O movimento pós-colonial tem seu marco fundacional nos fins dos anos 70 e início dos anos 80, atingindo um nível de radicalidade crítica que vem abalando a estrutura teórica e epistemológica do ocidente, de forma contundente, desde o final dos anos 90 e início dos anos 2000. Os efeitos do desafio ao eurocentrismo das Ciências Humanas e Sociais, por parte dessas teorias insurgentes, vem sendo sentido mais marcadamente nos campos da Filosofia, Antropologia, Artes, Literatura, Estudos de Gênero e Sexualidade, dentre outros. Mas ainda muito pouco no Pensamento Social Brasileiro. O presente trabalho – fruto de minha pesquisa de mestrado – coloca o pensamento social de Sérgio Buarque de Holanda, presente em seu clássico Raízes do Brasil, em conexão com o pensamento descolonial de [1] Aimé Cesaire, em seu Discurso sobre o colonialismo, [2] Albert Memmi, em seu Retrato do colonizado, precedido de rertrato do colonizador e [3] Frantz Fanon em seu Os condenador da terra. Adoto esses três autores como tríade de pais fundadores do pensamento pós-colonial porque, apesar de anteriores à institucionalização do campo e de não o terem sistematizado, [1] já trabalhavam com essa divisão binária do mundo, [2] inauguram a descrição do mundo da perspectiva dos não-brancos e colonizados e [3] estão no interior do colonialismo, o que os favorece na proposta de recontar a história da perspectiva do colonizado. O formato ensaístico torna “Raízes do Brasil” uma obra aberta que nos convida a dialogar e refletir sobre o Brasil, com possibilidades, a cada leitura, para que os comentários possam ser articulados sempre de maneiras criativa e inovadora. Fiz uma releitura panorâmica da obra, mas uma releitura crítica, distanciando-me das leituras weberianas, um distanciamento tático necessário, pois essas análises estão situadas na perspectiva eurocêntrica. Esse afastamento estratégico das leituras weberianas visa assumir uma perspectiva não-eurocêntrica (releitura crítica), para aprender nela e com ela (diálogo descolonial). A aproximação estratégica com os autores pós-coloniais é o início da investigação do quanto Sérgio Buarque dialoga com o atual debate sobre colonialidade, enquanto continuidade das formas coloniais de dominação do ser, do sentir, do saber e do poder. Portanto, a releitura crítica e diálogo descolonial visam ampliar as linhas de leitura da obra. A hipótese é de que contribuições significativas podem emergir dessa aproximação, para repensar a História do Brasil e o Pensamento Social Brasileiro. A questão central é: o que Sérgio Buarque teria a dizer se fosse afetado pelas provocações do pensamento pós-colonial? É uma pesquisa teórica, bibliográfica, articulando teoria social, pensamento social brasileiro e pensamento pós-colonial. Utilizei, como fontes de pesquisa e interlocução, o clássico, alguns de seus comentadores, autores do pensamento pós-colonial e autores contemporâneos em teoria e pensamento social. A escolha dos referenciais pós-coloniais, em especial, foi feita após percorrer a trajetória de construção do campo como movimento teórico-político. Concluí, desse pequeno esforço teórico, que [1] com base nos 15 pressupostos e 5 pistas para o diálogo descolonial, encontrados em “Raízes do Brasil” pós-releitura crítica, é possível afirmar que dialoga com a atual discussão de colonialidade; [2] a partir da interrogação do lugar discursivo e disciplinar de Sérgio Buarque, a inovação teórico-metodológica é a possibilidade de inversão do seu olhar e ponto de vista, assumindo uma atitude historiográfica e sociológica não-eurocêntrica; [3] também com base nos pressupostos e pistas, confirmação do ocultamento de Sérgio Buarque dos não-europeus (africanos e ameríndios), como protagonistas da articulação dialógica da modernidade, em sua narrativa da colonização; [4] a partir dessa mudança de postura historiográfica e sociológica, reconsiderando os não-europeus, encontrei elementos para um potencial debate sobre revolução como protagonismo das classes populares; [5] apresentou-se a seguinte: a cordialidade proposta por Sérgio Buarque é colonialidade à brasileira?
O II Seminário de Pensamento Social Brasileiro – intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, realizado entre os dias 23 e 27 de novembro de 2020, na modalidade online, transmitido pelas páginas oficiais do evento no Youtube e no Facebook e pela DoityPlay.
https://netsib.ufes.br/seminario/cadernoderesumos