O LuGAR Da Teoria histórico-cultural na educação Escolar
Naiara Aparecida Nascimento - UNIOESTE
professora.naiara@hotmail.com
Elisabeth Rossetto-UNIOESTE
erossetto2013@gmail.com
Eixo 3: Formação de Professores
Partindo do pressuposto de que a educação escolar configura-se como um campo de síntese de saberes associada a práticas sociais, culturais e históricas, nos propusemos a partir de um estudo teórico/bibliográfico investigar a contribuição da teoria histórico-cultural criada por Lev Semionovitch Vigotski (1896-1934) no processo de ensino. Foram utilizados como instrumentos de pesquisa produções já existentes a respeito do assunto investigado, sustentadas pelo método materialismo histórico-dialético. Historicamente trata-se de uma teoria revolucionária que surgiu nas décadas de 1920 e 1930 na Rússia, quando no campo científico as diferentes correntes psicológicas (biológica, evolucionista, naturalista, determinista) divergiram em relação à concepção de homem, de ciência e de desenvolvimento humano, outrossim, é uma teoria que defende práticas humanizadoras, não excludentes, e que vê o sujeito em sua singularidade.
Por conseguinte, a educação escolar vem superando práticas que desconsideram a influência do meio na constituição e na aprendizagem do sujeito, igualmente, concepções que excluem aqueles que não se enquadram nos padrões pré-estabelecidos de desenvolvimento humano. No entanto, o desafio de legitimar a função social da escola ainda existe, é preciso oportunizar o conhecimento científico independente das condições psicológicas, sociais, físicas e intelectuais de modo que todos se desenvolvam.
No contexto vivido por Vigotski a partir da revolução russa de 1917, instituiu-se um movimento intelectual que buscava a formação de um novo homem, para uma nova sociedade que precisava se desenvolver mediante aquele cenário. O comportamento humano se tornou objeto de estudo dentro da ciência, e expôs a fragilidade e as limitações das distintas teorias. Por este motivo:
Vygotski, ao discutir criticamente as teorias psicológicas de sua época, expressa esta luta traduzida entre uma visão de homem (e de uma forma de ser do homem) antiga, que precisa ser superada, e de outra nova que surge, a qual precisa ser construída e consolidada. (TULESKI, 2008, p. 84).
Para esse pesquisador, o modo de interpretar e estudar a consciência humana precisava ser superado, retirado do pedestal metafísico imposto por diferentes concepções filosóficas e psicológicas, precisava ser materializado. Quando propôs a criação de uma psicologia geral, Vigotski pretendia justamente superar as limitações de concepções objetivistas e subjetivistas que não davam conta de compreender a natureza dos processos da psique humana.
De acordo com Scalcon (2002) essas correntes enfatizavam o aspecto biológico do sujeito, não consideravam o seu contexto cultural e histórico, assim, as conclusões eram tiradas de estudos observáveis que só respeitavam uma rigorosa metodologia científica para determinar os resultados. Para a concepção objetivista, por exemplo, a personalidade do sujeito estava pronta desde o seu nascimento, e tanto o seu comportamento quanto o seu intelecto já estavam pré-determinados e se desenvolviam conforme o seu amadurecimento biológico.
Conforme Rossetto (2009) “Vigotski veio se contrapor as teorias do desenvolvimento psicológico que ora defendem que o desenvolvimento se dá através dos fatores orgânicos, ora afirmam que se dá através dos fatores ambientais (ROSSETO, 2010, pg. 29). Neste sentido,Vigotski, propôs à luz dos princípios do materialismo histórico-dialético uma nova psicologia, que concebia a formação de um novo homem a partir de um processo histórico e cultural, ele
[…] propunha que, mais do que tentar explicar os fatos psicológicos, o importante é criar uma metodologia que seja capaz de permitir estabelecer as “leis históricas” que os determinam. Sem estabelecer essas leis, muito pouco ou nada será possível conhecer a respeito da natureza desses fatos. Foi essa a grande razão que levou Vigotski a construir uma psicologia que revele as leis dos processos psicológicos. (PINO, 2005, pg. 29).
Na teoria histórico-cultural, como espécie e indivíduo o homem não deixa de ter suas características biológicas consideradas, porém, também é visto como um produto histórico, que se constitui a partir do contexto que está inserido, pela aprendizagem oferecida desde o seu nascimento, e pelas influências do mundo concreto que vivencia. Ao estabelecer relações com os adultos à criança passa a se apropriar de objetivações e de capacidades especificamente humanas, transforma a experiência coletiva em individual, e a mediação é elemento fundamental desta relação. Vigotski enfatiza a importância dada à complexidade do comportamento e da psique humana, revelando sua natureza, sua estrutura e suas funções, e destaca que é preciso estudar o homem no seu processo histórico do desenvolvimento, que está em permanente transformação.
Com relação à educação escolar, o professor é esse elemento mediador, durante o processo de ensino ele é o agente responsável por organizar o conhecimento científico, e através da sua prática faz com que as funções psíquicas elementares da criança se desenvolvam em funções psíquicas superiores, ou seja, em funções designadamente humanas. Neste movimento, a criança dá um salto qualitativo em seu desenvolvimento, sendo que, para Vigotski, “o único bom ensino é o que se adianta ao desenvolvimento” (Vigotski, 2006, p.114).
A escola é um espaço privilegiado para o desenvolvimento, assim:
Quando entendemos que a prática será tanto mais coerente e consistente, será tanto mais qualitativa, será tanto mais desenvolvida quanto mais consistente e desenvolvida que a teoria que a embasa, e que uma prática será transformada à medida que exista uma elaboração teórica que justifique a necessidade da sua transformação e que proponha as formas da transformação, estamos pensando a prática a partir da teoria. (SAVIANI, 2013, pg. 91).
A partir deste entendimento, e, de condições concretas, como resultado apresentamos que a teoria histórico-cultural tem um lugar importante no processo de ensino uma vez que, desde a sua criação rompe com concepções de aprendizagem que não valorizam a criança em sua totalidade, isto é, biológica, histórica e cultural. Destarte, enfatizamos que muito do que foi difundido sobre ela em nosso país não se configura como o pensamento do autor. De acordo com Prestes (2010) a teoria de Vigotski além de chegar tardiamente no Brasil trás consigo muitos cortes e distorções nas traduções, em conseqüência, muitos conceitos foram disseminados de forma equivocada no ambiente educacional. Neste sentido, cabe ao professor reconhecer os princípios teóricos que embasam sua prática, ter clareza se os conceitos apropriados foram pensados e defendidos por Vigotski, e as pesquisas científicas contribuem no sentido de evitar que as práticas recaiam em concepções excludentes.
Assim, concluímos que o professor, como elemento mediador, precisa constantemente articular teoria e prática e fazer opções conscientes, de maneira singular para organizar sua prática pedagógica. Do mesmo modo, a escola, como um espaço distinto de saber tem muita influência sobre o desenvolvimento psíquico da criança e na constituição de sua subjetividade. Por meio do movimento da dialética nas diferentes relações que se estabelecem entre professor e aluno, no contato com apropriações materiais e simbólicas, surgem novas formas de desenvolvimento do aspecto humano na criança, instrumentalizando a atuação pedagógica do professor.
REFERÊNCIAS
PINO, A. As marcas do humano: as origens da constituição cultural da criança na perspectiva de Lev S. Vigotski. São Paulo: Cortez, 2005.
PRESTES, Z. R. Quando não é quase a mesma coisa:Análise de traduções de Lev SemionovitchVigotski no Brasil, Repercussões no campo educacional. Brasília, 2010. 295 p. Tese (Doutorado em Educação) Universidade de Brasília. Brasilia, 2010.
SCALCON, S. À Procura da Unidade Psicopedagógica: articulando a psicologia histórico-cultural com a pedagogia histórica-crítica. Campinas, SP: autores Associados, 2002.
TULESKI, Silvana Calvo. Vigotski: A Construção de uma Psicologia Marxista. 2. ed. Maringá: Eduem, 2008.
ROSSETTO, Elisabeth. Sujeitos com deficiência no ensino superior: vozes e significados. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: UFRGS, 2009.
SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 8.ed. Campinas: Autores Associados, 2003.
VIGOTSKI, L. S. Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. 10.ed. São Paulo: Ícone, 2006. p.103-17.
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