PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA E SUA RESSIGNIFICAÇÃO PERMANENTE NA EDUCAÇÃO DO CAMPO/ES
RESUMO
O presente trabalho constitui reflexões acerca das experiências da Pedagogia da Alternância (PA) no Espírito Santo (ES) a partir da vivência na formação de educadoras/es do campo, como parte da luta por uma Educação do Campo. Tomamos a PA como foco dessa investigação, na tentativa de compreender em que medida foi possível exercitar a práxis educativa entre os diferentes saberes imbricados nas vivências formativas, originadas dos movimentos sociais do campo, movimentos estes que reinventam sua própria existência e resistência. Buscamos explicitar a amplitude dessas experiências pedagógicas desenvolvidas coletivamente, de acordo com as características de cada território em que o Projeto Educativo se fecunda, analisando produções e sistematizando vivências. Emerge do estudo o entendimento que nesse percurso formativo, a partir da práxis, educandas/os, educadoras/es vivenciam a alternância pedagógica do TE e TC como princípio e diretriz na organização dos processos formativos dos sujeitos do/no Campo.
Palavras-chave: Educação do campo, Pedagogia da alternância/ES, Transformação social.
INTRODUÇÃO
A Pedagogia da Alternância, concebida como uma das pedagogias produzidas nas escolas do campo capixaba, ganhou materialidade inicialmente nas experiências das Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) e Centros Familiares de Formação por Alternância (CEFFAs), ampliando-se no ES nas escolas de acampamentos assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no ProJovem Campo - Saberes da Terra, desde o ensino fundamental e, recentemente, até no ensino superior (Pedagogia da Terra e Licenciatura em Educação do Campo).
São essas experiências da Pedagogia da Alternância no âmbito da Educação do Campo capixaba que buscamos evidenciar, compreendendo que essa pedagogia produzida em escolas do campo se preocupa com a relação teoria-prática e considera os saberes, a cultura, as relações sociais, a luta, na perspectiva de valorizar a aprendizagem das educandas/os como ponto de partida na produção de saberes sistematizados, de forma a considerar o que realmente faça sentido para a vida dos sujeitos do campo. Tem como objetivos explicitar os desafios que persistem na perspectiva de superá-los, bem como identificar alternativas que possivelmente vêm impulsionando a batalha pela educação pública, laica e de qualidade social. Procuramos evidenciar de que maneira o movimento de educação do campo na luta pelo reconhecimento da PA contribui com a política pública da educação do campo do ES. A pesquisa participante (BRANDÃO, 2006) assumida como opção metodológica contou com o envolvimento dos sujeitos que vivenciam a PA.
A base teórica nos permite refletir sobre as múltiplas práxis pedagógicas que se entrelaçam às experiências de luta pelo direito à educação, e denunciar o descaso do governo estadual com as escolas que exercitam essa pedagogia. Os resultados evidenciam a consolidação de práticas educativas que têm como base os princípios da Educação do Campo e suas práticas expressas na Alternância Pedagógica, compreendendo-a como preceito que possibilita contribuir com a formação integral dos sujeitos do campo. Este estudo procura ampliar o debate no que tange as experiências da PA, na perspectiva de reconhecer tais práxis e suas ressignicações de acordo com seus territórios e lutas sociais.
TRAJETÓRIAS DE LUTA E RESISTÊNCIA
A Pedagogia da Alternância que se enraíza em solo capixaba desde a década de 1950 vem sendo ressignificada em múltiplos espaços e tempos educativos e sinalizam experiências formativas a partir das especificidades das demandas de escolarização dos povos do Campo, assumindo uma “expressão polissêmica” (RIBEIRO, 2008) que valoriza o que há de comum, em suas múltiplas experiências educativas.
Essa pedagogia dialógica alicerçada em Freire (1983) permite a luta pela superação dos desafios existentes em cada comunidade e possibilita a problematização dos próprios saberes e sua relação com a realidade, no intuito de melhor compreendê-la, explicá-la, e, posteriormente, transformá-la. Segundo Fernandes (2012, p.17) a alternância pedagógica do TE e TC nos territórios camponeses se consubstancia em tempos “essenciais porque associam educação e trabalho nos espaços onde as pessoas produzem suas próprias existências”, que possibilitam o diálogo de saberes.
Nesses 50 anos, a Pedagogia da Alternância no ES tem sido fertilizada nas experiências das escolas do campo a partir da luta dos movimentos sociais. Na Educação de Jovens e Adultos (EJA), a partir da experiência do ProJovem Campo – Saberes da Terra, compreendemos que a PA vem sendo ressignificada, não só para atender a especificidade da modalidade EJA, mas também em função das relações de trabalho de grande parte das comunidades camponesas. Essa ressignificação tem sido motivada para atender às características dos sujeitos, que vivem no Campo, mas que têm que vender sua força de trabalho nas fazendas (migrantes sazonais) ou até mesmo nas cidades.
Para as escolas do MST a ideia de organizar diferentes tempos na escola significa incorporar princípios da Pedagogia do Movimento: a mística, a auto-organização, a coletividade, a marcha e mobilização, onde a escola não é só lugar de estudo. Entende-se que a escola é um lugar de formação humana, e por isso as várias dimensões da vida devem ter lugar nela, sendo trabalhada pedagogicamente. Assim, a alternância torna-se estratégia pedagógica e “a relação entre TE e TC é uma forma de afirmar a escola como espaço de formação conectada com a comunidade, organização coletiva e a luta social” (CALDART, 2013, 139).
No contexto das EFAs a PA surge com o propósito de contribuir com a formação técnica de agricultoras/es, com intuito de aperfeiçoar as tecnologias utilizadas na produção agrícola e buscar a valorização do campo enquanto território de produção de vida. Preocupam-se “[...] com a formação humana e cidadã e com o engajamento social e político dos alunos nas suas comunidades [e com] a formação para a liberdade” (RACEFFAES, 2015, p. 37).
No âmbito dos CEFFAs a Alternância se assemelha as EFAs, pois também não se restringe a alternar tempo e espaço escolar e tempo espaço socioprofissional, podendo ser recriada a partir de um contexto complexo de relações sociais que envolvem a partilha de saberes com a participação das famílias e das associações. E ao mesmo tempo se compreende como uma pedagogia em permanente construção (ANTUNES-ROCHA et al, 2012).
Assim como nas experiências já mencionadas essa perspectiva teórico-prática-metodológica tem se constituído como uma importante metodologia formativa dos sujeitos campesinos no âmbito da Educação Básica e na Educação Superior, em especial nos cursos de Pedagogia da Terra e de Licenciatura em Educação do Campo, em que a metodologia tem se constituído no que denominamos Tempo-Universidade (TU) e Tempo-Comunidade (TC), com intervalos mensais entre os dois tempos/espaços formativos.
A organização dos tempos e espaços em alternância parte do princípio de que universidade e comunidade são tempos/espaços de apropriação, produção e avaliação de saberes. Esta metodologia de oferta intenciona evitar que o ingresso de jovens e adultos na Educação Superior reforce a alternativa de deixar de viver no campo, bem como objetiva proporcionar o acesso e a permanência no curso das/os educadoras/es em exercício nas Escolas do Campo (MOLINA; SÁ, 2011).
A experiência da PA no âmbito da Educação do Campo nos revela possibilidades muito férteis para se pensar a formação a partir da auto-organização das turmas, tendo como eixo central a valorização do trabalho de cada educanda/o, respeitando a realidade das comunidades e ajudando a perceber o que precisa ser mudado. Nesse intento, o debate da Educação do Campo provoca reflexões sobre a oferta educacional precária, a forma perversa de exclusão representada pela negação do acesso à escolarização, interferindo de forma prejudicial na constituição das trajetórias dos sujeitos do campo.
A PA, amparada pela LDBEN Nº 9394/96 em seu Art. 23 e pelo Parecer CBE/CNE Nº 01/06, como conquista do Movimento da Educação do Campo do ES, teve sua inclusão no Plano Estadual de Educação, representada na META 2, ESTRATÉGIA 2.6, que a reconhece no processo de formação das/os educandas/os do campo. No entanto, percebe-se que mesmo o ES sendo o berço da PA no Brasil e diante de legislação diretiva quanto à possibilidade e necessidade de se empregarem metodologias e estratégias específicas para as comunidades do campo, a Secretaria de Educação do Estado vem sistematicamente, nos últimos anos, dificultando a sua implementação, além da prática de fechamento de turmas e de escolas.
Nesse sentido é fundamental a atuação dos movimentos sociais do campo, que vêm demarcando a oposição entre dois projetos políticos distintos: dos direitos e dos saberes. Inseriu-se então a questão entre a continuidade das heranças e tradições urbanistas ao abrir caminho para o avanço do agronegócio, que no ES se consubstancia no Plano Estratégico de Desenvolvimento da Agricultura Capixaba - PEDEAG (ESPÍRITO SANTO, 2008), e o do campesinato, o Plano Camponês. O PEDEAG, que propõe a integração competitiva ao mercado global e o avanço das monoculturas, além da exploração de mármore, granito e petróleo, delimita um projeto de educação voltado para o estoque de mão de obra qualificada, de acordo com critérios dos grandes capitais industriais e das empresas integradas em seus arranjos produtivos. O Plano Camponês, em contraposição à lógica capitalista que explora a terra como terra de negócio, propõe uma Reforma Agrária Popular para a produção de alimentos sem veneno, incluindo processos coletivos da agricultura camponesa, indígena e quilombola, imbricadas no Projeto de educação na perspectiva da emancipação humana. Essa reflexão sinaliza a necessidade de se pensar a educação do campo no ES a partir dessas diferentes trajetórias históricas, em contraponto à política de mercantilização da educação.
HORIZONTES A TRILHAR
Em um contexto educacional com tantas contradições de classes, de destinos, de saber, de relações, de identidades e de tantas questões que estão no ar; em um tempo de tantas desigualdades sociais e econômicas, no campo e na cidade, urge afirmar a importância da educação dos sujeitos que vivem no campo, ecoar gritos da terra. Gritos que clamam por todos os lados que é hora de mudanças profundas na sociedade, de transformações radiais para que as vidas tomem seu rumo em direção da humanidade do humano.
Reafirmar a Pedagogia da Alternância para o desenvolvimento do campo gerador e produtor de vidas, através do encontro entre o TE e TC é buscar a unidade dos saberes acumulados ao longo da história e provocar a/o educanda/o a observar a realidade na sua totalidade, possibilitando a percepção da germinação da vida, com suas nuances, em sua forma mais sublime e diversificada, trazendo encantamentos e saboreando os frutos da terra. Esse tom se faz presente com a afirmação dos elementos da PA, que tece e enaltece unidades de relacionamentos e vivencias, de descobertas e produções e por afirmação da vida que gera vidas.
Como sinalizamos, a luta pela permanência e fortalecimento da PA são frutos de resistência da classe trabalhadora pelo acesso à educação escolar própria e apropriada às/aos camponesas/es. Compreendemos que os sujeitos do campo, com suas formas educativas, organizativas, políticas e de lutas, procuram, em sua práxis, transformarem-se em sujeitos coletivos. Movidos pelos princípios da Educação do Campo tecem uma nova visão de mundo, de ser humano e de sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANTUNES-ROCHA, M. I. et al (Org.). Territórios educativos na educação do campo: escola, comunidade e movimentos sociais. Belo Horizonte: Autêntica, 2012. (Coleção Caminhos da Educação do Campo; 5)
BRANDÃO, C. R. Pesquisa Participante. Carlos Rodrigues Brandão (Org). São Paulo: Brasiliense, 2006.
CALDART, R. S. Escola em movimento no Instituto de Educação Josué de Castro. São Paulo: Expressão Popular, 2013.
ESPÍRITO SANTO. Secretaria da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca. Plano estratégico de Desenvolvimento da Agricultura Capixaba – NOVO PEDEAG 2007 – 2025. Vitória: Governo do Estado, 2008.
FERNANDES, B. M. Territórios da Educação do Campo. In: CALDART, R. S. et al Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012.
FREIRE, P.. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
MOLINA, M. C.; SÁ, L. M. (Org.). Licenciaturas em Educação do Campo: Registros e Reflexões a partir das Experiências Piloto. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011.
RACEFFAES. Cultivando a educação dos povos do campo do Espírito Santo. São Gabriel da Palha, ES: Gráfica Cricaré, 2015.
A 3ª edição do Seminário “Federalismo e Políticas Educacionais” é uma realização do Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais em parceria com o Grupo Espaços Deliberativos e Governança Pública do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Gegop-Clacso), a seção estadual da Associação Brasileira de Política e Administração da Educação (Anpae-ES) e o Laboratório de Gestão da Educação Básica do Espírito Santo, contando com o apoio da rede Clacso.
Com o objetivo de debater os 30 anos da Constituição brasileira e os desafios para a afirmação do Estado democrático de direito, do federalismo cooperativo e da educação como direito social de cidadania. A partir do tema “Para onde vai a Democracia? O Brasil após 30 anos da Constituição de 1988” o evento se propõe a congregar pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, professores da educação básica e superior, estudantes, gestores e outros interessados para um balanço do Estado democrático de direito e para uma análise de conjuntura das políticas públicas, em geral, e das políticas educacionais, especificamente, no cenário de incertezas diante da crise política, institucional e econômica atual nas mesas, conferências, palestras e apresentações de trabalho.
Assim o evento realizou uma chamada pública e ampliada para pesquisadores das mais diferentes áreas submeterem suas produções à avaliação da Comissão Científica que avaliou os trabalhos em sua relevância e aproximação ao escopo do evento e à qualidade teórica, instrumental, argumentativa e discursiva para as Comunicações orais que se realizarão.
Desse modo os anais ora apresentados compõe importante sistematização das obras que serão discutidas e compartilhadas no evento.
Sejam bem-vindos/as ao nosso evento!
Sejam bem-vindos/as à Vitória!
Grupo de Pesquisa Federalismo e Políticas Educacionais
ORIENTAÇÕES PARA APRESENTAÇÃO DA COMUNICAÇÃO ORAL:
1 - Elabore a apresentação da Comunicação oral, contendo os mesmos itens do resumo expandido (título, autores, introdução/problematização, metodologia, resultados e referências).
2 - Você deverá confeccionar até oito slides para a apresentação oral, utilizando o modelo disponibilizado: (Template Slides.ppt - anexo)
3 - As apresentações ocorrerão no dia 01/11, entre 14:00 e 18:00, conforme atribuição de salas por eixo temático.
4 - O tempo de apresentação é de no máximo 15min e estarão disponíveis notebook e projetor multimídia para arquivos em formato .pdf.
Caroline Falco Fernandes Valpassos | COORDENAÇÃO COMISSÃO CIENTÍFICA (ANPAE-ES) |
Andressa Mafezoni Caetano | PPGMPE / UFES |
Dulcinea Campos Silva | PPGMPE / UFES |
Eduardo Augusto Moscon de Oliveira | LAGEBES |
Elimar Leal | ANFOPE-ES |
Flávia Costa Lima Dubberstein | SEME - CARIACICA |
Itamar Mendes da Silva | PPGMPE / UFES |
Lara Carlette | UEPG |
Larissa Ferreira Rodrigues | PPGMPE / UFES |
Luana Almeida | UNIVAS |
Marcelo Lima | PPGE / UFES |
Michele Pazolini | IFES |
Rodrigo Ferreira Rodrigues | ANPAE-ES |
Sandra Kretli da Silva | PPGMPE / UFES |
Simone Cassini | PMSM |
Simone Smiderle | PPGE / UFES |
Suzany Goulart | CE - UFES / ANFOPE |
Tatiana das Merces | PPGE / UFES |
Tatiana Peterle | PPGE / UFES |
Vitor Gomes | PPGMPE / UFES |
Endereço Eletrônico: federalismo.ufes@gmail.com
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