, sobretudo na formulação das políticas (PRADO, 2013; MONTEIRO NETO, 2014; ARRETCHE; SCHLEGEL; 2014; SEGATTO, 2015).
Referências
ABRUCIO, F.L. Os barões da federação: os governadores e a redemocratização brasileira. São Paulo: Hucitec, 1998.
ABRUCIO, F.L. Reforma do Estado no federalismo brasileiro: a situação das administrações públicas estaduais. RAP, vol. 39, n.º 2, mar-abri. 2005, pp. 401-419.
ABRUCIO, F.L.; FILIPPIM, E.S. Quando descentralizar é concentrar poder: o papel do Governo Estadual na Experiência Catarinense. RAC, v. 14, n. 2, art. 2, pp. 212-228, mar./abr. Curitiba, 2010.
ARAÚJO, G.C. Município, Federação e Educação: história das instituições e das ideias políticas no Brasil. 2005. 333 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2005.
ARRETCHE, M.; SCHLEGEL, R. Os estados nas federações: tendências gerais e o caso brasileiro. BID-IDB-DP-334, fev. 2014.
BARDIN, L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Ed. 70, 2011. 279p.
CAVALCANTI, C.R. Tensões federativas no financiamento da Educação Básica: equidade, qualidade e coordenação federativa na assistência técnica e financeira da União. 2016. 337 f. Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2016.
GOMES, S. Políticas nacionais e implementação subnacional: uma revisão da descentralização pós-Fundef. Dados, RJ, vol. 52, n. 3, 2009, p. 659-690.
MALINI, E. O consenso como ponto de partida? Uma análise dos papeis desempenhados pelos atores participantes na formulação do Plano de Desenvolvimento da Educação. 2009. 206 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora.
MONTEIRO NETO, A. (org). Governos estaduais no federalismo brasileiro: capacidades e limitações governativas em debate. Brasília: Ipea, 2014, 326 p.
OLIVEIRA, R.P.; SANTANA, W. Educação e Federalismo no Brasil: combater as desigualdades, garantir a diversidade. Brasília: UNESCO, 2010.
PRADO, S. A “federação inconclusa”: o papel dos governos estaduais na federação brasileira. In: REZENDE, F. (org). O federalismo brasileiro em seu labirinto: crise e necessidade de reformas. São Paulo: FGV, 2013, p. 120-197.
SEGATTO, C.I. O papel dos governos estaduais nas políticas municipais de Educação: uma análise dos modelos de cooperação intergovernamental. 2015. 196 f. Tese (Doutorado em Administração Pública e Governo) – Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2015.
SEGATTO, C.I.; ABRUCIO, F.L. A cooperação em uma federação heterogênea: o regime de colaboração na educação em seis estados brasileiros. RBE, v. 21, nº 65, abri-jun, 2016, p. 411-429.
TOMIO, F.R.L.; RICCI, P. O governo estadual na experiência política brasileira: os desempenhos legislativos das Assembleias Estaduais. Revista de Sociologia e Política. Curitiba: nº 41, v. 21, fev. 2012, p. 193-217.
VERGOLINO, J.R.O. Federalismo e autonomia fiscal dos governos estaduais no Brasil: notas sobre o período recente (1990-2010). In: MONTEIRO NETO, A. (org). Governos estaduais no federalismo brasileiro: capacidades e limitações governativas em debate. Brasília: Ipea, 2014, p. 63-117.
REZENDE, F. (org). O federalismo brasileiro em seu labirinto: crise e necessidade de reformas. São Paulo: FGV Editora, 2013, p. 13-65.
SANTOS, F. (org). O poder legislativo nos estados: diversidade e convergência. RJ: FGV, 2001, 308p.
A 3ª edição do Seminário “Federalismo e Políticas Educacionais” é uma realização do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais em parceria com o Grupo Espaços Deliberativos e Governança Pública do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Gegop-Clacso), a seção estadual da Associação Brasileira de Política e Administração da Educação (Anpae-ES) e o Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo, contando com o apoio da rede Clacso.
Com o objetivo de debater os 30 anos da Constituição brasileira e os desafios para a afirmação do Estado democrático de direito, do federalismo cooperativo e da educação como direito social de cidadania. A partir do tema “Para onde vai a Democracia? O Brasil após 30 anos da Constituição de 1988” o evento se propõe a congregar pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, professores da educação básica e superior, estudantes, gestores e outros interessados para um balanço do Estado democrático de direito e para uma análise de conjuntura das políticas públicas, em geral, e das políticas educacionais, especificamente, no cenário de incertezas diante da crise política, institucional e econômica atual nas mesas, conferências, palestras e apresentações de trabalho.
Assim o evento realizou uma chamada pública e ampliada para pesquisadores das mais diferentes áreas submeterem suas produções à avaliação da Comissão Científica que avaliou os trabalhos em sua relevância e aproximação ao escopo do evento e à qualidade teórica, instrumental, argumentativa e discursiva para as Comunicações orais que se realizarão.
Desse modo os anais ora apresentados compõe importante sistematização das obras que serão discutidas e compartilhadas no evento.
Sejam bem-vindos/as ao nosso evento!
Sejam bem-vindos/as à Vitória!
Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais
ORIENTAÇÕES PARA APRESENTAÇÃO DA COMUNICAÇÃO ORAL:
1 - Elabore a apresentação da Comunicação oral, contendo os mesmos itens do resumo expandido (título, autores, introdução/problematização, metodologia, resultados e referências).
2 - Você deverá confeccionar até oito slides para a apresentação oral, utilizando o modelo disponibilizado: (Template Slides.ppt - anexo)
3 - As apresentações ocorrerão no dia 01/11, entre 14:00 e 18:00, conforme atribuição de salas por eixo temático.
4 - O tempo de apresentação é de no máximo 15min e estarão disponíveis notebook e projetor multimídia para arquivos em formato .pdf.
Caroline Falco Fernandes Valpassos | COORDENAÇÃO COMISSÃO CIENTÍFICA (ANPAE-ES) |
Andressa Mafezoni Caetano | PPGMPE / UFES |
Dulcinea Campos Silva | PPGMPE / UFES |
Eduardo Augusto Moscon de Oliveira | LAGEBES |
Elimar Leal | ANFOPE-ES |
Flávia Costa Lima Dubberstein | SEME - CARIACICA |
Itamar Mendes da Silva | PPGMPE / UFES |
Lara Carlette | UEPG |
Larissa Ferreira Rodrigues | PPGMPE / UFES |
Luana Almeida | UNIVAS |
Marcelo Lima | PPGE / UFES |
Michele Pazolini | IFES |
Rodrigo Ferreira Rodrigues | ANPAE-ES |
Sandra Kretli da Silva | PPGMPE / UFES |
Simone Cassini | PMSM |
Simone Smiderle | PPGE / UFES |
Suzany Goulart | CE - UFES / ANFOPE |
Tatiana das Merces | PPGE / UFES |
Tatiana Peterle | PPGE / UFES |
Vitor Gomes | PPGMPE / UFES |
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Telefone (027) 4009-7777