RESUMO
O objetivo dessa pesquisa consiste em caracterizar as representações sociais sobre Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e seu processo de medicalização, para professores do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental de uma cidade do noroeste do estado do Paraná. O estudo justifica-se pela necessidade de se compreender como o TDAH é concebido pelos docentes. A problemática investigada sintetiza-se em: quais são as representações sociais que os professores têm sobre o TDAH e o processo de medicalização? Para responder ao questionamento e atingir nosso objetivo nos amparamos na Teoria das Representações Sociais (TRS) e utilizamos os seguintes instrumentos: a) Questionário sociodemográfico; b) Teste de Associação Livre de Palavras (TALP); c) Roteiro de Entrevista Semiestruturada e d) Roteiro de observação do cotidiano escolar. A pesquisa é de natureza qualiquantitativa e descritiva. Os participantes dessa pesquisa são 14 professoras regentes de alunos com diagnóstico de TDAH que pertencem às séries inicias do Ensino Fundamental. Os resultados revelam que, em suas representações sociais sobre o TDAH, os docentes caracterizam-no como um transtorno que afeta a aprendizagem. No entanto, consideram que a melhor forma de tratamento é a medicação. Conclui-se que os docentes precisam assumir um papel mais crítico perante os casos de alunos com TDAH, realizando intervenções pedagógicas que os ajudem a superar as dificuldades e potencializar as habilidades, sem depender de medicamentos.
INTRODUÇÃO
Atualmente o número de crianças e adolescentes com diagnóstico de TDAH, tem aumentado constantemente, bem como o uso de medicamentos para seu tratamento. Nesse contexto, desenvolvemos uma pesquisa durante o Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Maringá sobre essa questão e suas repercussões no contexto escolar.
Ao iniciarmos a pesquisa observamos por meio de levantamentos bibliográficos um grande número de artigos sobre TDAH advindos da área de Saúde. Propomo-nos, então, a dar voz às professoras, com o intuito de investigar o transtorno a partir de um olhar dos profissionais da área da Educação. Apresentamos a seguir os resultados obtidos.
AS DIFICULDADES ESCOLASRES NA CARACTERIZAÇÃO DO TDAH E A MEDICALIZAÇÃO
Conforme exposto, utilizamos diversos instrumentos para coleta de dados. Contudo, neste texto apresentaremos os resultados do TALP e das entrevistas. Por meio do TALP expomos a frase “O TDAH é...”, em que as docentes deveriam completar oralmente com a primeira definição que viesse em mente. Notamos pelas análises que nenhuma professora utilizou os termos mais apresentados pelos médicos ou demais profissionais clínicos em seus artigos: desatenção, hiperatividade e impulsividade. O termo “transtorno” é o que mais aparece nas representações das professoras em relação ao TDAH e é relacionado ao campo da Educação, pois de acordo com as docentes, esse transtorno ou dificuldade influencia na aprendizagem. Três professoras utilizaram o termo “falta de atenção” e duas o termo “difícil de administrar”. As demais representações que apareceram apenas uma vez foram: “transtorno na sala”, “desafio”, “falta de concentração” e “agitação”.
Nas entrevistas, de forma semelhante, constatamos que ao responderem o que é TDAH, cinco professoras utilizaram a expressão “dificuldade de aprendizagem” para defini-lo. Na interpretação de Machado e Silva (2014) as representações sociais tornam reais os conceitos e modos de entender o mundo que criamos em nossa rotina. Nas falas das professoras podemos identificar os significados atribuídos ao TDAH e à própria criança que recebe o diagnóstico. De acordo com Jodelet (1989) o fato de o sujeito estar em um determinado grupo social possibilita que ele formule conhecimentos coletivos, dessa forma, esses conhecimentos apresentados pelas professoras foram construídos socialmente e traduzem o TDAH como um transtorno com implicações na aprendizagem.
Associando os dados coletados nas entrevistas e no TALP, constatamos que a maioria das professoras caracterizam o TDAH como um transtorno que afeta a aprendizagem. Tal representação social, elaborada no meio escolar, se difere dos conceitos mais apresentados pela literatura da área da Saúde, em que usam o termo “doença” para significar o TDAH.
Essa constatação é considerada um importante passo para área da Educação, pois revela que as professoras entendem que o problema maior do TDAH está na dificuldade escolar que o aluno apresenta. Sendo assim, a maior contribuição do docente consiste em ajudar o discente a superar essas dificuldades e potencializar suas habilidades, mediando o conhecimento científico e formando o sujeito para a sociedade, visto que esse é o papel dos educadores. Em outras palavras, conceber o TDAH como um transtorno neurobiológico com repercussões no processo de aprendizagem implica assumir a responsabilidade de educar e não permitir que apenas os médicos, os psicólogos, os psicopedagogos, entre outros profissionais cuidem exclusivamente do caso.
No entanto, nas representações sociais das professoras acerca do tratamento do TDAH, a forma vista como a mais indicada ainda é a medicação. Seis das 14 professoras entrevistadas responderam exclusivamente o medicamento na frase “A melhor forma de tratamento para o TDAH é...”, pelo TALP. Outras seis consideram que deve haver a associação de medicamentos com outros tipos de tratamento, dependendo do caso. Uma considera viável o tratamento por meio de “medicamento e psicoterapia” e uma aponta apenas o “acompanhamento psicopedagógico”.
Nas entrevistas, ao questionarmos sobre a melhor forma de tratamento para TDAH, a resposta se manteve como a medicamentosa. Questionadas sobre os benefícios e os malefícios desses medicamentos, as professoras disseram que possuem benefícios como: “ajuda a criança a se concentrar”; “acalma”; “ajuda bastante”, dentre outros. Entretanto, a medicação não é um tratamento seguro para a saúde e o desenvolvimento das crianças, visto que possui efeitos colaterais a curto e longo prazo (CAMARGOS JÚNIOR, 2005; CORDEIRO, 2016).
Os discursos das docentes se ancoram, ainda, nas premissas divulgadas pelo campo da Saúde, que analisa as dificuldades escolares a partir de aspectos biológicos, resultando em um olhar patológico dessas dificuldades, as quais precisam ser tratadas por medicamentos. Dessa forma, influenciados por essas premissas, os professores acabam assumindo um discurso de medicalização para casos que poderiam ser resolvidos com trabalhos pedagógicos.
CONCLUSÃO
Os resultados de nosso estudo revelam que as representações sociais sobre TDAH, na maioria das entrevistadas, é de um transtorno que afeta a aprendizagem. No entanto, as participantes consideram que a melhor forma de tratamento para esses casos é a medicação. Essa forma de ver o aluno com TDAH está ancorada nos discursos da área da Saúde. A escola frente a casos de desatenção e impulsividade, vê o medicamento como a única solução, acabando por realizar um encaminhamento excessivo dos alunos para os profissionais da saúde. Isso contribui para a patologização das dificuldades escolares e para a cultura de medicalização.
Tais resultados suscitam algumas reflexões: se o TDAH é um transtorno que afeta aprendizagem, por que a ênfase no tratamento recai no uso do medicamento? Não seria melhor investir em práticas pedagógicas que favoreçam o processo de ensino e de aprendizagem do aluno com TDAH? Acreditamos que intervenções pedagógicas apropriadas são importantes para crianças com TDAH. O comportamento e outros aspectos relacionados às características desse transtorno podem ser trabalhadas com psicoterapia e outros tratamentos que não necessariamente utilizem o medicamento, que pode causar efeitos colaterais indesejáveis no sujeito.
Esperamos que essa pesquisa contribua para reflexão dos professores acerca de suas responsabilidades no ambiente escolar com a criança que possui diagnóstico de TDAH.
Chegamos à conclusão de que os professores precisam assumir um papel mais crítico perante os casos de alunos com TDAH, por meio de intervenções pedagógicas que os ajudem a superar as dificuldades e potencializar as habilidades, sem depender de um medicamento que silencie crianças e adolescentes.
Consideramos importante que novos estudos sejam realizados, visto que a comunidade científica carece de artigos sobre essa temática, tendo como viés a área da Educação e suas contribuições.
REFERÊNCIAS
CAMARGOS JÚNIOR, Walter. Psicofarmacoterapia do TDA/H. In: HOUNIE, Ana; CAMARGOS JÚNIOR, Walter. Manual Clínico do Transtorno de Déficit de Atenção/ Hiperatividade. Niterói: Editora Info LTDA, 2005. p. 1066-1222.
CORDEIRO, Suzi Maria Nunes. As representações sociais de professores do ensino fundamental sobre TDAH e medicalização. 2016. 130f. Dissertação (Mestrado e Educação) – Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2016.
JODELET, Denise. Représentations Sociales: um domaine em expansion. In: ______. (Org.). Les Représentations Sociales. Paris: PUF, 1989. p. 31-61.
MACHADO, Laêda Bezerra; SILVA, Williany Fênix de Souza. Implicações das Representações Sociais de Ciclos de Aprendizagem nas Práticas Professoras de Sucesso. Revista Cocar, Belém, v. 8, n. 15, p. 88-96, jan./jul. 2014. Disponível em: <http://paginas.uepa.br/seer/index.php/cocar/article/viewFile/339/316>. Acesso em: 6abr. 2019.
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Érico Ribas Machado
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