Só se não for brasileira nessa hora: Novos Baianos e a reconstrução da identidade nacional
Caique Geovane Oliveira de Carvalho
Maria Silveira Garcia Guerra
O presente trabalho tem o objetivo de analisar como o álbum Novos Baianos F.C., de 1973, relaciona artisticamente o Brasil com o mundo a partir da reconstrução de uma identidade brasileira em constante diálogo com culturas estrangeiras. Para tal análise, nos baseamos nas teorias sobre arte de Walter Benjamin e Ernst Fischer que a compreendem enquanto uma representação social que pode expressar, aos seus modos, os dilemas provenientes do contexto social da qual faz parte. Em visto disso, investigaremos esse álbum no bojo do debate instaurado na década de 60, entre o moderno e tradicional, que veio a desembocar em uma disputa entre o nacional e o cosmopolita, tendo como um dos picos desse conflito a Marcha contra as guitarras elétricas e o Festival de música da Record de 1967.
O processo de modernização ao qual o país passava na década de 60, que conservava suas desigualdades sociais estruturais e se aliava ao capital norte-americano incidiu no plano estético, segundo Marcos Napolitano, através da discussão acerca da inserção de gêneros e instrumentos estrangeiros na música brasileira. Alguns artistas temiam a perda da identidade nacional frente aos gêneros musicais estadunidenses, enquanto outros defendiam a necessidade de inserção de gêneros e instrumentos de outras culturas buscavam remodelar a identidade nacional aliando-a a uma proposta artística cosmopolita e sem fronteiras.
A identidade nacional, portanto, figura como um dos elementos centrais dessa disputa ocorrida na década de 60, visto que a inserção do “moderno” parecia significar para alguns artistas e críticos musicais a dissolução do que fazia o Brasil ser Brasil, ou seja, sua identidade. Ao nosso ver, a produção musical dos Novos Baianos e em especial o álbum de 1973, reincinde e, ao mesmo tempo, deflagra esse debate, produzindo uma obra que reescreve no âmbito da música popular brasileira gêneros, ritmos e instrumentos deixados à margem da produção musical brasileira no decorrer do tempo, sem recusar os gêneros estrangeiros, tal como o Rock n Roll, como forma válida de expressão.
Diante disso, Novos Baianos F.C. parece expressar um período posterior da música no contexto social brasileiro, isso porque a assimilação do tropicalismo e de gêneros estrangeiros tornou-se um fato na produção musical no país, com isso, o debate acerca da identidade nacional, se modificou. A questão não era mais se os artistas deveriam produzir canções pretensamente modernas e cosmopolitas, mas sim: o que irá acontecer depois de termo-nos abertos ao outro?
O diálogo entre as diversas culturas e a inserção de elementos musicais estrangeiros era uma realidade, assim como a ditadura militar e seu processo modernizador. Os novos baianos F.C se inscrevem nesse período histórico. Ao mesmo tempo que o grupo assimilou as contribuições musicais estrangeiras, seus gêneros e instrumentos, os artistas buscaram renegociar o lugar das expressões artísticas geradas no país. No álbum percebe-se a busca por uma reconstrução da identidade nacional que elabora gêneros como o Baião e o Samba em intenso diálogo com influências estrangeiras como a do Rock. Junto a isso, percebe-se a mobilização de elementos constitutivos da identidade brasileira como o futebol em Só se não for brasileiro nessa hora, o samba em Samba da minha terra e o imaginário religioso de Cosme e Damião em Cosmos e Damião parece indicar essa busca por uma redefinição do que é ser brasileiro.
Para tal trabalho iremos dialogar com a Teoria Crítica buscando absorver suas contribuições no que se refere ao estudo da arte, no que se refere aos estudos acerca da identidade nacional, buscaremos nos basear nos trabalhos de Benedict Anderson e Montserrat Guibernau, além das críticas formuladas por teóricos ligados aos Estudos Culturais como Stuart Hall e Nestor Garcia Canclini a essa primeira formulação teórica de identidade nacional.
O II Seminário de Pensamento Social Brasileiro – intelectuais, cultura e democracia, organizado pelo NETSIB-UFES, realizado entre os dias 23 e 27 de novembro de 2020, na modalidade online, transmitido pelas páginas oficiais do evento no Youtube e no Facebook e pela DoityPlay.
https://netsib.ufes.br/seminario/cadernoderesumos