Objetivos: A malária grave é uma infecção causada por Plasmodium
falciparum que afeta os eritrócitos. Algumas condições relacionadas ao
indivíduo infectado podem torná-lo resistente à ação do parasito. Este trabalho
teve como objetivo revisar a literatura científica acerca do fator de proteção
contra a malária grave condicionado ao traço falciforme e discutir a frequência
gênica da anemia falciforme nas populações em que a malária é endêmica.
Métodos: Trata-se de uma revisão bibliográfica, para a qual foram conduzidas
buscas na base de dados MEDLINE, através da utilização dos descritores
"Anemia, Sickle Cell" e malaria, e a palavra-chave protection. Foram
selecionados estudos publicados entre 2013 e 2023, encontrando-se,
inicialmente, 28 artigos, dos quais, 13 foram descartados por incompatibilidade
com o tema, restando 15 utilizados na presente revisão. Resultados: Os
mecanismos de resistência ao Palsmodium são multifatoriais, tanto em
interações hospedeiro-parasita quanto em interações célula parasitada-meio,
não estando totalmente elucidados. O arsenal citológico antimalárico melhor
reconhecido é o da reorganização prejudicada da actina do hospedeiro
induzida pelo parasito, indução essa que ocorre nos primeiros estágios da
infecção e é imprescindível para a expressão celular superficial de fatores de
virulência, a qual, além de interferir no tráfego vesicular de adesinas
codificadas pelo protozoário, ainda reduz a citoadesão dos eritrócitos
infectados às células endoteliais da microvasculatura humana. O stress
oxidativo também é apontado como desencadeador dessa proteção. A anemia
falciforme foi a primeira doença hereditária descrita em nível molecular; nela
apresentam-se alterações físicas nos eritrócitos, que adquirem formato de
foice, provenientes de uma alteração na hemoglobina, na qual ocorre a
substituição dos aminoácidos ácido glutâmico por valina no códon 6 da cadeia
beta. O traço falciforme em heterozigose confere resistência de 90% à malária
humana grave. Estudos apontam, como mecanismo de resistência à malária
falciparum, a elevação de componentes moleculares exossômicos, como o
microRNA- 451, em eritrócitos HbSS e HbAS (genótipos homozigoto e
heterozigoto do traço falciforme, respectivamente), com a inibição do
desenvolvimento e/ou da densidade do parasito no organismo em diversos
estágios de seu desenvolvimento intraeritrocítico. Também foi identificado que
a Plasmodium falciparum produz gametócitos de maneira diferente na célula
falciforme. A hipótese de que os genótipos de hemoglobina modulam a
resposta inflamatória à infecção pelo Plasmodium também é discutida. A
frequência gênica para o traço falciforme é elevada nas regiões endêmicas da
malária, concentrando-se no continente africano. Dá-se pela nítida aplicação da
seleção natural neodarwiniana nos seres humanos, na qual a malária causa a
pressão seletiva que privilegia a propagação dos genes dos organismos que
sobrevivem a ela, nesse caso, dos portadores do gene HbS, responsável pelo
traço falciforme. Estudos recentes revelam que a humanidade passou por
outras pressões seletivas mais antigas para malária e sugerem que houve um
único surgimento do gene HbS nos ancestrais das populações agrícolas
africanas atuais há 22.000 anos. Conclusões: Existem diferentes mecanismos
ainda não totalmente elucidados que atuam como fator de proteção contra a
malária em indivíduos com traço falciforme em heterozigose, havendo elevada
frequência gênica desta hematopatologia em regiões endêmicas de malária.
Presidente XXXIV OUTUBRO MÉDICO
Adner Nobre de Oliveira
Presidente da Associação Médica Cearense
José Aurillo Rocha
Diretor Financeiro
Marcos Aurélio Pessoa Barros
Comissão Científica e de Trabalhos Científicos
José Nazareno de Paula Sampaio
Maria Sidneuma Melo Ventura