Desde a Constituição Federal de 1988, a educação deve ser oferecida por todas as instituições escolares brasileiras, no âmbito público e privado, abrangendo os mais variados níveis de ensino (Brasil, 1988). Em 1994, com a concepção internacional de Educação Inclusiva, fomentada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), uma proposta de educação voltada para pessoas com deficiência foi intensificada. Esse novo olhar de uma educação para todos fortaleceu a importância de um planejamento educacional alicerçado na especificidade de cada aluno. No entanto, mesmo com essa virada de lente há cerca de 30 anos, o modelo tradicional ainda encontra-se arraigado em muitas escolas, impedindo a implementação de um ensino de todos e para todos. Neste contexto, diversos estudos evidenciam a precariedade da formação e de informação sobre a temática inclusiva, em especial no Ensino Fundamental II das escolas públicas, evidenciando-se um campo aberto para a investigação, visto que tanto as políticas públicas quanto a produção de conhecimento são recentes nessa área. O projeto de escola pública inclusiva, assim como a educação voltada para a reflexão sobre as diferenças e preconceitos existentes, propicia melhorias diretas na vida de todos os educandos, principalmente para aqueles que possuem necessidades educacionais específicas. Contudo, trabalhar aspectos da inclusão nas escolas, tornando o ensino mais significativo, ao encontro de uma sociedade mais democrática e mais justa, exige que as práticas pedagógicas sejam repensadas a partir das demandas trazidas pelos alunos. Assim sendo, este trabalho tem como temática uma análise relacionada às práticas inclusivas. Para tanto, a análise se deu a partir das propostas pedagógicas de profissionais da educação que atuam numa escola pública, do município de Maricá/RJ, por meio de uma proposta de pesquisa-ação, um trabalho colaborativo entre mediadora de apoio, professores e orientadora educacional – pesquisadora. O objetivo deste estudo versa sobre metodologias ativas para o desenvolvimento do alfaletramento de uma aluna de 18 anos de idade, intitulada como Ana, diagnosticada com deficiência intelectual. Os resultados indicaram a necessidade da observação e da interlocução entre os profissionais - professores e mediadores - que atuaram com o sujeito desse estudo, para a inserção e personalização de recursos pedagógicos, condições materiais e diferentes níveis de suportes, os quais podem ser utilizados em sala de aula, de acordo com o que é observado e trazido pelo aluno, colaborando com práticas significativas e auxiliando no seu processo de ensino-aprendizagem. Assim sendo, a proposta proporcionou a construção de um ambiente plural, favorável para o alcance de oportunidades e de participação das pessoas com deficiência para seu pleno desenvolvimento. Vale ressaltar que seu êxito depende do engajamento dos envolvidos nesse processo, propondo um ensino de qualidade que contemple a diversidade, mediante um currículo apropriado para cada sujeito. Concluiu-se que com as adaptações nas metodologias, realizadas pela professora em parceria com mediadores, jogou luz a necessidade dos profissionais conhecerem o sujeito – protagonista da educação – para que fosse possível verificar quais ferramentas tecnológicas seriam mais adequadas e que faziam parte de seu cotidiano. Por conseguinte, o engajamento e a participação da aluna que apresentava necessidade de diferentes níveis de suporte no processo de ensino e aprendizagem, na escola regular, foi notada, servindo como ponto de partida para o reconhecimento das individualidades da educanda, colaborando com o processo significativo de inclusão escolar desta estudante. Assim sendo, através da pesquisa, pretendeu-se efetivar estudos que resultem em possíveis direções para os profissionais da área educacional, contribuindo para uma educação que acolha, em lugar de excluir.
XII SEMINÁRIO INTERNACIONAL AS REDES EDUCATIVAS E AS TECNOLOGIAS: Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaçostempos educativos
Cantar, dançar e viver a experiência mágica de suspender o céu é comum em muitas tradições. Suspender o céu é ampliar o nosso horizonte; não o horizonte prospectivo, mas um existencial. (...) Definitivamente não somos iguais, e é maravilhoso saber que cada um de nós que está aqui é diferente do outro, como constelações. O fato de podermos compartilhar esse espaço, de estarmos juntos viajando não significa que somos iguais; significa exatamente que somos capazes de atrair uns aos outros pelas nossas diferenças, que deveriam guiar o nosso roteiro de vida. (Ailton Krenak, 2020, p. 14/15)
O XII Seminário Internacional As Redes educativas e as tecnologias: tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaçostempos educativos, é a décima segunda edição do evento bienal que vem estabelecendo diálogos entre pesquisas desenvolvidas no Brasil e no exterior relacionada às diferentes formas de existência numa sociedade onde todas, todos e todes tenham seus direitos garantidos e mantidos através do fortalecimento da democracia e do acesso e permanência aos processos formais de educação.
Temos acompanhado impactados a crescente onda de violência que vem atingindo várias instâncias sociais, entre elas as instituições educativas. Tais ações levam ao recrudescimento de lógicas e práticas de não reconhecimento da legitimidade “da outra, do outro e de outre” e, assim, naturalizando-se a sua extinção. No extremo, as premissas de eliminação das diferenças em que o conservadorismo ressoa como pauta das ações políticas e comportamentos sociais, tornam as práticas docentes alvos de questionamentos, perseguições e ataques. Somos, então, alvos, justamente por problematizarmos a progressiva desautorização da autonomia e do saber profissional docente, embates que estão intensificados tanto na produção dos currículos, quanto nas práticas cotidianas, tensão essa que vem se disseminando com o recrudescimento dos pensamentos e ações conservadoras (LACERDA, 2019). Essa intensificação dos conservadorismos, em nossa compreensão, vem atingindo diversos espaçostempossociais e trazendo questões que se referem ao debate sobre os sentidos da educação escolarizada e dos conhecimentossignificações produzidos nos currículos. No atual contexto, a complexidade das práticas docentes e curriculares nos cotidianos das escolas vem sendo atravessada por pautas do conservadorismo, ou que se utilizam de discursos e sentidos mais conservadores para dissimular projetos de sociedade pautados em premissas ultraliberais, que impõem perdas significativas de direitos e da própria ideia de direito à população (MOURA, 2018; GARCIA e GOUVÊA, 2018). Um dos pontos comuns aos projetos de poder dos setores que se aliaram em torno da anulação das pautas de democratização, parece enfraquecer a legitimidade das lutas por direitos ou mesmo do direito a ter direitos.
Como contraponto a tudo o que temos vivido nos últimos anos, o XII Seminário Redes foi um espaço de encontros solidários, onde práticas de valorização do estarmos juntos se tornaram centrais. Inspirados pela certeza de que o caminho se constrói no caminhar coletivo (PAIS, 2003), refletimos juntos sobre as diversas redes de aprendizagens culturais que emergem das vivências cotidianas. Essas redes, ao circularem outras lógicas, sentidos, significados, saberes e práticas, revelaram-se capazes de alimentar deslocamentos necessários em tempos de violência, desde que percebidas e visibilizadas.
Durante o seminário, os diálogos promovidos por nossas pesquisas contribuíram para explorar práticas mais solidárias e convivências mais dialogais e coletivas, atingindo os objetivos desta edição, que foram: debater o contexto de ódio e violência presente na sociedade brasileira e outros contextos internacionais, seus reflexos nos espaços educativos; socializar formas de solidariedade e bem-viver identificadas em nossas pesquisas nas universidades, considerando as conjunturas atuais; discutir formas de resistência aos discursos e práticas de ódio e violência que permeiam os espaços educativos e as relações sociais; investigar o extremismo contemporâneo, especialmente em relação ao seu impacto entre jovens adolescentes e à disseminação de atos de violência ideologicamente motivados; e debater pesquisas recentes sobre políticas e ações educativas contraextremistas.
O evento reafirmou o potencial transformador do diálogo, das práticas solidárias e das tessituras coletivas como resposta aos desafios de nosso tempo, por meio de uma programação diversificada composta por atividades acadêmicas e culturais realizadas na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, com transmissão simultânea pelo canal do evento no YouTube.
O Seminário contou com mais de 1.000 participantes inscritos, 446 trabalhos apresentados nas modalidades virtual e presencial, 10 oficinas, 9 mesas redondas presenciais e 11 comunicações encomendadas online, que incluíram tradução em Libras, inglês e francês. Entre os participantes, destacaram-se 13 convidados estrangeiros de diversos países e universidades. Além disso, a programação do Seminário incluiu as reuniões da Associação Brasileira de Currículo (ABdC) e do GE Cotidianos: éticas, estéticas e políticas (ANPEd).
As atividades culturais foram um destaque do evento. Durante a abertura, ocorreram a palestra do professor e escritor indígena Daniel Munduruku e a apresentação do coro Coroá Canto Coral, sob a regência de Ignez Perdigão. Também foram lançados 30 livros que abordam temas como cotidianos, memórias docentes, práticas pedagógicas e resistências. A programação incluiu ainda a II Mostra Audiovisualidades Negras, que trouxe reflexões urgentes a partir da perspectiva da negritude como um ponto de partida potente para repensar nosso cotidiano e imaginário. O encerramento foi marcado pela apresentação da Bateria Feminina Fina Batucada, sob a regência de Mestre Ryco.
Animados pelo que os dias de evento trouxeram de conhecimentos, inspirações, questões e experiências, convidamos à leitura dos textos que compõem os Anais do XII Seminário Internacional As Redes educativas e as tecnologias: tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaçostempos educativos.
Alexandra Garcia
Denize Sepulveda
Gustavo Coelho
REFERÊNCIAS
GARCIA, A.; GOUVÊA, T. da “Furando “a grande onda”: tensões e sentidos de docência e currículos frente ao conservadorismo. Communitas, [S. l.], v. 2, n. Esp, p.28–46, 2018. Disponível em: https://periodicos.ufac.br/index.php/COMMUNITAS/article/view/2226. Acesso em: 7 jun. 2023.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
LACERDA, M. B. O novo conservadorismo brasileiro: de Reagan a Bolsonaro. Porto Alegre: Zouk, 2019.
MOURA, F. P. Conservadorismo cristão e perseguição aos estudos de gênero C: a quarta versão da BNCC. Communitas, v. 2, 2018.
PAIS, J. M. Vida cotidiana: enigmas e revelações. São Paulo: Cortez, 2003.
Comissão Organizadora
Creare Solutions
Comissão Organizadora
Denize Sepulveda
Gustavo Coellho
Alexandra Garcia Ferreira Lima
LIVIA MARTINS BARBOSA PEREIRA
Evelyn Louise do Carmo Barcellar
Rafaela da Costa Fernandes
Jamily Pereira Pinto
Isabella de Fátima Siqueira Barboza
Rafaella Mattos
Comissão Científica
MARISTELA PETRY CERDEIRA
Saulo Quintanilha
Luciana Velloso
Maria Celi Vasconcelos
Talita Vidal Pereira
Flávia Barbosa da Silva Dutra
Dilton Ribeiro Couto Junior
Adriana Almeida
Gilcilene de Oliveira Damasceno Barao
Andrea da Paixão Fernandes
Coordenação Geral
Alexandra Garcia
Denize Sepulveda
Gustavo Coelho
Coordenador do Comitê Científico
Gustavo Coelho
Coordenadores das Atividades Culturais
Mailsa Carla Pinto Passos
Alexandre Guerreiro
Secretaria
Alexandre Pereira Mérida
Lívia Martins
Francy Marroquín
Fernanda Dias
Izadora Agueda Ovelha
Maristela Petry Cerdeira
Nathalia Neves
Saulo Quintanilha
Eixo 1
Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaços-tempos educativos cotidianos e nas práticas culturais
Coordenação: Luciana Velloso
Eixo 2
Tessituras de solidariedade e de convivências nas instituições educativas e suas histórias
Coordenação: Maria Celi Vasconcellos
Eixo 3
Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaços-tempos educativos com os currículos
Coordenação: Talita Vidal Pereira
Eixo 4
Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaços-tempos educativos da educação inclusiva
Coordenação: Flávia Dutra
Eixo 5
Tessituras de solidariedade e de convivências nas infâncias e nas juventudes
Coordenação: Dilton Ribeiro do Couto Junior
Eixo 6
Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaços-tempos educativos, processos formativos e frente às desigualdades sociais
Coordenação: Adriana de Almeida
Eixo 7
Tessituras de solidariedade e convivências nos espaços-tempos educativos: outras formas de conceber formação em periferias
Coordenação: Gilcilene de Oliveira Damasceno Barão
Eixo 8
Tessituras de solidariedade e de convivências nos diferentes espaços-tempos educativos do ensino em Educação Básica
Coordenação: Andrea da Paixão Fernandes
ProPEd/UERJ, ABdC (Associação Brasileira de Currículo)
PPGedu-FFP/UERJ, PPGECC-FEBF/UERJ, PPGEB-Cap/UERJ, ANPEd (GTs Currículo; Educação e Comunicação; Educação e relações étnico-raciais e GE Cotidianos - éticas, estéticas e políticas), CIRNEF – Normandie Université, FAPERJ – Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro, CAPEs – Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico