Educação informal e anticomunismo: a iconografia política durante a Era Vargas

  • Autor
  • Gabriela Cristina Beltramin De Bona
  • Resumo
  •  

    EDUCAÇÃO INFORMAL E ANTICOMUNISMO: A ICONOGRAFIA POLÍTICA DURANTE A ERA VARGAS

    Gabriela Cristina Beltramin De Bona

    UNIOESTE – Campus Cascavel

    gabriela_debona@hotmail.com

    História e Historiografia da Educação

     

    As imagens possuem grande poder de influência sobre a formação de opiniões na sociedade. As revoluções tecnológicas que vêm se desenvolvendo desde a Revolução Industrial, possibilitaram a difusão de informações em larga escala, sendo muito utilizadas como meio de propaganda pelo Estado para a veiculação de notícias que pudessem fortalecer o status do governo vigente. Durante a Era Vargas (1930-45), este recurso foi amplamente utilizado em diversos suportes, principalmente no que se refere à criação de imagens que estimularam uma rejeição ao comunismo no Brasil. Esta visão anticomunista foi incentivada por meio de cartazes e jornais que apontavam a esquerda como um grande mal para a sociedade, e tornou-se parte do imaginário brasileiro, perpetuando-se até os dias atuais e enraizando-se na cultura política do país.

                Na primeira década do governo Vargas, a propaganda iconográfica foi uma forte aliada na construção de um movimento anticomunista que se fixou no Brasil. Motta (2002) afirma que o anticomunismo gerou um imaginário próprio, com um conjunto de imagens voltadas a representar os comunistas e o comunismo. Por conseguinte, tais imagens concentraram-se em destacar aspectos depreciativos da ideologia e práticas comunistas.

                A propaganda iconográfica se encaixa, portanto, dentro da educação informal, além de ser atribuída por Althusser (1998) enquanto um dos aparelhos ideológicos do Estado, auxiliando na manutenção da ideologia dominante e reproduzindo um imaginário anticomunista no Brasil. Para tanto, torna-se pertinente abordar os movimentos anticomunistas sob uma ótica da educação informal e como os mesmos conformam a propaganda iconográfica varguista.

    O comunismo foi apresentado à sociedade como a representação de todo o mal social, desde a ameaça contra a moral religiosa até sua associação com as patologias humanas, criando assim uma espécie de silogismo entre organismo humano e social, em que o comunismo é apresentado como elemento nocivo e doente à sociedade. A partir de 1930, Getúlio Vargas iniciou um período de intenso controle da informação e de veiculação de propagandas. Considerando a existência de uma maioria da população iletrada, os meios iconográficos foram a principal ferramenta na atribuição de valores difundidos junto à população, e não unicamente entre a população iletrada, pois as imagens causam um impacto que poderia ir além das frações sociais, reproduzindo fortemente as ideologias dominantes.

                Com a consolidação do golpe de 1937, criou-se um aparelho de Estado muito mais forte e unificado, propiciando um controle estatal mais eficaz na sociedade, Segundo Althusser (1998), há uma diferença entre aparelhos repressivos e ideológicos que legitimam o Estado, embora ambos existam para um propósito comum. Estas estruturas, por sua vez, encontram na produção e difusão da informação um meio eficaz e célere na construção artificial de consensos sociais. Durante o Estado Novo, este aparelho foi cuidadosamente controlado a partir do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), que produzia, monitorava e censurava todas as informações que chegavam à população. Assim, o DIP foi responsável pela grande parte da veiculação iconográfica da ideologia anticomunista, apresentando-se por meio de charges, caricaturas, cartazes e histórias em quadrinhos.

     

    A EDUCAÇÃO INFORMAL E A PROPAGANDA ANTICOMUNISTA

                A educação na sociedade se opera por meio de diversos contextos, podendo se apresentar no meio institucional escolar, mas também no convívio social. Gohn (2006) define as três formas de educação:

     

    Educação formal é aquela que é desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a informal como aquela que os indivíduos aprendem durante o seu processo de socialização – na família, bairro, clube, amigos, etc.- carregada de valores e culturas próprias, de pertencimento e sentimentos herdados; e a educação não formal é aquela que se apende no “mundo de vida”, via os processos de partilha de experiências, principalmente em espaços e acções colectivas quotidianas (Gohn, 2006, p.28)

     

                Portanto, depreende-se que a educação informal está presente numa ampla e diversa gama de espaços. Por sua vez, ela não é uma educação despretensiosa ou natural, mas também resultado de uma intenção deliberada de produzir consensos e reproduzir ideologia. Nesse sentido, se vale frequentemente do campo imagético, visando formar (ou deformar) opiniões, valores e ideias, entre elas, a de espectro anticomunista.

                Um dos aparelhos estatais mais utilizados durante o governo Vargas foi o de imprensa, pois, através deste, informações foram criadas ou censuradas para que houvesse uma unificação nacional com ideários homogêneos. Os cartazes anticomunistas foram amplamente divulgados durante todo o período da década de 1930, trazendo elementos que reproduziam o “perigo” do comunismo de forma simplificada e impactante. Tais imagens conformam um objetivo educativo, construindo estereótipos: “[...] uma imagem ou ideia simplificada, estável e ritualizada, de ampla aceitação social. Pode afetar a determinadas identidades, etnias, profissões, papeis sociais, fenômenos naturais, objetos, etc.” (Gasca, Gubern, 2011, p. 27, tradução livre).

    Motta (2002) analisa as características que identificam o anticomunismo desde os anos 1920 até 1964, e aponta os componentes que são utilizados para produzir este imaginário anticomunista através da análise de imagens. Neste período, ainda segundo o autor, o comunismo, o liberalismo e o anarquismo eram vistos como ideais relacionados. Ainda sobre a análise iconográfica da propaganda anticomunista, o autor traz a ilustração publicada por um periódico católico ligado à Arquidiocese de Belo Horizonte, provavelmente reproduzindo material de origem importada. A Igreja Católica teve uma ligação muito próxima com os movimentos anticomunistas, divulgando e pregando a ideia de um comunismo profano, que despreza a religiosidade. 

                Uma das ilustrações contidas nas revistas católicas, representa o momento das lutas travadas em prol da implantação da República na Espanha. Apesar de ser uma fabulação, a imagem é construída de forma realista, gerando no leitor a sensação de verossimilhança. Segundo Motta (2002):

     

    “A gravura, que ilustra matéria sobre a situação política na Espanha, apresenta um grupo de “republicanos comunistas” no interior de um templo católico da cidade de Sevilha, que acabavam de profanar e destruir. Um dos membros do grupo atacou a imagem de N. S. do Carmo, arrancando-lhe a cabeça, mas a profanação não ficou impune (...) No centro do desenho aparece o momento final da cena: o homem, ainda segurando a cabeça da santa, cai morto após receber a descarga de energia proveniente do céu” (Motta, 2002, p. 97).

     

    O resultado de uma grande veiculação de materiais ideológicos é a criação de uma leitura social que passa a ser aceita por grande parte da população. A propaganda anticomunista traduziu o antagonismo de forças entre esquerda e direita presente na década de 1920, mas que ganhou força com o advento do Varguismo e com o trabalho capitaneado pelo DIP (Dutra, 2012). Veiculando informações e imagens estereotipadas, estas estruturas ajudaram a fortalecer um Estado nacionalista e a enfraquecer supostas “ameaças estrangeiras”. Enfim, os imaginários costumam perdurar por gerações na sociedade e seus nefastos resquícios podem ainda ser vistos nos dias atuais.

     

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos do Estado. 3ª ed. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1987.

    CANÁRIO, Rui. Aprender sem ser ensinado. A importância estratégica da educação não formal. In: AAVV, A Educação em Portugal (1986- 2006): Alguns Contributos de Investigação. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Conselho Nacional de Educação, 2006, p. 159-206.

    DUTRA, Eliane. O ardil totalitário: Imaginário político no Brasil dos anos de 1930. 2ª ed. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.

    FREIRE, Paulo Reglus Neves. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 3º ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

    GASCA, Luis, GUBERN, Roman. El discurso del cómic. Madrid: Catedra, 2011.

    GOHN, Maria da Glória. Educação não formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Ensaio: avaliação das políticas públicas de educação, 14 (50), 2006, 27-38.

    MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Em guarda contra o perigo vermelho: o anticomunismo no Brasil (1917 – 1964). São Paulo: Perspectiva: FAPESP, 2002.

     

  • Palavras-chave
  • educação informal, anticomunismo, era vargas
  • Modalidade
  • Comunicação oral
  • Área Temática
  • História    e    historiografia    da    Educação        
Voltar Download
  • História    e    historiografia    da    Educação        
  • Política    Educacional    e    Gestão    
  • Formação    de    professores 
  • Educação    Especial    
  • Ensino de Ciências e Matemática
  • Educação e Arte
  • Educação, cultura e diversidade
  • Educação e Tecnologia
  • Aprendizagem, desenvolvimento humano e práticas escolares
  • Tópicos Especiais em Educação

Comissão Organizadora

Érico Ribas Machado

Comissão Científica