Nesse artigo objetivo analisar a terceira e última fase do itinerário intelectual de Euclides da Cunha, no período compreendido entre 1904-1909. É a fase dos estudos amazônicos, onde Euclides se assume como escritor, preocupado com o território brasileiro, agindo como uma espécie de interlocutor do pensamento geopolítico ao discutir as delimitações das fronteiras com Peru e Bolívia. É desse período que Euclides se revela como um intelectual sensível aos problemas sociais e políticos da exploração da borracha na Amazônia. É nesse momento também que surge o perfil de um Euclides crítico da intelectualidade da Rua do Ouvidor, membro da Academia Brasileira de Letras, da qual manteve interlocução com intelectuais que se consagraram na interpretação do Brasil. Mas é também do final desse período que assistiremos um Euclides cético com a política, com os rumos nação e com o Brasil, num prenuncio intelectual do seu trágico final de vida. Dessa forma, nesse artigo, procurei organizar o estudo do itinerário do pensamento político de Euclides da Cunha, selecionando textos com esse recorte temporal da elaboração da escrita, no período compreendido de 1904 até 1909, ano da sua morte. Nesse período, Euclides da Cunha observa e analisa a realidade brasileira a partir de diferentes estilos de linguagem, incorporando uma multiplicidade de teorias e matrizes ideológicas, cujo propósito visava recolocar o Brasil no rumo da modernidade. No entanto, cumpre ressaltar que esse artigo é parte de uma pesquisa maior, da qual originou minha tese de doutorado, onde procurei recompor a produção literária de Euclides numa perspectiva de investigação na área de Pensamento Político Brasileiro. Nesse sentido, o recorte se deu a partir dessa última fase da vida de Euclides da Cunha, marcada pelo dilema da conciliação entre o mito das letras e do idealista do Brasil como Estado/Nação. Procuro com isso, acentuar em Euclides sua postura crítica com reflexões sobre o território e as fronteiras com os países vizinhos, enfatizando seu ceticismo e desilusão quanto as reais possibilidades de mudanças políticas no Brasil. Ao procurarmos reconstituir o itinerário do pensamento político de Euclides da Cunha, optamos por examinar seus textos em ordem cronológica atotando como critério o período em que foram escritos. Evitamos com isso selecionar textos baseado na data de publicação, uma vez que boa parte dos escritos de Euclides só foram conhecidos e publicados após sua morte em 1909. Assim, do ponto de vista metodológico, a organização do itinerário da evolução do pensamento político de Euclides da Cunha, só pôde ser levado a cabo a partir do momento que optamos por combinar dois tipos de estratégias de análises: (1) cronológica, tomando como referência o momento histórico que Euclides escreveu seus textos; (2) contextualismo linguístico sugerido por Skinner (2006), do qual, segundo Vieira e Cassimiro (2019, p. 43), propõe “um reconhecimento do contexto intelectual no qual os atores históricos estão imersos, sobre a circulação e recepção de ideias. Por fim, esse diálogo interdisciplinar entre Literatura brasileira e Ciência Política, só foi possível uma vez que elencamos um critério analítico mais preciso que pudesse orientar essa pesquisa dentro da área de Pensamento Político Brasileiro. Assim, foi que emprestamos de Lynch (2016), aquilo que ele vai chamar de “estilo periférico de redação” ou “traços do pensamento político brasileiro” que consistem em exacerbações ou mitigações daqueles já presentes na “teoria” cêntrica”, do qual iluminou o caminho de nossa pesquisa em torno do itinerário do pensamento político de Euclides. Esses critérios apresentam as seguintes características: (1) Menor grau de generalização e maior sentido prático das reflexões políticas; (2) Maior centralidade retórica, da oratória e do argumento de autoridade; (3) Tendência dos autores nacionais se apresentarem como pioneiros na modernidade cêntrica; (4) Estilo conservador ou radical em comparação aos autores de países europeus; (5) Orientação prospectiva da política. O passado era visto como negativo e o futuro o lugar da redenção nacional, a ser alcançado pelo progresso, pela civilização, pela modernização e pelo desenvolvimento; (6) Abundância de projetos nacionais a partir dos modelos dos países cêntricos; (7) Certo grau de pedagogismo no sentido da necessidade de se educar a população.
O II Seminário de Pensamento Social Brasileiro – intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, realizado entre os dias 23 e 27 de novembro de 2020, na modalidade online, transmitido pelas páginas oficiais do evento no Youtube e no Facebook e pela DoityPlay.
https://netsib.ufes.br/seminario/cadernoderesumos