Considerando os 30 anos da aprovação da nossa Constituição Federal, é mister salientar a importância da sua análise prática. Sua redação, previu a estruturação de um conjunto de direitos sociais, políticos e civis a todos os cidadãos. Nela ficou consagrado, no dizer de Saviani, “várias aspirações e conquistas decorrentes da mobilização da comunidade educacional e dos movimentos sociais organizados” (...) desde o zero ano de idade, a gratuidade do ensino público em todos os níveis” e o “acesso ao ensino obrigatório” como direito público subjetivo (SAVIANI et al 2006, p. 46). Assim no que se refere ao arcabouço jurídico, a partir de 1988, ficou consagrando como o primeiro dos direitos fundamentais sociais (SCAFF; PINTO, 2016). Essa declaração implica considerar o que significa a expressão “direitos fundamentais”, que, apesar da não exclusividade do conceito, pode ser compreendida como “direitos do homem consagrados pelo Estado nacional em suas cartas constitucionais que tem como nota distintiva sua fundamentalidade, ou seja, sua indispensabilidade para o ser humano” (SCAFF; PINTO, 2016, p. 437).
Para Cury (2014), ao ser incluído no Título II - Capítulo II da CF “Dos direitos e das Garantias Fundamentais”, o direito à educação pode ser caracterizado como um elemento constituinte da cidadania. Nesse sentido, Scaff; Pinto (2016) salientam que a inserção do direito à educação como um direito fundamental estabelece ao Estado um comportamento essencialmente ativo para sua efetivação.
Além disso, a educação teve sua principal afirmação quando declarada aos cidadãos como direito público subjetivo, assegurado na CF de 1988: “o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” (Art. 208, § 1º). Isso significa “o poder de ação que a pessoa possui de proteger ou defender um bem considerado inalienável e ao mesmo tempo legalmente reconhecido” (HORTA, 1998, p. 8), podendo a pessoa exigir o seu cumprimento da parte responsável.
Para Duarte (2004, p. 113), o direito público subjetivo:
Trata-se de uma capacidade reconhecida ao indivíduo em decorrência de sua posição especial como membro da comunidade, que se materializa no poder de colocar em movimento normas jurídicas no interesse individual. Em outras palavras, o direito público subjetivo confere ao indivíduo a possibilidade de transformar a norma geral e abstrata contida num determinado ordenamento jurídico em algo que possua como próprio. A maneira de fazê-lo é acionando as normas jurídicas (direito objetivo) e transformando-as em seu direito (direito subjetivo).
Sendo assim, o direito à educação pode ser definido como um direito de todos os cidadãos, de acesso gratuito em todos os seus níveis e obrigatório, sendo dever da família em matricular seus filhos e dever do Estado em ofertar o ensino obrigatório (HORTA, 1998), que abrange a faixa etária de 04 aos 17 anos na legislação atual. Segundo Duarte (2004, p. 113) o direito público subjetivo “configura-se como um instrumento jurídico de controle da atuação do poder estatal, pois permite ao seu titular constranger judicialmente o Estado a executar o que deve”.
A educação enquanto um direito público subjetivo, pressupõe, então a sua garantia a qualquer tempo, possuindo caráter individual e coletivo, um direito fundamental que deve abranger a todos. Nessa perspectiva, Scaff; Pinto (2016, p. 438) salientam que
A afirmação do direito à educação como um direito fundamental de natureza social tem uma consequência importantíssima, visto que, por intermédio dela, reconhece-se que, embora o direito à educação possa ser efetivado e exigido judicialmente de maneira individual, sua concretização ocorrerá por meio da realização de políticas públicas.
Nesse sentido, principalmente a partir da década de 1990, começaram a estruturar políticas visando garantir esse direito. Neste mesmo ano, foi criado o Estatuto da Criança e do Adolescente para lhes assegurar proteção e reafirmar o seu direito à educação. Somando a isso, a Lei nº 9.394/96 – LDB definiu a educação básica como direito universal e declarou que a educação básica passaria a ser composta das etapas: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Em 1997, foi criado o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, que em 2007, foi substituído pelo Fundo de Manutenção e desenvolvimento da Educação Básica – FUNDEB, que trouxe uma proposta significante para a educação, uma vez que o financiamento abrangeria não só o ensino fundamental, mas toda a educação básica.
Em que pese à legislação educacional, o direito à educação e seu caráter público subjetivo garantem sua afirmação incontestável. No entanto, como afirmam Scaff; Pinto (2016) o direito fundamental social à educação não se refere apenas ao direito fundamental do indivíduo estar matriculado em uma instituição de ensino ou mesmo ao direito da coletividade a uma política pública que se restrinja à dimensão do acesso à educação (p. 438). Complementam as autoras:
[...] a Constituição Federal de 1988 em nenhum momento limitou a abrangência do direito fundamental à educação ao seu acesso, como é comumente entendido por estudiosos da temática e por juízes e tribunais. Sabe-se que o mero acesso à vaga em uma instituição de ensino não é suficiente para garantir em plenitude a dignidade do ser humano, bem como o desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho [...]. É essencial que se garanta, entre outros aspectos, a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, a valorização dos profissionais da educação escolar e a garantia de padrão de qualidade [...] compreendidos como integrantes da própria ideia de fundamentalidade do direito à educação (SCAFF; PINTO, 2016, p. 438 – grifos nossos).
Destarte, para além do acesso à educação, outras questões devem ser consideradas para que a plenitude do direito à educação seja alcançada. Entre elas, a qualidade educacional deve ser ponderada. Não obstante, a própria CF/88 no Art. 206, inciso VII, determina que o direito à educação compreende, não só a garantia do acesso e da permanência, mas também a garantia de padrão de qualidade como um dos princípios segundo o qual estruturará o ensino (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2005).
Para Dourado; Oliveira (2009), no Brasil, a efetivação de uma escola de qualidade se apresenta como um complexo e grande desafio. Esse desafio, dadas as desigualdades socioeconômicas regionais do país, se apresenta latente, necessitando ser cada vez mais problematizado por todos os atores educacionais.
Desse modo, inferimos que, para além do direito ao acesso, há de se considerar a garantia da qualidade educacional, de forma que, aquele que demandar a educação possua condições de acesso, permanência e consiga concluir a educação básica de forma qualitativa. No entanto, essa garantia sofre diversos embates no país diante de uma prática política neoliberal.
Nesse ensaio abordamos o direito à educação em seu caráter público subjetivo, bem como a importância de considerar não só o acesso, mas a qualidade da educação, indispensável para a plena execução do direito à educação. Não obstante, apesar das determinações legais serem incontestáveis, os avanços das políticas nas últimas décadas não indicam o pleno cumprimento do disposto na nossa Constituição Federal.
Assim, a prescrição legal acerca do direito subjetivo à educação com qualidade ainda carece de efetividade, possuindo inúmeras incompletudes e desfuncionalidades na oferta e funcionamento da educação escolar nos seus diversos níveis e modalidades. A não regulamentação do regime de colaboração das competências dos entes federados que inviabiliza a consolidação de um Sistema Nacional de Educação está na base não só da não garantia do direito, como também explica alguns aspectos de recentes retrocessos na sua oferta pública.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 19 ago. 2018.
______. Emenda Constitucional nº 59, de 11 de novembro de 2009.
BRASIL. LDB- Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. 7ª edição. Atualizada em 25/10/2012. Edições Câmara Brasília: 2012. Disponível em <<http://www.riogrande.rs.gov.br/smed/wp-content/uploads/2013/04/ldb_7ed.pdf>>. Acesso em 01 ago. 18.
______. Lei Federal nº 13.005, de 25 de Junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União: Brasília, 26 de junho de 2014. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13005.htm.Acesso em 10 ago. 2018.
CURY, Carlos Roberto Jamil. A qualidade da educação brasileira como um direito. Educação e Sociedade. Campinas, v. 35, nº 129. p. 1053-1066, out-dez 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v35n129/0101-7330-es-35-129-01053.pdf>. Acesso em: 05 Fev. 2018.
DOURADO, Luiz Fernandes. OLIVEIRA, João Ferreira de. A qualidade da educação: perspectivas e desafios. Cad. Cedes, Campinas, v. 29, nº 78, p. 201-215, mai/ago 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-32622009000200004>. Acesso em: 05 fev. 2018.
DUARTE, Clarisse. Seixas. Direito público subjetivo e políticas educacionais. São Paulo: Fundação SEADE, v. 18, n.2, p. 113-118, jun. 2004. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/spp/v18n2/a12v18n2.pdf>. Acesso em: 29 jan. 2018.
HORTA, Jose Silverio Baía. Direito à educação e obrigatoriedade escolar. Caderno de pesquisa nº 104. P. 5-34, Jul. 1998. Disponível em: http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/cp/arquivos/158.pdf. Acesso em 10 ago. 2018.
OLIVEIRA; Romualdo Portela de; ARAÚJO, Gilda Cardoso de. Qualidade do ensino: uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Revista Brasileira de Educação, Jan /Fev /Mar /Abr 2005 nº 28. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n28/a02n28.pdf . Acesso em: 20 fev de 2018.
SAVIANI, Dermeval; ALMEIDA, Jane Soares de; SOUZA, Rosa Fátima de; VALDEMARIN, Vera Teresa. O Legado Educacional do século XX no Brasil. 2ª edição. Autores Associados. SP, 2006.
SCAFF, Elisângela Alves da Silva; PINTO, Isabela Rahal de Rezende. O Supremo Tribunal Federal e a garantia do direito à educação. Autores Associados, Revista brasileira de Educação, v. 21, nº65, abr-jun, 2016.
A 3ª edição do Seminário “Federalismo e Políticas Educacionais” é uma realização do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais em parceria com o Grupo Espaços Deliberativos e Governança Pública do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Gegop-Clacso), a seção estadual da Associação Brasileira de Política e Administração da Educação (Anpae-ES) e o Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo, contando com o apoio da rede Clacso.
Com o objetivo de debater os 30 anos da Constituição brasileira e os desafios para a afirmação do Estado democrático de direito, do federalismo cooperativo e da educação como direito social de cidadania. A partir do tema “Para onde vai a Democracia? O Brasil após 30 anos da Constituição de 1988” o evento se propõe a congregar pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, professores da educação básica e superior, estudantes, gestores e outros interessados para um balanço do Estado democrático de direito e para uma análise de conjuntura das políticas públicas, em geral, e das políticas educacionais, especificamente, no cenário de incertezas diante da crise política, institucional e econômica atual nas mesas, conferências, palestras e apresentações de trabalho.
Assim o evento realizou uma chamada pública e ampliada para pesquisadores das mais diferentes áreas submeterem suas produções à avaliação da Comissão Científica que avaliou os trabalhos em sua relevância e aproximação ao escopo do evento e à qualidade teórica, instrumental, argumentativa e discursiva para as Comunicações orais que se realizarão.
Desse modo os anais ora apresentados compõe importante sistematização das obras que serão discutidas e compartilhadas no evento.
Sejam bem-vindos/as ao nosso evento!
Sejam bem-vindos/as à Vitória!
Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais
ORIENTAÇÕES PARA APRESENTAÇÃO DA COMUNICAÇÃO ORAL:
1 - Elabore a apresentação da Comunicação oral, contendo os mesmos itens do resumo expandido (título, autores, introdução/problematização, metodologia, resultados e referências).
2 - Você deverá confeccionar até oito slides para a apresentação oral, utilizando o modelo disponibilizado: (Template Slides.ppt - anexo)
3 - As apresentações ocorrerão no dia 01/11, entre 14:00 e 18:00, conforme atribuição de salas por eixo temático.
4 - O tempo de apresentação é de no máximo 15min e estarão disponíveis notebook e projetor multimídia para arquivos em formato .pdf.
Caroline Falco Fernandes Valpassos | COORDENAÇÃO COMISSÃO CIENTÍFICA (ANPAE-ES) |
Andressa Mafezoni Caetano | PPGMPE / UFES |
Dulcinea Campos Silva | PPGMPE / UFES |
Eduardo Augusto Moscon de Oliveira | LAGEBES |
Elimar Leal | ANFOPE-ES |
Flávia Costa Lima Dubberstein | SEME - CARIACICA |
Itamar Mendes da Silva | PPGMPE / UFES |
Lara Carlette | UEPG |
Larissa Ferreira Rodrigues | PPGMPE / UFES |
Luana Almeida | UNIVAS |
Marcelo Lima | PPGE / UFES |
Michele Pazolini | IFES |
Rodrigo Ferreira Rodrigues | ANPAE-ES |
Sandra Kretli da Silva | PPGMPE / UFES |
Simone Cassini | PMSM |
Simone Smiderle | PPGE / UFES |
Suzany Goulart | CE - UFES / ANFOPE |
Tatiana das Merces | PPGE / UFES |
Tatiana Peterle | PPGE / UFES |
Vitor Gomes | PPGMPE / UFES |
Endereço Eletrônico: federalismo.ufes@gmail.com
Telefone (027) 4009-7777