A RELEVÂNCIA DA HISTÓRIA NO ÂMBITO DA EDUCAÇÃO
Larissa Laís dos Santos Coelho - Autora/ larissalaissantos@gmail.com
Terezinha Oliveira - Orientadora-Coautora/ teleoliv@gmail.com
PPE/GTSEAM/UEM
Eixo: 1-História e historiografia da Educação
O presente trabalho tem como objetivo tratar da importância da história na educação segundo as contribuições de Jacques Le Goff, Braudel e outros autores que refletem sobre a História, assim como a relevância das pesquisas acadêmicas para o desenvolvimento humano e social. Buscamos evidenciar em que medida as pesquisas interferem na sociedade, na resolução de problemas que atingem o âmbito educacional, moral e ético dos indivíduos.
Essa pesquisa foi desenvolvida junto ao Grupo de Pesquisa Transformações Sociais e Educação nas épocas Antiga e Medieval [GTSEAM] liderado pela professora Drª Terezinha Oliveira. Nosso objetivo é, pois, analisar brevemente a importância da história no âmbito das pesquisas acadêmicas.
Para darmos início às nossas discussões recorremos aos estudos de Jacques Le Goff (1924-2014), especificamente na sua obra A História deve ser dividida em pedaços? A reflexão central desse autor incide na necessidade de se conceber ‘períodos’, ‘partes’, ‘pedaços’ ou ‘fatias’ para a História, para que, dessa forma, se consiga compreender a trajetória da humanidade. Para o autor a história deve ser entendida em pedaços, mas não pode ser dividida. Dessa maneira, para ele, “[...] a periodização deve ser empregada com mais flexibilidade do que tem sido desde que começamos a ‘periodizar a história’”. (LE GOFF, 2014, p. 73). Le Goff recupera a ideia de longa duração da história para entender todo o processo de desenvolvimento da civilização.
Para referir-se ainda mais sobre a história, Vernant (2001) apresenta a importância da memória e como ela se constitui, pois acredita-se que teve uma ação política, portanto, a memoria é uma escolha política e tem influências fundamentais no tempo presente.
Também nesse sentido, Maurice Halbwachs (1968) apresenta uma reflexão sobre a memória e a lembrança na sua obra Memória Coletiva:
“[...] uma notável distinção entre a "memória histórica", de um lado, que supõe a reconstrução dos dados fornecidos pelo presente da vida social e projetada no passado reinventado; e a "memória coletiva", de outro, aquela que recompõe magicamente o passado” (HALBWACHS, 1968, p. 7).
Para Halbwachs, as imagens e as lembranças são memórias, assim como as nossas lembranças da infância (histórias, aventuras). Por conseguinte, não há como interferir nas histórias passadas. As lembranças individuais, por seu turno, sofrem interferências coletivas e sociais. “Carrego comigo uma bagagem de lembranças históricas, que posso ampliar pela conversação ou pela leitura” (HALBWACHS, 1968, p. 37). É possível ter-se uma lembrança histórica por meio da pesquisa, para conhecermos o passado e entendermos como se constituiu o nosso presente.
Antes de discutir sobre a história e a educação, Edgar Morin (2003) em seu livro A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento, nos faz refletir sobre a necessidade da reforma do pensamento. Nesse sentido “uma cabeça bem-feita é uma cabeça apta a organizar os conhecimentos, e com isso, evitar sua acumulação estéril” (MORIN, 2003, p. 23). A universidade é o espaço de problematização e, portanto, é o lugar para ensinar os indivíduos a refletir sobre suas ações.
A Universidade deve, ao mesmo tempo, adaptar-se às necessidades da sociedade contemporânea e realizar sua missão transecular de conservação, transmissão e enriquecimento de um patrimônio cultural, sem o que não passaríamos de máquinas de produção e consumo (MORIN, 2003, p. 82).
A Universidade, como o espaço do saber, deveria formar sujeitos reflexivos para atuar na sociedade e, consequentemente, buscar melhorias para a educação. Nesse sentido, tentamos encontrar as razões por existirem tantos estudos a respeito da educação e, no entanto, cada vez mais ela está regredindo.
A educação, a história e a formação social são os objetivos centrais das Pesquisas em História da Educação. Dessa maneira, nós professores e pesquisadores temos um compromisso com a sociedade em que vivemos.
Os homens constroem história, escrevem para os seus embates e não para os homens de todas as épocas. Por isso é preciso entender o período histórico em que cada autor escreve. É o homem que produz história; assim, as nossas escolhas definem o que somos e determinam o que estamos fazendo na sociedade, ou seja, o papel que estamos ocupando. Portanto, ao nos propor a estudar algo do passado, estamos escolhendo algo para utilizar no nosso presente. A memória, a história e a educação só podem ser vista se tiver uma utilidade.
Já que é o homem que produz a história, este deve ter clareza de que suas ações interferem na sociedade. Cabe a ele, então, fazer o uso da moral e da ética. Na obra A Ética a Nicômaco de Aristóteles (1973), percebemos que o autor assume um papel de pedagogo porque se preocupa com a educação e com o futuro do seu próprio filho.
Para Aristóteles há dois tipos de virtude a moral e a intelectual:
“[...] a intelectual é majoritariamente tanto produzida quanto ampliada pela instrução, exigindo, consequentemente, experiência e tempo, ao passo que a virtude moral ou ética é o produto do hábito, sendo seu nome derivado, com uma ligeira variação da forma, dessa palavra” (ARISTÓTELES, 1973, p.15).
Dessa maneira entendemos que as virtudes devem ser colocadas em prática, caso contrário serão esquecidas. Se uma pessoa prega sobre a moral e a ética, essa deve agir com moral e ética. É o caso do professor, que deve ser o exemplo para seus alunos. Aristóteles também chama a atenção para o fato que o cidadão só existe se ele for útil para a sociedade. Nós, como sujeitos singulares, precisamos saber qual o lugar que ocupamos na sociedade e o que estamos fazendo para sua manutenção.
Se analisarmos no âmbito das pesquisas, a ética é o fundamento primordial, pois temos que viver aquilo que afirmamos em nossas pesquisas. E isso só será possível se considerarmos os ensinamentos de Aristóteles, lembrando que todos os nossos hábitos definem nossas ações. A ética é o princípio norteador para a formação humana. Dessa maneira, é de suma importância na pesquisa em história e história da educação.
Nessa perspectiva sobre a relevância da história na educação, a Universidade tem papel fundamental nesse processo, permitindo que os acadêmicos tenham contato com a história. Podemos perceber, então, a triste realidade da educação. Cabe aqui uma reflexão, o que estamos fazendo para alterar essa realidade? Nós, educadores é que devemos pensar nesse problema, pois as nossas pesquisas elaboram uma visão de mundo. Que visão de mundo estamos construindo?
Segundo Oliveira, o ensino e a prudência são aspectos essenciais à ética em Santo Tomás de Aquino “[...] se a sabedoria não é o caminho para a riqueza, ela possibilita a conservação e até mesmo a construção de um espírito de civilidade, indispensável à vida em comunidade” (OLIVEIRA, p.5). A nossa sociedade sofre pela ausência de prudência; todos os problemas que encontramos na sociedade são por conta da falta de prudência dos indivíduos. Ao discutir sobre a prudência chamamos a atenção para o fato de que a vida é social: não é possível pensar somente em si.
As Universidades deveriam estar ensinando aos acadêmicos a pensar no bem comum da sociedade, mas que conhecimento está sendo produzido no interior dessas universidades? Abandonamos o filosofar e a possibilidade de usar o intelecto, ou seja, não aprendemos nada. Qual o papel das universidades hoje? Elas estão contribuindo para a formação humana, ou está apenas formando indivíduos que pensam apenas em si e no seu diploma.
Os autores clássicos que estudamos na história pensavam na construção de uma sociedade. Por conseguinte, é importante estudarmos esses autores do passado. Estudamos o passado para pensar que os homens não são naturais. Nesse sentido em que medida nossas pesquisas irão contribuir para a sociedade?
Para refletirmos sobre essa questão, Jacques Le Goff (2003), em sua obra Passado/Presente, nos permite entender a importância de estudar o passado para agirmos no presente. “O essencial não era conhecer o passado, mas fazer uma ideia dele, da qual nos pudéssemos servir como termo de comparação para compreender o presente” (LE GOFF, 2003, p.28). O passado serve de modelo para sabermos como agir no presente.
Nesse sentido sobre a importância da história, Braudel (2011) em sua obra Escritos sobre a História apresenta a importância da ideia de longa duração e a preocupação com o ofício do historiador que está deixando de existir. De acordo com Braudel são os homens e suas relações sociais que fazem história, contribuindo para a história das civilizações para a sociedade.
Entendo por história, uma pesquisa cientificamente conduzida, digamos a rigor uma ciência, mas complexa: não há uma história, um ofício de historiador, mas, ofícios, histórias, uma soma de curiosidades, de pontos de vista, de possibilidades, soma à qual amanhã outras curiosidades, outros pontos de vista, outras possibilidades se acrescentarão ainda. (BRAUDEL, 2011, p. 91-92).
Portanto, as nossas pesquisas no âmbito da educação precisam e devem contribuir para a nossa sociedade. Caso contrário estas serão insignificante. Esses grandes autores estudaram e pensaram no conhecimento como algo coletivo, mas hoje nós não pensamos que nossos atos, nossas escolhas interferem na vida do coletivo.
Diante dessas questões, Neves e Galdino (2007) apresentam a importância da serenidade na educação para se obter uma boa relação pedagógica entre alunos e professores. Para os autores, o homem que é sereno aceita e respeita a opinião do outro. A serenidade, portanto, é uma virtude, e a mais importante para a formação da consciência dos indivíduos.
Uma reforma universitária de acordo com os autores deveria ser pautada para “[...] formar sujeitos não somente qualificados para o desempenho na área de atuação profissional, mas cidadão com consciência crítica e visão mais ampliada de mundo” (NEVES; GALDINO, 2007, p.5). Só é possível alcançarmos isso melhorando a qualidade da educação. O que podemos fazer para mudar essa situação? Estamos acostumados a ouvir que o ensino está cada dia mais debilitado, mas não fazemos nada para mudar essa realidade.
Para que se resolva o problema da falta de vontade de aprender do aluno, o professor deverá saber relacionar os conhecimentos dos livros com os conhecimentos vividos dos alunos. “Desta forma o foco do processo de ensino-aprendizagem deve partir das experiências vividas pelo aprendiz, cabendo ao docente articular e dar novo sentido a essas experiências e conhecimentos já adquiridos” (NEVES; GALDINO, 2007, p.8).
Portanto, “A função do professor está em fazer o aluno perceber, ler e interpretar a realidade posta, fazendo-o refletir uma outra, nova” (NEVES; GALDINO, 2007, p.8). Nós somos aquilo que aprendemos ser, os professores não internalizaram a ideia de conhecimento como habito; se o conhecimento fosse internalizado nos alunos, estes aprenderiam bem mais.
Educamos o ser humano pelo habito. Dessa maneira é fundamental nos preocuparmos com a educação dos jovens, pois são eles que ocuparão nosso lugar na sociedade. É mais fácil dizer que o problema está nos recursos e no governo, do que em nós, que não temos responsabilidades de ensinar nossos alunos. Estamos passando por uma crise na educação, por isso é necessário termos serenidade para o agir das nossas práticas pedagógicas.
Acreditamos que esses estudos contribuirão para a reflexão dos docentes acerca do conhecimento que está sendo produzido para a nossa sociedade. As considerações de Le Goff nos permitem perceber que em nossas pesquisas não podemos dividir a história em pedaços; ela pode, sim, ser analisada em parte, mas ela é um todo, para que compreendamos sua importância no decorrer da sociedade.
Percebemos que esses autores clássicos estavam preocupados com o encaminhamento da sociedade. Por isso seus escritos foram tão importantes e são até hoje, para que a sociedade não caia em decadência.
Uma das crises da sociedade é que o intelectual não ocupa o seu lugar na sociedade. Atualmente, temos um índice muito alto de mestres e doutores, mas na maioria das vezes suas pesquisas são individualistas. O pesquisador deve, no entanto, promover mudanças na sociedade em que ocupa. Quando os nossos estudos não afetam a sociedade, não produz conhecimento, nada contribui para a sociedade, porque não conseguimos transformar a visão de mundo.
Nós, enquanto sujeitos, somos responsáveis por nossos atos e, consequentemente, das ações públicas, privadas, pela moral e pela ética. Por conseguinte, somos responsáveis pela sociedade que está posta.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross In: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1973, v.4.
BRAUDEL, F. Escritos sobre a História. São Paulo: Perspectiva, 2011.
HALBWACHS, Maurice. A memória Coletiva. São Paulo: Vértice,1968.
LE GOFF, J. A História deve ser dividida em pedaços? São Paulo: Unesp, 2014.
LE GOFF, J. Passado/Presente. In: História e Memória. Campinas: Unicamp, 2003.
MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. Tradução Eloá Jacobina. - 8a ed. -Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
NEVES, M. GALDINO, K. Ensaio sobre Serenidade e Educação. Diálogo Educ., Curitiba, v. 7, n.20, p. 167-177, jan./abr. 2007.
OLIVEIRA,Terezinha. ENSINO E PRUDÊNCIA: ASPECTOS ESSENCIAIS À ÉTICA EM SANTO TOMÁS DE AQUINO.
VERNANT, J. P. Imagem, Imaginário, Imaginação. In. Entre Mito & Política. São Paulo: Edusp, 2001, p. 293 -321.
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