GOVERNO BETO RICHA:UMA APROXIMAÇÃO COM O CONCEITO DE ESTATISMO AUTORITÁRIO
Regina Stori
UEPG
regina.mus@gmail.com
Eixo: Política Educacional e Gestão
Grupo Estudos e Pesquisa de Políticas Educacionais e Práticas Educativas (GEPPEPE)
Este trabalho objetiva discorrer aproximações de ações governamentais dos governos Carlos Alberto Richa (Beto Richa) ao conceito de estatismo autoritário de Nicos Poulantzas. O texto apresentará algumas ações na área da educação do referido governo entre os anos de 2011 a 2018, e essas aproximações serão apresentadas a partir do próprio autor, problematizando com análises e fatos levantados em artigos científicos, dissertações, além de notícias e artigos em blogs e jornais da época.
Governo Beto Richa
O governador Carlos Alberto Richa assumiu o Estado em janeiro de 2011. A produção acadêmica com vistas a analisar as ações de seu governo, em particular no campo da educação, ainda é parca. Entretanto, é possível verificar a vinculação das ações do governo Beto Richa a ideias neoliberais na gestão do Estado do Paraná, aliadas a uma visão gerencialista da educação.
Algumas notícias da época em blogs e jornal expõem ou relacionam as ações governamentais a essa concepção, seja por meio da redução de investimentos na educação, seja na terceirização de serviços, na contratação de profissional que se alinha a princípios neoliberais, empresas de consultoria, e não pagamento de direitos trabalhistas (ALVES, 2011, GERON, FÉLIX, 2011, VIOLIN, 2012, 2013; MORAIS, 2013a, 2013b, 2014).
Destacam-se duas dissertações de mestrado que analisam esse governo, embora não em sua totalidade. Tessari (2015) analisa a formação continuada entre os anos 2007 e 2013 no Estado do Paraná, e Sousa (2013) apresenta uma análise da gestão educacional entre os anos 2011 e 2013. Esses dois trabalhos contextualizam, em termos ideológicos, o governo Richa, sobretudo a vinculação de ações e ideias que atendem às demandas do Banco Mundial, ainda que não incluam o quarto ano do primeiro mandato.
Melo (2013) e Souza (2016) também contribuem na análise da gestão educacional no governo Beto Richa. Melo (2013) aponta a redução de investimentos no ensino superior e na educação básica, e adiamento de programas relacionados à educação já no primeiro ano de mandato. Souza (2016) apresenta alguns indicadores em relação à precariedade dos contratos de professores temporários na educação básica, e do impacto dessa condição nas escolas. Em suma, os autores apresentados afirmam a vinculação do governo Beto Richa com o ideário neoliberal.
Tendo em vista o projeto de Estado e sociedade que foi se delineando no decorrer dos anos da primeira gestão do governador Beto Richa, afirma-se a adoção de uma prática de culpabilização dos docentes. Essa prática é identificada por Tessari (2015, p. 91), a qual afirma que
o governo Beto Richa foi implementando gradativamente no campo educacional uma concepção liberal meritocrática, de responsabilização e culpabilização de seus profissionais, no desmonte e no sucateamento, sentida sobremaneira no limiar de 2011 [...].
Já Souza (2013, p. 154), conclui seu trabalho afirmando que
para efetivar sua concepção de estado eficiente, [a gestão Beto Richa] tem diminuído os investimentos no setor público, cortado gastos, imposto uma gestão educacional autoritária, pragmática, meritocrática e punitiva, utilizando-se da mesma afirmação do Banco Mundial, segundo a qual a escola não é eficiente, porque a gestão escolar é ineficiente e deve ser modernizada. Em face disso, utiliza-se de mecanismos democráticos como as instâncias colegiadas para manipular a opinião pública, transferir responsabilidades, culpabilizar os sujeitos e falsear as reais dificuldades da educação, que se traduz na falta de financiamento adequado para uma educação de melhor qualidade.
O governo Beto Richa também foi marcado por confronto físico com o professorado do Estado, fato que se tornou notícia no Brasil e no mundo.
Estatismo Autoritário
Em O Estado, o poder, o socialismo, último livro de Poulantzas (1980), o autor descreve o conceito de estatismo autoritário (EA), o qual seria caracterizado pela
monopolização acentuada, pelo Estado, do conjunto de domínios da vida econômico-social articulado ao declínio decisivo das instituições da democracia política e à draconiana restrição, e multiforme, dessas liberdades ditas ‘formais’ de que se percebe, agora, que elas vão por água abaixo, na realidade. (p. 234)
O autor define democracia política pelo fato de os direitos serem iguais a todos sujeitos no que diz respeito ao voto (não nas questões sociais), isto é, todos os cidadãos de certa idade têm direito a um voto, sejam eles de quaisquer etnias, orientação sexual, ou de quaisquer condições econômicas.
Segundo o autor, o EA não se refere apenas ao reforçamento do Estado, mas um movimento desigual de “reforçamento-enfraquecimento” do mesmo (POULANTZAS, 1980, p. 236), isto é, na medida em que monopoliza os aspectos econômico-sociais, também reduz certos aspectos democráticos, por meio, inclusive, da restrição de certas liberdades dos sujeitos.
Para Poulantzas, não se trata, porém, de um processo de fascistização, de um totalitarismo, ou mesmo de uma ditadura: “ele representa a nova forma democrática na fase atual. É, ouso dizer, ao mesmo tempo melhor (ele mantém uma certa realidade democrática) e pior: ele não é o fruto de uma simples conjuntura que bastaria reverter para restabelecer liberdades que se retraem” (1980, p. 240, grifos do autor).
Contudo, o autor esclarece que “toda a forma democrática de Estado capitalista comporta tendências totalitárias” (Idem, p. 241). E ele observa certos dispositivos para manutenção da hegemonia do grupo dominante, sobretudo “diante do crescimento das lutas populares e dos perigos que ela representa (Idem, p. 242). Esclarece, também, que tais dispositivos podem ser legais, mas podem ser também referentes a falhas no funcionamento do poder.
O autor avança ainda para aspectos de ordem econômica e do Estado de bem-estar social, afirmando que esse seria uma ilusão da qual o Estado abre mão em momentos de crise econômica. E que na fase que denomina de EA ocorrem transformações consideráveis nas relações de produção, em partilhar pela “intensificação da jornada, crescimento da produtividade do trabalho, degradação das condições de vida” (Idem, p. 243).
Considerações finais
É certo que os limites deste trabalho impossibilitam uma análise aprofundada tanto do conceito de EA, quanto do governo Beto Richa. Cabe, no entanto, levantar certas questões que podem contribuir para uma reflexão sobre a questão: uma vez que Poulantzas trata do Estado nação, é pertinente avançar nessa análise ainda que se trate de uma unidade da federação brasileira? Seria possível relacionar o movimento de enfraquecimento do Estado descrito por Poulantzas, às políticas de Estado mínimo? E por fim, as decisões quanto aos trabalhadores da educação pública paranaense se configuram com o que Poulantzas define para as relações de produção no EA?
Acredita-se que são apontamentos para o aprofundamento do estudo, e que indicam uma certa atualidade do trabalho de Nicos Poulantzas.
REFERÊNCIAS
ALVES, M. Os cem dias do governo neoliberal de Beto Richa. In: Portal Vermelho. 12 abr. 2011. Disponível em < http://www.vermelho.org.br/noticia/151740-98>. Acesso em 06 ago. 2016.
GERON, V.; FÉLIX, R. Terceirizações deveriam ter sido mais discutidas, diz presidente do TC. Disponível em < http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/terceirizacoes-deveriam-ter-sido-mais-discutidas-diz-presidente-do-tc-a4yn8ltzh9lfoe0ilb52snvim>. Acesso em 06 ago. 2016.
MELO, J. F. Análise da presença do estado neoliberal nas políticas públicas para a educação no Estado do Paraná nas gestões Lerner (1995 – 2002) e início governo Beto Richa (2011). XIII Congresso de Educação do Norte Pioneiro. Anais... Jacarezinho, 2013, pp. 100-117.
MORAIS, E. Guru neoliberal da era Lerner é destaque na Semana Pedagógica de Richa. In: Blog do Esmael. 04 fev. 2013a. Disponível em <http://www.esmaelmorais.com.br/2013/02/guru-neoliberal-da-era-lerner-e-destaque-na-semana-pedagogica-de-richa/>. Acesso em 06 ago. 2016.
________. Na educação, Beto Richa resgata ideário neoliberal da era Jaime Lerner. In: Blog do Esmael. 06 fev. 2013b. Disponível em <http://www.esmaelmorais.com.br/2013/02/na-educacao-beto-richa-resgata-ideario-neoliberal-da-era-jaime-lerner/> Acesso em 06 ago. 2016.
________. Em Curitiba, comunidade vai às ruas contra fechamento de salas de aula. In: Blog do Esmael. 27 fev. 2014. Disponível em http://www.esmaelmorais.com.br/2014/02/em-curitiba-comunidade-vai-as-ruas-contra-fechamento-de-salas-de-aula/. Acesso em 06 ago. 2016.
POULANTZAS, N. O Estado, o poder, o socialismo. Trad. Rita Lima. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1980. (Biblioteca de Ciências Sociais, v. 19)
SOUSA, S. A gestão educacional no Paraná 2011 – 2013. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, 2013, 160p.
SOUZA, M. N. Políticas públicas de educação no Paraná: contratação e condições de trabalho de professores temporários como variável de análise. In: Revista NEP. Curitiba, v. 2, n. 1, pp. 71-78, mar. 2016.
TESSARI, E. V. S. A formação continuada nas semanas pedagógicas de fevereiro no período 2007 – 2013 no Estado do Paraná. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Cascavel, 2015, 188p.
VIOLIN, T. C. Governo Beto Richa contrata consultoria externa para aplicar gerencialismo-neoliberal. In: Blog do Tarso. 28 dez. 2012. Disponível em < https://blogdotarso.com/2012/11/28/governo-beto-richa-contrata-consultoria-externa-para-aplicar-gerencialismo-neoliberal/>. Acesso em 06 ago. 2016.
________. Governo Beto Richa privatizou os concursos públicos no Paraná e gerou caos. In: Blog do Tarso. 23 maio. 2013. Disponível em < https://blogdotarso.com/2013/05/23/governo-beto-richa-privatizou-os-concursos-publicos-no-parana-e-gerou-caos/>. Acesso em 06 ago. 2016.
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