FOTOGRAFIAS ESCOLARES: A REPRESENTAÇÃO DO GRUPO ESCOLAR SENADOR CORREIA (PONTA GROSSA, 1920)

  • Autor
  • Audrey Franciny Barbosa
  • Resumo
  •  

    OBJETIVOS

    A presente discussão teve por objetivo analisar de que maneira se deu a representação fotográfica do Grupo Escolar Senador Correia em duas fotografias datadas da década de 1920.

    METODOLOGIA

    A fim de realizar uma leitura crítica das fotografias analisadas, adotou-se como metodologia de trabalho a noção de planos (CANABARRO, 2015). Ou seja, compreendeu-se as fotografias como artefatos em si, repletas de espaços que revelam aspectos de sua produção, técnica, consumo e circulação – elementos essenciais para quem se propõe ao campo dos Estudos Visuais.  Diante disso, os planos utilizados foram plano de produção, plano estético e plano de representação.

    RESULTADOS

    O Grupo Escolar n°. 2, mais tarde denominado Grupo Escolar Senador Correia, fundado em 1912, foi a primeira escola de caráter público estadual da cidade de Ponta Grossa – e única até 1924, quando se deu a fundação da Escola Normal de Ponta Grossa (LUPORINI, 1987).

    De acordo com Luporini (1987), o Grupo Escolar surgiu da fusão de outras duas escolas localizadas na cidade: a casa escolar da professora Sara Sanchez (localizada na rua Engenheiro Schamber) e a Escola Pública de Ponta Grossa (localizada na rua Sant’Anna). Voltado para o ensino primário – então dividido em 1° e 2° grau – promíscuo, isto é, para o ensino de meninas e meninos, a escola recebeu no seu primeiro ciclo, sob a gestão da diretora Luzia Fernandes (1912-1917), 127 alunos e alunas.

    Ambas as fotografias tratadas na discussão (figuras 1 e 2) foram ambientadas no prédio do Grupo Escolar Senador Correia. Datadas da década de 1920, trazem semelhanças em sua produção técnica: orientação horizontal, produzidas no espaço externo do prédio cujo enquadramento central apresenta uma vista parcial fachada de entrada do imóvel e em sua produção cênica: alunos e alunas, uniformizados, posando de maneira ordenada na escadaria principal do prédio escolar.

    Ainda que com algumas pequenas variações de enquadramento – provavelmente devido ao número de alunos ser menor que o número de alunas – a identificação da entrada principal da escola: sua calçada de acesso, a escadaria, a porta principal e duas janelas laterais que abertas dão margem para um segundo plano (interno da escola) encontra-se em ambas as fotografias. Além disso, a escadaria principal (em formato de piramidal) serviu de auxílio para o fotografo distribuir os elementos – alunos e alunas – na composição da cena das duas fotografias.

    Logo, a principal diferença notada entre esses dois anversos se refere ao grupo de crianças: meninos de um lado, meninas de outra. Ainda que o Grupo Senador Correia fosse um espaço de ensino público, voltado para o ensino promíscuo e com a presença de alunas, a divisão das turmas foi um recurso utilizado pelo fotógrafo.

    Os alunos (figura 1) de diferentes faixas etárias, trajados quase que exclusivamente de branco (calções, camisas, chapéus) foram organizados de maneira ordenada e rígida – os sentados da primeira fila braços cruzados, os demais em pé braços colocados ao corpo – o que não significa que todos estejam seguindo tal disposição. Enquanto a maioria apresenta um semblante sério, alguns esboçam um discreto sorriso. No alto da escada, escondido pelos alunos de branco, há um homem ao que parece de casaco branco e que pode se supor seja o professor da turma. Além disso, uma outra pessoa ao lado do professor, usando o chapéu branco, porém, trajando um casaco escuro.

                O arranjo da fotografia das alunas (figura 2) dispostas por tamanho, organizadas a fim de que todas sejam fotografadas, seguindo o formato decrescente da escadaria. Porém, até mesmo devido ao número maior de alunas, seis alunas foram postas nas janelas laterais à porta principal, também seguindo a ordenação propostas: as mais baixas postadas perto do núcleo da fotografia, as mais altas nas laterais externas.

                As alunas, também seguem um padrão de uniformização: saias, camisas e chapéus brancos – assim como a professora no topo da escada. De diferentes faixas etárias, foram organizadas por suas alturas/idades, estando as mais novas sentadas em frente a escadaria – no chão e no banco – e as maiores em pé. Grande parte das meninas posaram com os braços grudados ao corpo, há outras com os braços cruzados, ou ainda aquelas com a mão apoiada nas colegas, na cintura, sobre as penas cruzadas. É interessante notar que nenhuma apresenta os cabelos longos, todos presos pelos chapéus.

                Num primeiro momento, o que chamou atenção na composição dos dois retratos foi a divisão por turmas por sexo. Pois, ainda que o Grupo Senador Correia fosse uma escola de caráter promíscuo, é evidente a escolha do fotógrafo por separar alunas e alunos pelo menos no momento da fotografia. Tal posição não foge muito longe de uma perspectiva adotada por alguns dos espaços escolares de fins do século XIX e início do século XX, isso porque:

    A rígida divisão dos sexos, a indicação precisa de espaços individuais na sala de aula e o controle dos movimentos do corpo na hora de recreio conformavam uma economia gestual e motora que distinguia o aluno escolarizado da criança sem escola [...]. Para o autor, os grupos escolares: “A cultura escolar elaborada tendo como eixo articulador os grupos escolares atravessou o século XX, constituindo-se em referência básica para a organização seriada das classes, para a utilização racionalizada do tempo e dos espaços e para o controle sistemático do trabalho das professoras, dentre outros aspectos. É, grosso modo, nesse e com referência a esse caldo de cultura que ainda hoje se elaboram as reflexões pedagógicas, mesmo aquelas que se representam, mais uma vez, como de costas para o passado e antecipadoras de um futuro grandioso (FARIA FILHO&VIDAL 2000, p. 25 -27).

     

    Além disso, outro elemento a se destacar no caso destas fotografias é a uniformização dos alunos e alunas com jalecos e chapéus brancos. Nesse caso, podemos pensar o branco nos uniformes escolares do início do século XX por meio das perspectivas higiênicas que permeavam os discursos educacionais do período, e preconizavam o limpo, o puro e as práticas higiênicas a fim de efetivar um “cruzamento indispensável entre educação e saúde para a “salvação” do povo brasileiro (CHAVES, 2011, p. 38). No caso ponta-grossense, há que destacar que:

    As escolas públicas ou privadas inauguradas em Ponta Grossa a partir do século XX já se adequavam aos termos dos novos tempos, ou seja, aos confortos e às exigências da modernização e às orientações produzidas por intelectuais ligados a essa questão [...] A partir dessa estrutura educacional, Ponta Grossa munia-se institucionalmente para colocar em prática a desejada educação regeneradora e para eliminar os maus hábitos. A principal missão dos educadores de então era a de combater os comportamentos desviantes [...] Criadas ainda no século XIX e instaladas, geralmente, nas casas dos professores, as primeiras escolas abertas em Ponta Grossa funcionavam em salas improvisadas e reuniam alunos de diversas faixas etárias em uma mesma turma. No entanto, após a proclamação da República verifica-se uma valorização do ensino público com a construção de prédios destinados especificamente para as práticas escolares. Apesar disso, a estrutura escolar/educacional ponta-grossense careceu de investimentos constantes ao longo da primeira metade do século XX (CHAVES, 2011, p. 93-97).

    Assim, voltadas para a representação visual (CHARTIER, 2010) dos alunos e alunas do Grupo Escolar, as questões que mais se destacam na composição das fotografias se refere a ordenação rígida e trabalhada dos alunos (por tamanho, sexo, poses) e a uniformização de todos por meio dos trajes brancos, dando sentido de homogeneidade à cena. Logo, segundo Possamai (2015):

    Ressalta-se que para a construção de uma visualidade fotográfica os alunos uniformizados e dispostos em filas proporcionam a criação de um sentido de homogeneidade, pois o uniforme proporciona a repetição dos elementos visuais na presença de cada sujeito individualizado (POSSAMAI, 2015, p. 141).

     

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

                A presente discussão se propôs analisar duas fotografias do Grupo Escolar Senador Correia a fim de perceber como se deu a representação deste espaço escolar pelas lente do fotógrafo. Há que se destacar, sobretudo, que longe do efeito de realidade, a fotografia é uma representação e, por tal, corresponde a imperativos visuais do período em que foi produzida – entre estes imperativos podemos destacar a técnica, a produção, a circulação e o consumo. No caso das fotografias escolares aqui analisadas compreendeu-se que elas buscaram enfatizar e eternizar a imagem de um espaço homogêneo, racional,  ordenado e de acordo com os preceitos higienistas do período. Nesse sentido,  para além da realidade, o que tais fotografias revelam não é o documental em si, mas sim um discurso de monumentalidade.

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    CANABARRO, I. S. Fotografia e História: questões teóricas e metodológicas. Visualidades. Goiânia, v.13, n.1, p. 98-125, jan-jun. de 2015.

    CHARTIER, R. A História ou a leitura do tempo. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010, 77p.

    CHAVES, N. B. Entre “preceitos” e “conselhos”: discursos e práticas de Médicos-Educadores em Ponta Grossa/PR (1931-1953). 2011. 298f. Tese. (Doutorado em Educação). Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2011.

    FARIA FILHO, L. M; VIDAL, D. G. Os tempos e os espaços escolares no processo de institucionalização da escola primária no Brasil. Revista Brasileira de Educação.  n. 14, Rio de Janeiro May/Aug. 2000.

    LUPORINI, T. J. Escola Estadual Senador Correia: pioneira da instrução pública em Ponta Grossa. Ponta Grossa: Editora Planeta, 1987, 108p.

    POSSAMAI, Z. R. A grafia dos corpos no espaço urbano: os escolares no álbum “Biografia duma cidade”, Porto Alegre, 1940. Revista História da Educação, v. 19, n. 47, set/dez. 2015, p. 129-148.

     

  • Palavras-chave
  • FOTOGRAFIAS ESCOLARES; REPRESENTAÇÃO VISUAL; CULTURA ESCOLAR
  • Modalidade
  • Comunicação oral
  • Área Temática
  • História    e    historiografia    da    Educação        
Voltar Download
  • História    e    historiografia    da    Educação        
  • Política    Educacional    e    Gestão    
  • Formação    de    professores 
  • Educação    Especial    
  • Ensino de Ciências e Matemática
  • Educação e Arte
  • Educação, cultura e diversidade
  • Educação e Tecnologia
  • Aprendizagem, desenvolvimento humano e práticas escolares
  • Tópicos Especiais em Educação

Comissão Organizadora

Érico Ribas Machado

Comissão Científica